Foto: Pedro Ventura/Agência Brasília
Do Jornal da USP
O segundo, motorista de ônibus, teve outra experiência. A esposa lhe disse que poderia aumentar suas horas de trabalho como enfermeira enquanto ele poderia cuidar do trabalho doméstico. Com esta mudança, aprendeu a cozinhar e tomou gosto pela atividade, chegando a preparar um jantar para a mulher e as amigas.
Estas breves narrativas do desemprego ilustram formas distintas das famílias lidarem com este problema em seu interior. A partir de situações simples com estas, muitas dimensões estão em jogo: os papéis de gênero, o lugar de cada um na família, a tentativa de se ressituar após perder o emprego, a flexibilidade com que a situação pode ser enfrentada.
Tomar o fenômeno do desemprego a partir desta perspectiva mais ampla, recorrendo inclusive à histórias de vida que mostrem como indivíduos e famílias lidam com as dificuldades desta condição, é o que o livro Desemprego: uma abordagem psicossocial se propõe a oferecer.
Escrito por Belinda Mandelbaum e Marcelo Afonso Ribeiro, professores do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho do Instituto de Psicologia (IP) da USP a obra é publicada pela editora Blucher, com lançamento em 28 de junho, às 19 horas, na Livraria da Vila da rua Fradique Coutinho em São Paulo.
Desemprego afeta vínculos sociais
Os autores partem de uma análise do contexto econômico neoliberal e de como este afeta as condições de trabalho e emprego para então trazerem à tona a questão central de sua abordagem, os problemas psíquicos e sociais que tanto o desemprego como também a precarização das condições de emprego produzem.
Como afirma a professora Mandelbaum, é preciso considerar que o trabalho não é só fonte de renda ou de sustento, mas tem também um papel central na saúde mental e inserção social das pessoas: “Ele é formador de uma rede social que me confere um certo lugar, que me permite estabelecer vínculos que se desdobram em outras coisas”
É justamente esta capacidade de construção de vínculos sociais que o desemprego compromete, produzindo o que se chama de condição de vulnerabilidade psicossocial. Esta é a noção a partir da qual os autores desenvolvem a abordagem dos problemas vivenciados pelos desempregados.
Para além dos vínculos há diversos outros motivos pelos quais o trabalho é importante, como ressalta a professora. Trata-se, por exemplo, de uma atividade fundamental para a manutenção de uma certa rotina no cotidiano. “O trabalho é uma inserção no tempo, na cidade. Em especial o trabalhador pobre, quando perde o emprego, fica isolado em casa”.
A pesquisadora destaca também o fato de o trabalho ser parte de como as pessoas veem e concebem a si mesmas: “ele é um elemento constitutivo da identidade. Aquilo que você faz tem uma incidência profunda na sua identidade, tanto para si mesmo, como perante o social. Freud disse que sobre dois grandes pilares se assenta a saúde mental: sobre o amor e sobre o trabalho”.
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