Paradigmas para o combate a fome: China, Cuba, Brasil, por Rogério Mattos

Paradigmas para o combate a fome: China, Cuba, Brasil

por Rogério Mattos

Tanto a China quanto a Rússia, nos últimos anos, tem anunciado metas ambiciosas de combate à pobreza. Como tudo o que é chinês, é grandioso o que se diz naquele país sobre o fim da fome e da miséria. Contudo, somente depois de cumpridas condições bem particulares, os dois países asiáticos se lançaram nessa campanha. O Brasil continua sendo, no século XXI, o modelo para outros países. Não muito diferente do que foi Cuba para o século passado. O ponto a ser considerado é por que, até hoje, a atenção ao social se moveu de maneira paralela, porém não concomitante, ao desenvolvimento científico e tecnológico. E isso desde os grandes surtos industrializantes no século XIX, seja nos EUA ou na Alemanha, como casos clássicos.

Com razão se aponta os subsalários na China como condição para seu desenvolvimento econômico. Isso ainda é fato. É um modelo muito próximo ao que foi adotado aqui no Brasil durante a ditadura. Somente agora, depois da relativa consolidação dos BRICS, em 2014, do lançamento da Nova Roda da Seda, ou seja, do incremento do desenvolvimento autônomo entre os países, principalmente asiáticos, fora do eixo comercial do Atlântico norte, é que a China publicamente anunciou um programa deliberado para acabar com a pobreza. Putin fez igual. No caso da Rússia, o discurso em que anunciou as novas tecnologias militares do país (em especial, os mísseis supersônicos anti-balísticos e o míssil submarino de propulsão nuclear) também foi onde ele enfatizou a necessidade de se investir no social. Com a parte militar se desenvolvendo de maneira mais do que suficiente, e com o contorno às sanções econômicas e às manipulações do preço do petróleo, em particular por causa da mesma parceria euroasiática, o social entrou na agenda.

Quando se fala de desenvolvimento econômico e social, infelizmente, entra toda a babaquice ambientalista. Ainda mais caso se coloque a China no meio… Prefiro não comentar, por enquanto.

Vale lembrar que quem colocou esse tema na pauta internacional, no século XXI, e hoje o sucesso do programa é admirado e estudado em todo o mundo – é uma referência internacional inclusive para a China e para a Índia – foi o presidente Lula, logo quando tomou posse em 2003. No caso do desenvolvimento social, do fim da pobreza e do analfabetismo, somos (apesar do golpe) o exemplo no século XXI, como Cuba foi no século passado. A parte da indústria pesada, do desenvolvimento tecnológico, o padrão histórico atual – desde os grandes surtos industrializantes do século XIX – se desenvolve de maneira paralela, porém não necessariamente de maneira concomitante, à preocupação com o social.

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A promessa cumprida

É assim em toda a modernidade. Nem os EUA do século XIX contornaram o déficit escravocrata, caso contrário não teriam que ter um Martin Luther King em pleno século XX, coisa que Luís Gama já fazia aqui no Brasil em pleno Império. O chamado “estado de bem-estar social” propriamente dito só ocorreu no pós-guerra, com a liderança de Roosevelt e o Plano Marshall. A China agora propõe a Nova Rota da Seda, algo avaliado em pelo menos 100 vezes maior que o plano de reconstrução da Europa no pós-guerra. O fato é que esse plano chinês, de integração regional em sua base, cumpre inúmeras promessas do mesmo século XIX, época dos primeiros surtos industrializantes, como a criação de um eixo Berlim-Bagdá ou a ligação dos países bálticos com a França. Nesse mesmo sentido, foi criado a Transiberiana, que deveria ligar a Europa com a Ásia através do Oriente Médio. É exatamente o mesmo desenho, agora mais elaborado, que surge com a Nova Rota da Seda.

Hoje, a importância de olhar a China, como também a Rússia, é a construção de um eixo anti-hegemônico, contra as práticas financeiro-especulativas da City de Londres e de Wall Street e de todo o partido da guerra que se move em seu entorno. A criação de um Novo Paradigma para a Humanidade, de desenvolvimento econômico e combate à fome, é o que unirá o que dois séculos fizeram se desenvolver em separado: a industria e a questão social. O fim dessa clivagem é o que deve marcar a falência do paradigma da Nova Guerra Fria, infelizmente tão atual e talvez mais violenta – e acelerada – do que a antiga.

Para finalizar, indico esse vídeo que traduzi, um breve documentário, que apresenta a Nova Rota da Seda e suas implicações para a construção de um novo paradigma para a humanidade.

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Rogério Mattos: Professor e tradutor da revista Executive Intelligence Review. Formado em História (UERJ) e doutorando em Literatura Comparada (UFF). Mantém o site http://www.oabertinho.com.br, onde publica alguns de seus escritos.

 

Redação

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