Quem fuma não pensa no câncer; quem rouba não acha que será preso

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Por Luis Alberto Mendes Junior

Na CartaCapital

Luiz Mendes, autor deste texto, é o primeiro à direita; o registro, com outros internos, foi feito quando ele passou por uma instituição para menores, em São Paulo, nos anos 1970

O que é o ser humano, talvez uma junção entre o mal e o bem? Há pessoas decentes e pessoas torpes em todos os grupos. Na prisão conheci carrascos que sentiam prazer em sacrificar o preso. Assim como conheci guardas cuja bondade e amizade me comoveram às lágrimas. Da mesma maneira como conheci presos que tinham prazer em matar, assim como outros que colocavam suas vidas em risco para salvarem outras vidas.

São extremos, mas tanto o guarda como os presos comuns estavam no mesmo meio, da mesma maneira que toda humanidade está no mesmo barco. Somos tão capazes de maldades quanto de bondades. Depende de nossa orientação, criação, circunstâncias e de vários fatores que influenciam, mas nenhum que determine cabalmente. Somos seres que escolhem.

A redução da menoridade penal não reduzirá a delinquência juvenil. Só engrossaria as fileiras de desajustados que um dia sairiam da prisão mais ressentidos e brutalizados. O jovem violento não surge do acaso, como a chuva que cai do céu. Somos todos culpados, junto com eles, por construirmos uma sociedade violenta, individualista e impiedosa.

Ao contrário de prender, é preciso investigar e pesquisar porque alguns jovens estão cometendo certas barbaridades. Qual o motivo que os levam a serem tão violentos? E então combater esses motivos, e não destruir o presente e o futuro de tantos jovens.

A pessoa que vai fazer qualquer coisa errada acredita que nunca será flagrada, como quem fuma não acredita que poderá desenvolver um câncer. Quem rouba, estupra ou até assassina, não acredita que será preso. Geralmente quando o delinquente é preso, já cometeu uma série de delitos anteriores – e que nunca lhe serão imputados. Apenas 5% dos crimes são solucionados, segundo a própria polícia. Não será o medo de ir para a prisão que vai amedrontar o jovem já cooptado pelo crime.

Fui um desses jovens delinquentes, cometia pequenos roubos e furtos quando menor de idade. Somente quando passei a maior de idade, já impregnado pela cultura do crime, parti para o assalto que me fizeram cumprir mais de 30 anos de prisão.

Até as organizações criminosas têm o limite dos 18 anos para admitir novos elementos em suas fileiras como iguais. O menor de idade pode ser simpatizante, mas não um “irmão”. É óbvio que se diminuir a idade penal, também eles diminuirão a idade de admissão. Os menores de 16 anos assumirão os postos dos que então, já considerados maiores de idade, passariam a comandar: mudaria apenas a hierarquia criminal.

Os adolescentes que assumiriam a posição dos “maiores de idade” teriam menos capacidade crítica ainda em suas ações criminosas. Ao contrário do que pensam os que nada conhecem do assunto, guiados pelos mercenários televisivos, o barbarismo seria maior ainda.

O Estatuto da Criança, o famoso ECA, jamais foi aplicado integralmente, assim como a Lei de Execução Penal. O governo jamais investiu de fato e jamais foi capaz de aplicar as leis contidas nesses códigos com firmeza e determinação. É mais fácil e barato encher as ruas de homens fortemente armados e dominados pela doutrina do extermínio. E são os jovens, particularmente negros e das periferias das nossas grandes cidades, suas vítimas preferenciais.

Então voltamos ao começo do texto. Sim, o homem é uma junção de mal e bem. Tanto os tais “homens de bem” que legislam e aplicam as leis contra os jovens “maus” que cada vez mais cedo se tornarão vítimas de suas manipulações eleitoreiras.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

6 Comentários

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  1. “Ao contrário de prender, é

    “Ao contrário de prender, é preciso investigar e pesquisar porque alguns jovens estão cometendo certas barbaridades. Qual o motivo que os levam a serem tão violentos? E então combater esses motivos, e não destruir o presente e o futuro de tantos jovens.”

     

    A questão não é essa! As causas devem ser combatidas, mas o sintoma também, ou não é impunidade um homicida sair apos tres anos encarcerado ecom a ficha limpa? Se não, temos de buscar outra definição para a palavra impunidade.

  2. Dilema
    Acho o texto aprovado razoável: não prende um adolescente que furta uma bicicleta ou picha um muro, mas mantém assassinos e estupradores na cadeia.

    Resolve alguma coisa? Na minha opinião sim: os quatro rapazes do Piauí não teriam a chance de estuprar e matar as meninas se essa lei estivesse em vigor. Alguns alegam que isso destrói a vida dos rapazes: em primeiro lugar, todo delinquente começa com crimes leves, testando a tolerância da sociedade progressivamente até ser punido; tivessem esses jovens sido presos, não imagino como poderiam estar piores.

    Em segundo lugar, a situação atual destituiu a vida das quatro meninas; igualmente pobres e desamparadas. Se for simplesmente uma questão de opção, opto por proteger a vida destas.

    De qualquer forma, o projeto não exclui medidas sócio educativas, e é bem possível que os interventores, trabalhando apenas com crimes leves e usando a prisão como argumento de dissuasão, consigam melhores resultados (baseado na experiência da minha esposa, assistente social durante vários anos no interior de SP, e que apoia a mudança).

  3. Quem fuma não pensa no

    Quem fuma não pensa no câncer; quem rouba não acha que será preso

       Ué, e qual a novidade ?

       Vc esqueceu de dizer a palavra chave: Adrenalina.

             Isso serve tbm pro jogo, drogas, paixões absurdas e etc.

                Não estou ensinando nada.

                    Apenas lembrando pra vc.

                     E atenção: Se vc não viveu nenhuma dessas adenalinas, sem história pra contar, vc nasceu morto e não sabe.

  4. tanto  um como o outro  sabe

    tanto  um como o outro  sabe  muito bem  que  é  errado o que  fazem, portanto o probnlema nao estar  em  achar que nao vai tert  cancer  ou  que  nao vai ser preso  e sim  no delito que ele  sabe  que  esta  cometendo  ou do crime  que ele  estar cometendo contra seu proprio corpo.Ja  tive contato muito proximo com  presos  e sei  o que pensam. Certa  VEZ  um me  disse:Sr  Tadeu , o senhor acha que  quando eu sair  daqui  vou  trabalhar para  ganhar  salario minimo?Eu vou é pegar numa  metranca  e  vou assaltar. Por  acaso ele nao sabe  que  pode  acabar morto  ou preso?

     

  5. Redução é barbárie

    Só quem nada entende de educação, de desenvolvimento humano ou de juventude pode ser a favor dessa aberração, que no fundo é só mais um entreguismo aos interesses internacionais, no caso, à privatização dos presídios brasileiros – http://goo.gl/pxIxbG

    Jovem é chamado de jovem por que ainda está em processo de formação e, portanto, ainda depende dos adultos para completar essa trajetória.

    As explosões de violência juvenil são infinitamente mais agressivas que a dos adultos, porque ainda não têm o domínio pleno de si nem o conhecimento completo do mundo.

    É só analisar as rebeliões na Fundação Casa, com os meninos jogando bola com as cabeças decapitadas dos seus mortos. No transe da violência, eles saem de si, não têm medo de morrer, nem de qualquer outra consequência. Adultos encarcerados não fazem isso. Ninguém é besta de expor a própria vida.

    É esse tipo de delinquente, como o texto adverte, que a nova legislação atrairá para o mundo do crime. Se alguém acha que a violência no país está difícil de aguentar, prepare-se, porque a vida por aqui vai se tornar um INFERNO.

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