Sérgio Moro sugere “salvaguarda” para abusos já apontados na Lava Jato

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Não especificando artigos que por exceção precisariam de “proteção”, o juiz federal generaliza, acobertando reais escudos que sugere para abusos já apontados por Cortes superiores, como prisões irregulares e conduções coercitivas
 
 
Jornal GGN – Para mostrar que é contrário ao Projeto de Lei 280, que criminaliza abusos de autoridades, o juiz federal Sérgio Moro recorreu a discurso histórico de Rui Barbosa, que ao advogar para um juiz condenado no final do século XIX por abuso de autoridade, “defendeu com todo vigor e eloquência que divergências da interpretação da lei jamais devem ser criminalizadas, sob pena de transformar o juiz em um servo, sob pena de afetar uma justiça independente”.
 
Mas com o temor de se apresentar contrário ao sustentado projeto, distante da medida recém aprovada pela Câmara dos Deputados na madrugada de quarta-feira (30), as denominadas 10 Medidas Contra Corrupção que adicionaram mecanismos que podem se transformar em censura aos magistrados, Moro sugeriu incluir um dispositivo na lei, “a simples adição de uma norma de salvaguarda: não configura crime previsto nesta lei a advergência de intepretação da lei penal ou na avaliação do que é fatos e provas”.
 
Dessa forma, Sérgio Moro garantiria que artigos defendidos de forma unânime pelo universo do Direito como abusos, por exemplo o de constranger sexualmente presos e detidos, se mantivessem, por outro lado, evitaria efeitos diretos no andamento e nas suas decisões da Operação Lava Jato.
 
A sugestão de Moro impactaria no artigo 30, que trata da persecução penal e busca evitar abusos no cumprimento das leis de mandado de prisão, buscas e apreensão, sem uma justa causa. Em outras palavras, o PL 280 quer evitar prisões, conduções coercitivas e outros mandados sem necessidade ou indícios suficientes. 
 
Para defender seu “salvaguarda”, o magistrado trouxe outra interpretação para o artigo: “Qualquer ação penal tem que ter substrato probatório. O que a lei estabele, quando o Ministério Público oferece uma denúncia, vai ao juiz, o juiz tem a possibilidade de rejeitar. Se o juiz rejeitar a denuncia ou a queixa, isso significa que o promotor ou procurador cometeu abuso de autoridade. Vamos criminalizar os erros de provas? Isso vai ter impacto na liberdade do Ministério Público de oferecer a denúncia”, disse.
 
 
Outros casos, como por exemplo o artigo 15 citado pelo juiz, que impede o uso de algemas a delegados da Polícia Federal em casos que não houver a resistência de prisão, podem ter efeitos práticos que obstaculizam o cumprimento de mandados. “Ninguém discorda dessa norma, que as algemas devem ser usadas em casos necessários. Mas a quem cabe fazer essa avaliação? Se ele (policial), comete um erro de avaliação, fica sujeto a uma ação penal. Se for manter uma norma dessa, que haja uma salvaguarda se ele cometeu um erro de interpretação dos fatos”, sugeriu.
 
Entretanto, ao invés de especificar artigos que, com exceção, precisariam desta “proteção” indicada por Moro, o magistrado acoberta as reais proteções para abusos já indicados por Cortes superiores, como prisões irregulares, na adição de um artigo geral que serviria para todos os dispositivos da lei. 
 
Conforme mostrou o GGN, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Regional Federal da 4ª Região corrigiram, pelo menos, 20 erros cometidos por Sérgio Moro no âmbito da Lava Jato, revogando prisões consideradas ilegais pelos tribunais superiores.
 
Sobre o artigo 9, que criminaliza abusos na decretação de prisões cautelares, Moro novamente revela as intenções com a adição sugerida: “Fundamentos da decretação de prisões cautelares, são objeto de inúmeras controversas. Que significa esse dispositivo? Se decisão de juiz de 1a instância, de 2a instância, se ela for reformada, ainda que na última instância, ficará ele sujeito a persecução penal por abuso de autoridade? Estamos negando a herança de um dos nossos pais, Rui Barbosa. É importante a salvaguarda para divergências na interpretação da lei e de provas.”
 
Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

21 Comentários

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  1. Se quer virar legislador o

    Se quer virar legislador o nóia da Justiça Federal deve ter a decência de disputar eleições como faria qualquer outro cidadão.

    Eu não votaria nele.

    E não tenho que perder meu tempo lendo as propostas de alguém que pretende impor à nação uma Lei que o torna irresponsável pelos abusos que ele comete ou pretende cometer. 

     

  2. “Moro sugeriu incluir um

    “Moro sugeriu incluir um dispositivo na lei, “a simples adição de uma norma de salvaguarda: não configura crime previsto nesta lei a advergência de intepretação da lei penal ou na avaliação do que é fatos e provas””:

    Depois sorriu docemente e se retirou em seu cavalinho dizendo “Comecou a chover”…

  3. …sempre fora do penico

    E o Savonarola dos pinhais, fazedor de leis ad hoc, percebe não ser um deus todo poderoso.

    Quando a conversa é muita e longa é que os argumentos são insustentáveis.

  4. Pouco sincero e autoritário

    Assisti grande parte das duas ou três intervenções do Sérgio Moro nos debates hoje no Senado

    Não acho que seja sincero nem bem intencionado. Está delirante pelos holofotes da Globo, se acha escolhido pelo povo e. mesmo falando antes….”com toda humildade”…segue depois um comentário de tom fascista e autoritário.

    Parece (piada) com o Argentino que diz: Eu sou o sujeito mais humilde….DO MUNDOOOO!!!!!!!

  5. Parece que Moro desconhece que a lei não retroage!

    Moro está contra o projeto por futuros crimes que possa cometer, pois ele sabe muito bem que os que ele já fez não tem como inventar leis que o punam, pois a Constituição ainda garante que as leis não podem retroagir no tempo, salvo que ele queira retirar isto da Constituição.

    1. porém…

      ..pode ser usada em favor das vitimas dos abusos. mesmo não penalizando o autor poderia fazer virar pó aquilo que decorreu do arbitrio. eu acho, óbvio. precisaria de jurista para confirmar

  6. Direito e justiça

    Há uma crise politica sim. No entanto todos os partidos estão unidos contra a Lava a Jato. No barulho da madrugada o PMDB e o PT deram as mãos. Isso indica que nossos representantes  estão tomando decisões em benefício da democracia, da República e do Direito. Infelizmente o ínclito  Senador Renan declarou , supostamente num arroubo de hipocrisia , que a famosa operaçao policial é sagrada. Do alto da minha insignificância acredito que nem tudo que é direito é justo.

  7. E quanto a divergência na avaliação de convicções?

    Finalmente tem algo que eu concordo com o Jateiro Moro: acho que divergência na interpretação da legislação e na avaliação de fatos e provas não devem ser criminalizados sob pena de se petrificar a jurisprudência e tornar juízes inferiores meros papagaios. Mas acho que a divergência na avaliação de convicções deve ser criminalizada.

  8. O mesmo bla bla……

    O homen de um argumento so……pra ele é tudo interpretação…….parece festival da canção, arte contemporanea ou filme de autor….se tem juiz que pode interpretar na medida do razoavel, são os juizes do supremo, que é um orgão colegial, onde o debate de ideias, discussão e interpretação fazem parte do jogo, para casos complexos que ja passaram por todas as instancias……..mesmo assim os codigos e principalmente a constituição nos finarmente, mandam……..juizeco de primeira instancia segue os codigos e a contituição e calado ja ta errado……..se não vira bandalheira…..hummmm…..ja virou….

  9. Crimes

    O que essa gentinha vem fazendo com a honra das pessoas é simplesmente inacreditável – e não estou dizendo que os atingidos são culpados ou não.  Por isso, acho que a pena de dois anos de prisão é ridícula: um homem desonesto dessa área deve merecer muito, mas muito mais.

  10. Um antivomitório por favor

    Tem certas caras no nosso cotidiano que só de olhar pra elas, pelo menos em mim , dá ânsia de  vômito. A desse “justisseiro”  aí é uma delas.

  11. “interpretação” …

    semântica da lei?

    ele não quer ir em cana (onde estaria por espionar a chefe de estado, se o brasil tivesse um mínimo de seriedade) por praticar “anemia semântica” (alexandre de moraes da rosa)?

    o festejado magistrado, bisbilhoteiro da comandande em chefe do estado maior das forças armadas, e que estaria no xilindró, acusado de terrorismo, se o fizesse no pais cuja capital, washington, frequenta várias vezes ao ano, todos os anos … seria um agente judicial daqueles apontados pelo wikileaks?

    … o festejado magistrado não quer ir para a forca por alta traição (a pena de morte está prevista no estado de sítio) por abusar de “conceitos sem coisa” (lênio streck)?

    o sr moro (aliás, esse negócio de chamar juiz de “excelência”; tribunais de “colenda turma”, “excelsos julgadores” … esse ranço arcaico; pré-histórico … isso tem que acabar) deve muitas explicações sobre seus acordos com membros do judiciário dos eua.

    e não só ele: também procuradores e delegados.

    será que essa gente não anda a cometer crimes contra a segurança nacional?

    o último grande erro de dona dilma foi ter cruzado os braços diante do fato absurdo de ter sido espionada pelo juiz sérgio moro que, naquele momento, cometeu crime militar, sujeito a legislação militar e, por isso, deveria ser imediatamente preso em intalações militares, e se houvesse alguma resistência, que se cumprisse a ordem usando os meios necessários; efetivamente necessários, pois para isso existe exército, marinha e aeronáutica.

    o grande floriano peixoto fez muito pior por muito menos, quando uma cambada de bandidos da elite sulina tentou a secessão do pais. tiveram o que mereceram quando foram exemplarmente punidos.

    hoje, a soberania do brasil está seriamente ameaçada por essa gente.

     

     

  12. Avalio como puro

    Avalio como puro diversionismo retórico do Juiz Moro essa sugestão para inclusão de “norma de salvaguarda”no ante-projeto de Lei versando sobre abuso de autoridade. A vigorar esse tipo de raciocínio, dado que toda norma legal é objeto da dita hermenêutica jurídica, todas as leis deveriam a partir daí incluí-la, o que certamente implicaria numa bagunça legal sem tamanho. Os tribunais superiores certamente não dariam conta das incontáveis ações baseadas nessa norma. 

    O que se observa é um claro mal estar do sistema repressivo contra qualquer iniciativa de tolher ou ao menos reduzir seus super poderes. Dado o contexto político-social, se introjetaram no imaginário de certos escalões da país como “intocáveis”, denominação inspirada na força-tarefa de agentes públicos americanos que na década de 30, à frente o agente da Receita Eliot Ness, combatia o crime organizado. Mas com uma “pequena” diferença: lá eram “intocáveis” porque se assumiam e eram dados como incorruptíveis,  e não por agirem ou se situarem acima ou à margem da Lei como querem os nossos. 

    Era visível o mal-estar do magistrado quando da fala do senador Lindenberg fazendo um apanhado das arbitrariedades cometidas contra o ex-presidente Lula. Tanto que pediu direito à réplica. Estivesse com a consciência tranquila certamente ignoraria as perorações do senador pelo RJ. 

    No que se refere ao Ministério Público, onde o absurdo do enquadramento se efetivamente, cabalmente, indiscutivelmente a denúncia tenha sido realizada com base em fatos e provas inconsistentes ou mesmos falsas? Como e onde caberia dúvida nesses dois parâmetros? Sobre uma decisão tomada com base num texto jurídico se poderia até se arguir o aspecto da hermenêutica, mas em fatos e provas?

    Teria sentido, por acaso, uma peça acusatória conter alusões a “meios” fatos, provas “mais ou menos”? Isso sem esquecermos que o Parquet representa o Estado(alguns dizem “sociedade”), ou seja, já encarnar a parte mais poderosa e substantiva do litígio. Se afirma com convicção, mas com provas e fatos inconsistentes ou passivos de nulidade, e com isso incorre no risco de condenar uma inocente, pode ficar impune seus agentes? Sem esquecermos da reputação destroçada e as consequências materiais e psicológicas.

     

     

  13. Leis são feitas para casos em

    Leis são feitas para casos em que não há bom senso. E no caso de Moro, bom senso na interpretação da leis e até legalidade na sua aplicação passaram longe.

    De qualquer forma, se a proposta do criminoso juiz fosse levada adiante, mesmo com a possibilidade de retroação pro reu, os crimes que cometeu já estão registrados. Moro, se cuidasse com zêlo das responsabilidades que assumiu quando aceitou o cargo de juiz, se não tivesse vendido seu poder… ou melhor, o poder que lhe foi emprestado pelo estado e pelo qual todos nós pagamos, a firmas privadas como a “Globo”, se tivesse recusado medalhas e holofotes, não estaria nessa fria.  É que firmas como essas não têm mesmo o menor pendor para cuidar do que é público, menos ainda do que é do Direito. Organizações outras, como a maçonaria, também não. Moro devia satisfação à Justiça unicamente e nesse ponto falhou.

    Em tempo: Não há o menor sentido em o estado brasileiro receber medalha de firma privada. E é óbvio que Moro só recebeu aquela medalha por estar ocupando cargo público e não por nenhuma outra razão. Confundir-se assim entre o que é público e o que é privado é o sentido mais pleno da ideia de corrupção.

  14. Esse Moro….

    o que juizes e promotores querem é um atestado que lhes garanta a condição de DEUS, já que se achar eles já se acham e a maoria tem certeza.

    Somente num pais subdesenvolvido e de elevada ignorância política há castas e seres superiores e inferiores.

    Mas a dissimulação mais grave diz respeito ao fato chamado interpretação da lei.

    Mas não é interpretação do texto da lei e sim se ele interpreta que a LEI DEVE SER SEGUIDA POR ELE OU NÃO.

    E ele já demonstrou isso quando a lei diz NÃO PODE FAZER e ele foi lá e fez. Ex. divulgar os áudios da presidente, as prisões cautelares e preventivas, condenar sem prova, etc.

    Perguntemo-nos: como seria vista a decisão da Min. Rosa Weber, quando proferiu voto redigido por Moro no Mensalão:

    NÃO TENHO PROVAS MAS O CONDENO PORQUE ASSIM ME PERMITE A LITERATURA.

    Isso é interpretação da Lei????

    Uma dúvida sempre me assalta nestes momentos de discussões nas “altas esferas”.

    Seus argumentos são tão rasos, tão simplórios, tão explicitamente dissimulados que dão a nítida impressão que  ELES ACHAM QUE TODOS OS BRASILEIROS SÃO UM BANDO DE IGNORANTES, IMBECIS E IDIOTAS.

     

     

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