Rui Daher
Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor
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A cegueira sobre o óbvio: soberania alimentar está em risco, por Rui Daher

Agronegócio

A cegueira sobre o óbvio: soberania alimentar está em risco

por Rui Daher

em CartaCapital

Nós, os brasileiros, sofremos de bipolaridade extrema, sobretudo quando se trata da agropecuária. Vamos do complexo de vira-latas ao de buldogue inglês, uma das dez raças de cães mais valiosas do mundo, em segundos.

Sei que a compreensão de textos não é, na atualidade brasileira, um ponto alto. São editados muitos livros, mas não sendo de Rita Lee, profecias sexuais de Alexandre Frota e autoajuda, poucos serão lidos, afinal nos digitalizamos e não para aproveitar dos e-books.  

Nas redes sociais, cada vez mais comum a comunicação feita através de abreviaturas, símbolos, carinhas, palminhas, sei lá o quê. Mesmo em textos mais longos, com pretensão de densidade gramatical e ortográfica, vai-se muito mal. Bem, apenas, os dedos, que percebo de agilidade invejável.

Dito isso, surpreendeu-me a má interpretação dada à minha coluna anterior (27/03/2018), “Agricultura sob Temer: alimentos mais caros, exportações em apuros”.

Vira-latas preferiram estigmatizar o agronegócio e os ruralistas como responsáveis pela provável debacle futura. Alguns, inadvertidamente, torcem por ela como castigo para “eles”, sem perceber eles somos nós. Já, os buldogues ingleses, repetem Galvão Bueno, e se ufanam de nossa condição de mais isso e mais aquilo do planeta. Lembram-se de que já tivemos “o melhor futebol do mundo”, o café, a borracha, a Cidade Maravilhosa, a Califórnia brasileira, a música mais criativa? Pois é.

Nada disso, nem vira-latas, nem buldogues, apenas um alerta para sistemas econômicos em intensa transmutação, impossíveis de não atingir a Federação de Corporações varonil, de brilho intenso, salve, salve, Brasil.

Se isso é óbvio estar ocorrendo no exterior e se aqui aumenta a pobreza, não é razoável pensar um pouco sobre os efeitos para o País de uma queda nas exportações e aumento nos preços dos alimentos.

Pior, isso já ocorre, em atos de fusões e aquisições, bem como de concentração produtiva e mercantil, encarecendo os custos de produção da agropecuária e mantendo os preços dos alimentos acessíveis à população de baixa renda pelo sacrifício dos agricultores que produzem para o consumo interno.

Então, está certa a troika privatista, Parente Serpente à frente, em fechar as plantas produtoras de nitrogenados, a Vale vender as jazidas de potássio, a Bayer para poder comprar a Monsanto vender a unidade de sementes para a Basf, a ChemChina comprar a Syngenta, que acaba de comprar as brasileiras Strider e “agtech”, a fusão Dow Dupont, e tantas mais ocorrências?

Repito: isso tudo será bom para a agropecuária campeã do mundo? E o resto que virá, cada vez mais vulnerável nossa soberania com o governo nas mãos de comprovada e antiga quadrilha entreguista do patrimônio do País e receptora quando se trata de recursos públicos?

Já ouço dos rincões sulinos, produtores de grãos dizendo que a tudo isso irão superar. Se necessário, à bala, Bolsonaro e simulacros. Foi assim, com toda essa confiança, jogada nos ombros do Tesouro Nacional que, há pouco mais de dez anos, vocês quebraram e só voltaram quando a China chegou.

Com um detalhe: todos os países produtores e exportadores, hoje em dia, a querem e dela dependem.

Um pouco mais de atenção, pois, para a agricultura familiar poderia, pelo menos, amenizar nosso status de segurança alimentar.

Há um mês, empresa média que assessoro, abriu 4 vagas para representantes técnicos de vendas (RTV) no estado de São Paulo. Em uma semana, recebeu 221 currículos de agrônomos e técnicos agrícolas. Já pensaram esse exército de reserva de mão de obra levando conhecimento para a produção familiar, como também aos assentados, índios e quilombolas?

Se precisar desenhar, não sei, mas posso pedir a algum especialista de CartaCapital para fazê-lo. Eles são bons nisso.

 

Rui Daher

Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor

7 Comentários

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  1. “…Em uma semana, recebeu

    “…Em uma semana, recebeu 221 currículos de agrônomos e técnicos agrícolas. Já pensaram esse exército de reserva de mão de obra levando conhecimento para a produção familiar, como também aos assentados, índios e quilombolas?…” E ficamos nos chafurdando sobre o assunto Miséria. E dizemos, Nós Brasileiros, não saber por que não saimos disto. Só falta mesmo precisar desenhar. O Brasil é de muito fácil explicação. abs. 

      1. Zé….

        Caro sr. Rui, nem bom nem ruim. Excelente. Sua especialidade é Agropecuária. A mão de obra e conhecimento extraordinários produzidos por esta Nação e sua Juventude. E que nós, imbecilmente, a estamos disperdiçando como o sr. cita. Agricultura Familiar, Indigenas e Quilombolas com Assistência Técnica, demonstrada em 221 CV’s, produziriam excelência, produtividade, melhoria de condições sociais a que nível? Muita discussão ideológica na maioria das vezes relega o dia-a-dia ao segundo ou terceiro plano. E é o dia-a-dia que revolcionará este país. abs. 

  2. Aço

    Aço e plataformas de petróleo, vamos comprar da China é mais barato, me garantiu um engenheiro da Petrobrás.

    Valente ele porque ainda tem o emprego. Ele que aguarde o Parente passar por lá. Vai chegar à brilhante conclusão que o culpado pela empresa ter afundado foi o bolivariano Getúlio Dornelles Vargas.

    Os ruralistas apoiam o exército apoia o supremo de frango apoia os jornais apoiam e os midiotas adóram o rumo que o Brasil, esta poha, tomou pelas mãos do grande timoneiro Temer.

    Muito provavelmente o errado é o Sr. Rui Marin Daher e nós outros celerados que nos preocupamos assim como ele o faz.

    1. Aço….

      emerson57: até o óbvio nos é de difícil compreensão. Se os preços são a base para não ser gasto dinheiro a mais que o necessário, então, não deveria ser a base do pensamento nacional? Não deveria ser o caminho para toda a Sociedade? Então, para que temos mais que 500 das Maiores Filiais das Maiores Empresas Mundiais, nos vendendo o restolho da sua produção (automóveis, remédios, defensivos agrícolas, telecomunicações, máquinas,…) a preços extorsivos e achacadores? Quanto não renderia  e seria mais benéfico para o fim da miséria nacional se tais preços fossem mais módicos e próximos à realidade nacional? E não venham apenas “com os tais dos impostos”. 100% sobre 1,50 real deixaria a gasolina custando 3 reais. Ainda seria na média 25% mais barata que os preços atuais. E estamos falando de 100% de impostos, hoje na casa de 32%. Ganhos de Produtividade, de Escala, Transferência de Tecnologia e Produção Nacional não deixaria os atsi preços Nacionais para a Petrobrás ainda mais convidadivos? Mas o pior de tudo, como o seu colega Engenheiro, não enxergam que trabnsferimos Empregos e Renda Nacional para o Exterior. Compramos qualquer porcaria que nos vendem a preços proibitivos. E ainda vendemos as Matérias Primas, base de qualquer Industria Mundial, sem produzir desenvolvimento, produtos, infraestrutura, conhecimento, royalties, EMPREGOS, tecnologia dentro do nosso próprio país. Como o sr. disse, quando o tal Engenheiro, hoje empregado, não tiver onde trabalhar, pois importaremos seu EMPREGO, enxergará o tamanho da imbecilidade vendida em Privatarias. abs.  

      1. atualidade:

        Damos ao trabalhador nacional o privilégio de dormir em confortáveis camas de jornal sob esplendorosas marquises e nas alvas areias da praia de Santos e fornecemos empregos para os congêneres chineses.

        Há uma diferença entre os dirigentes dos dois paises. Na China eles cuidam do próprio povo e são patriotas.

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