Enquanto Bolsonaro ganha tempo, as oposições perdem, e o Brasil segue à deriva, por Álvaro Miranda

O governo completa dois anos não tendo feito coisa alguma praticamente em termos de avanços, apenas acumulando crises, denúncias, manchas, sem, contudo, desmoronar, graças à capacidade do adiamento das crises maiores.

Sergio Lima – Poder360

Enquanto Bolsonaro ganha tempo, as oposições perdem, e o Brasil segue à deriva

por Álvaro Miranda

Em que pesem os desarranjos verbais como falta de controle do esfíncter do decoro presidencial, inegável a mudança de tom de Bolsonaro diante das diferentes ações do Poder Judiciário. A situação poderia nos fazer concluir que a democracia tem se garantido pela força de determinados atores e instituições, diferentemente de uma suposta situação ideal que seria a ação coletiva de partes da sociedade que estão fora da máquina pública.

Mas, se isso é verdade, faz parte não só do jogo “democrático”, digamos assim, mas sim do próprio complexo de lutas de classes (no plural mesmo), entendido como conjunto de conflitos entre diversos setores, por diferentes motivos, dentro e fora dos aparelhos de estado, para não embarcarmos na ideia vulgar da contradição ser apenas entre classes possuidoras dos meios de produção e trabalhadores assalariados.

Mas não só as ações do Poder Judiciário forçaram a mudança de tom. Sim também, além da pandemia, as circunstâncias materiais do jogo político e econômico. Vale dizer: o que fazer e como fazer ou o que escolher para deixar de fazer diante de crises ou de janelas de oportunidades para investimentos. Nisso tudo, o fator temporal é determinante para a acomodação ou precipitação de situações e mudanças.

Em vez do empreendimento concreto de políticas públicas, Bolsonaro apenas ganha tempo com os recursos disponíveis, no caso, os mais imediatistas, como uma política populista de tutela assistencial, ampliando ou mantendo seu apoio já conquistado. É o micro possível dentro da lógica macro do adiamento de crises do sistema inerentemente portador de crises. O capitalismo vive de crises e de suas tentativas de adiamento constante quando os conflitos se acirram – o que alguns chamam de ciclos.

Mas, a lógica não é nunca segura, e a pandemia é um exemplo do imponderável na política e na economia. Agosto é mês emblemático de aceleração do calendário. Em setembro o ano começa a acabar. O governo completa dois anos não tendo feito coisa alguma praticamente em termos de avanços, apenas acumulando crises, denúncias, manchas, sem, contudo, desmoronar, graças à capacidade do adiamento das crises maiores.

Não se trata de talento de Bolsonaro, mas de saber usar os recursos que têm quando se exerce o poder, e isso qualquer bom chefe de repartição consegue fazer. Refere-se não à sua capacidade de liderança e carisma, ou administrativa, mas sim às possibilidades oferecidas pelo próprio jogo político.

Tal jogo, sabemos bem, é constituído pelas cartas marcadas de determinados jogadores que não fazem questão de que as coisas mudem muito desde que as regras não sejam quebradas, nem certos lances levados ao extremo. Por isso que a ideia de golpe não vingou e talvez tenha sido sempre um blefe. Porque Bolsonaro percebeu que podia jogar o jogo que já existe.

Se tivesse sido mais inteligente no início e menos bronco, mesmo considerando que suas grosserias e idiotices são aplaudidas por diversos setores, talvez seu apoio hoje fosse maior ainda do que já é. Bolsonaro se tocou disso, está consolidando o que já tem e voltando a tentar a conquistar mais apoio. Nunca governou e nunca deixou de fazer campanha, que entra numa nova fase nessa metade do governo.

Enquanto Bolsonaro ganha tempo, as oposições perdem tempo com idiossincrasias e vaidades. Se o povo é ou não burro, discussão bizantina nas redes sociais, isso sai na urina da luta política concreta de um jogo quase de cartas marcadas em que uma das questões chaves é o fator temporal.

O clássico brasileiro do jogo clientelista tem sido que, em qualquer situação de confronto, diante de muita controvérsia ou impasses, o lance mais promissor é a postergação de decisões ou acordos. Bolsonaro não tem pressa de nada. Postergar faz parte da cartilha da chamada velha política.

As oposições, por sua vez, das duas, uma: ou parecem contar com o lance de um jogo de dados, alguma crise aguda vinda do céu como tempestade – o lance da sorte. Lance que não comporta uma jogada “marcada” em seis possibilidades, isto é, as faces do cubo lançado aleatoriamente. Em outras palavras, esperar que Bolsonaro caia sozinho como quem escorrega no ladrilho da cozinha e bate a cabeça.

Ou têm alguma carta escondida na manga para o revezamento em 2022, num jogo cuja banca, por outro lado, é o próprio governo. Banca porque é o governo quem vem pautando os conflitos. E assim essas oposições aproveitam-se de sua posição de jogadores privilegiados dentro da multiplicidade de atores – atores não limitados a um cubo como o do jogo de dados, mas sim no poliedro das lutas de classes. Podem não ganhar, mas podem perder pouco, continuando o jogo tradicionalmente jogado.

Na prestidigitação da democracia de elites, alguns gritam nas redes sociais, outros cospem fogo de vitupério em diferentes tribunas, outros fazem “lives” repetidas e monótonas para suas bolhas. Bolsonaro cresce pelo menos por enquanto ganhando tempo, o tempo de todos nós.

Se me acusarem de estar falando sem legitimidade por não pertencer a partido político ou não fazer parte de movimentos sociais, ou então por estar desinformado, peço a gentileza para refutarem o que disse nessas linhas. Ficarei muito feliz se eu estiver errado.

Redação

3 Comentários

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  1. BREVE CURRÍCULO DE UM MITO BUNDÃO (COM TODO RESPEITO, (DES)PRESIDENTE!).
    Bolsonaro é um animal auto-promotor ensaboado com experiência. Não é à toa que se (re)elegeu por mais de 7 mandatos. Já elegeu também 3 filhos, sendo um, menor de idade, contra a própria mãe dele.
    No idolatrado exército, atuando como sindicalista de caserna, foi preso por indisciplina e processado por ameaças à instituição e até à população da segunda maior cidade do país, escapando de um processo no STM em plena ditadura! Caiu para cima como vereador e depois como deputado.
    Desde a juventude, aprendeu que sua mediocridade intelectual e instabilidade emocional (e espiritual?) poderia ser usada a seu favor: quanto mais bizarro o seu comportamento e afirmações, mais chamava a atenção!
    Suas respostas são tão bizarras que desconcertam até interlocutores respeitados que não o conhecem. Mas escapa e foge do debate com aqueles já o conhecem, como no único debate que fez, onde ficou claro que apanharia até do cabo Daciolo. Basta conhecê-lo e ter disposição para enfrentá-lo, como o histriônico Datena “bundão”…
    Cercado de seguranças, é um corajoso e agressivo atleta de UFC contra jornalistas armados de simples perguntas. Ameaçado por gatunos de motos, entrega até sua amada arma. Depois diz que “ouviu dizer” que os seus algozes tungantes foram “eliminados” pelas forças justiceiras dos “cidadãos de bem” que o cercam.
    Com tudo isso e a ajuda em tempo de uma facada que dominou a campanha, conseguiu até eleger-se (des)presidente.
    Agora o tempo corre a seu favor: tempo para aparelhar tudo que for possível com anti-ocupantes em cada cargo, com foco nos “seus” (familiares, militares e relações milicianas e virtuais) e na sua ideologias.
    Com um inacreditável presidente da Câmara que, sem esquecermos que é do DEM e apoia as reformas ultraneoliberais de seu Guedes, mas de forma “eficinte”, ordenada e não atabalhoada, agindo como uma dedicada governanta.
    Com um PGR, uma AGU e um min. da Justiça que agem como advogados até de pessoas externas ao governo (afinal não deixa de ser uma interpretação de “UNIÂO”, a “deles’).
    Com eleições que podem mudar a presidência do Congresso para colocar (tem a caneta BIC e a chave do cofre) mais fiéis e obedientes da hierarquia e disciplina militares e não democráticas.
    Com um Centrão que está aí para o que “derem e vierem”.
    Com um STF que perderá dois membros a serem substituídos por mais fiéis e obedientes.
    E redes de rádio e TV que o apoiam, além de igrejas com milhões de fiéis muito fiéis, banqueiros recheando suas “reservas”, ruralistas grileiros, madeireiros e garimpeiros, nacionais e estrangeiros e os demais capatazes e corretores do patrimônio comum construído e pago com o bloso do contribuinte desde sempre.
    Contato: Palácio das Emas Fugitvas da Cloroquina – BraZília, DF.

  2. Nonada.
    Não temos com que nos preocupar. Na milésima quadringentésima nonagésima oitava live, Lula declarou confiante: “Temos todas as condições de tirar Bolsonaro em 2022”…

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