É preciso conter o otimismo com a vacina acelerada contra COVID-19, por Frederico Rochaferreira

O que temos até agora é uma alta proporção de vacinas não promissoras mesmo antes dos ensaios clínicos e uma proporção significativa de vacinas testadas em ensaios clínicos  que deixam dúvidas

É preciso conter o otimismo com a vacina acelerada contra COVID-19

por Frederico Rochaferreira

Hoje existem mais de 90 vacinas 1 para o coronavírus em estágios de desenvolvimento. A grande questão agora para desenvolvedores, financiadores e para a população mundial é ter a certeza quais vacinas realmente serão eficazes e se haverá problemas de segurança. 2 Nesse esforço mundial pelo desenvolvimento de uma vacina para combate à pandemia, o Instituto Jenner da Universidade de Oxford saiu na frente. Os testes em humanos já começaram e se eficazes, estariam disponíveis a partir de setembro, o que seria muito antes que qualquer outro esforço na produção de uma vacina atualmente em andamento.

Sabendo que o coronavírus SARS-CoV-2 usa sua proteína spike para se ligar aos receptores ACE2 nas células humanas para obter acesso e causar a infecção, a vacina em desenvolvimento pela equipe do Dr. Adrian Hill, de Oxford, visa fazer com que o corpo reconheça e desenvolva uma resposta imune a essa proteína e evite a infecção. 3

Nos EUA,  a empresa de biotecnologia Moderna em conjunto com o Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas, também está trabalhando no desenvolvendo de uma vacina contra o coronavírus. Em maio a Moderna revelou através de um comunicado à imprensa 4 os primeiros resultados em humanos, apontando que a vacina desencadeou uma resposta imune em pessoas e protegeu ratos de infecções pulmonares.

Esses resultados foram amplamente interpretados de forma positiva chegando a provocar alta nos preços das ações, mas especialistas dizem que, como os dados não foram publicados, faltam os detalhes necessários para se avaliar adequadamente as afirmações, 5 cautela 6 que se estende a outros resultados de vacinas aceleradas como a da Universidade de Oxford, em que testes mostraram que a vacina preveniu infecções nos pulmões de macacos expostos ao SARS-CoV-2, todavia o nariz dos animais abrigava tanto vírus quanto os dos macacos não vacinados, 7 advertência semelhante já relatada por um grupo de 36 cientistas chineses que também trabalham no desenvolvimento de uma  vacina contra o coronavírus, logo após os primeiros  testes em animais. 8

O que temos até agora é uma alta proporção de vacinas não promissoras mesmo antes dos ensaios clínicos e uma proporção significativa de vacinas testadas em ensaios clínicos  que deixam dúvidas, 9 o que não impede os não especialistas de se mostrarem extremamente confiantes em suas previsões, enquanto os epidemiologistas continuam dizendo que realmente não sabem muito. Para a Dra. Anne W. Rimoin, 10 pesquisadora de doenças infecciosas da Universidade da Califórnia, “Este é um vírus novo para a humanidade e ninguém sabe o que vai acontecer”. 11

Por outro lado, tão importante quanto encontrar uma vacina eficaz em tempo recorde, é fabricá-la em grande escala, porque as pessoas podem precisar de mais de uma dose, sem esquecer que é preciso produzir bilhões de frascos e seringas para ministrar a vacina. Os EUA, por exemplo, pode levar até dois anos para produzir frascos suficientes para atender suas necessidades, segundo informou o ex-diretor da Biomedical Advanced Research and Development Authority, Rick Bright.12

Nessa equação entra ainda a prioridade na administração da vacina. Contrariando a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS), que pede um compartilhamento equitativo das vacinas Covid-19, no sentido que devem ser vistas como um recurso global, países que abrigam instalações de produção de vacinas deverão primeiro atender as necessidades domésticas antes que possam exportar. Robin Robinson, que liderou a Biomedical Advanced Research and Development Authority de 2008 a 2016, disse que a agência gastou bilhões de dólares desenvolvendo a capacidade na produção de vacinas nos Estados Unidos com base nessa suposição. 13

Por isso, é preciso que o exemplo da humildade epidemiológica assim como outras partes da equação que envolve o desenvolvimento de uma vacina contra a COVID-19, possa penetrar no discurso e na consciência pública.

Frederico Rochaferreira – Escritor – especialista em Reabilitação pelo Hospital Albert Einstein, membro da Oxford Philosophical Society

Referências:

1 https://www.nature.com/articles/d41586-020-01221-

https://www.nature.com/articles/d41586-020-00751-9

3 http://www.ox.ac.uk/news/2020-04-23-oxford-covid-19-vaccine-begins-human-trial-stage

4 https://investors.modernatx.com/news-releases/news-release-details/moderna-announces-positive-interim-phase-1-data-its-mrna-vaccine

5 https://www.statnews.com/2020/05/19/vaccine-experts-say-moderna-didnt-produce-data-critical-to-assessing-covid-19-vaccine/

https://www.nature.com/articles/d41586-020-01092-

7 https://www.biorxiv.org/content/10.1101/2020.05.13.093195v1

https://science.sciencemag.org/content/early/2020/05/06/science.abc1932

9 https://www.washingtonpost.com/opinions/2020/05/19/rush-share-good-news-covid-19-drugs-is-undermining-science/

10 https://www.ph.ucla.edu/epi/faculty/rimoin/rimoin.html

11 https://www.sun-sentinel.com/coronavirus/sns-nyt-coronavirus-reopening-mystery-20200521-yoywiu6bnfezfdeuaaxbdot5wu-story.html

12  https://www.phe.gov/about/barda/Pages/default.aspx

13 https://www.statnews.com/2020/05/06/mounting-promises-on-covid-vaccines/

Redação

3 Comentários

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  1. Mesmo em países ricos, já acostumados com combates a problemas sanitários e que estão seguindo melhor os passos recomendados, a abertura não garante “normalização”

    Medo de contágio inibe consumo mesmo sem isolamento social
    Estudos na Coreia do Sul e na Escandinávia indicam gastos menores mesmo com regras brandas de circulação

    https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/06/medo-de-contagio-inibe-consumo-mesmo-sem-isolamento-social.shtml

  2. O mais interessante de tudo é que 91 grupos se lançaram a fazer uma vacina e ninguém sabe se o corpo produz anticorpos contra o Covid-19 com suficiente memória imunológica para que QUALQUER VACINA funcione.

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