Existe outra Maidan chocando no ninho da Ucrânia?

 

The Moscow Times

Is There Another Maidan Brewing in Ukraine?

Por Josh Cohen

Tradução: Stanilaw Calandreli

Mykhailo Palinchak / Ukrainian Presidential Press Service / Handout via Reuters / Reuters

Desde as eleições parlamentares de outubro e os recentes acontecimentos no leste da Ucrânia, o povo ucraniano tem focalizado sua atenção para o considerado inimigo externo, a Rússia. Em algum momento, no entanto – principalmente se o cessar-fogo do Minsk II continuar – os cidadãos da Ucrânia tornarão seus olhares para Kiev – e podem não gostar de tudo o que veem.

A economia da Ucrânia está atualmente em estado de colapso. Após encolher 7,5 % no ano passado, estima-se contrair outros 6% em 2015. Nada surpreendente seria o fato de os efeitos dos problemas económicos da Ucrânia serem, em grande parte, suportados pelas pessoas comuns.

O salário médio mensal pelo câmbio atual é de apenas US$ 170, e a inflação anual é próxima a 30%. Pior ainda, de acordo com um estudo do Instituto Cato, se o colapso do valor da moeda da Ucrânia for levado em conta, a taxa da inflação real chega a 272% – o que significa que a Ucrânia corre o risco de sofrer uma hiperinflação que devastaria o poder aquisitivo dos ucranianos.

Infelizmente, esses números ainda não mostram tudo aquilo que o povo da Ucrânia está enfrentando. Como resultado de um programa de austeridade rigorosa exigido pelo FMI, o parlamento da Ucrânia já promulgou o congelamento do salário mínimo e cortes drásticos nas pensões e outras despesas com os aposentados e funcionários públicos.

Enquanto isso, no setor da energia, o preço do gás utilizado pelos consumidores deverá triplicar, o que ameaça fazer as contas de gás e dos outros serviços básicos inacessíveis para milhões de pessoas.

Pelo outro lado, os cidadãos da Ucrânia vão querer ver melhorias reais com reformas tão dolorosas, principalmente na luta contra a corrupção que os ucranianos percebem na sua vida diária. A Ucrânia foi taxada pela ONG anticorrupção, Transparência Internacional, como sendo o país mais corrupto da Europa em 2013, e o principal propulsor da revolução Maidan foi o desejo de pôr fim ao estado mafioso predatório.

Infelizmente, porém, não houve progresso na luta contra a corrupção. Em agosto de 2014, Tetiana Chornovol, uma das mais proeminentes defensoras da política anti-corrupção na Ucrânia, renunciou ao cargo de chefe do Comitê Nacional da Anticorrupção do governo. Em um artigo amplamente lido no site da Ukrainska Pravda intitulado, ”Adeus Gabinete de Ministros”, Chornovol criticou duramente o governo pós-Maidan, afirmando que “não há vontade política na Ucrânia para realizar uma guerra em larga escala contra a corrupção”.

Embora o governo não seja mais, tão descaradamente, uma organização mafiosa, a corrupção continua endêmica em toda a sociedade ucraniana. Em uma entrevista recente com Tomas Fila, da EMPR Mídia da Ucrânia e chefe da Associação Europeia de Negócios, ele afirmou que os partidos do governo pós-Maidan continuam envolvidos em atividades corruptas.

As preocupações de Fila tem como exemplo o escândalo envolvendo o serviço fiscal da Ucrânia. Em meio a muito foguetório, o banqueiro de investimento, Igor Bilous, 39 anos, foi nomeado como chefe do serviço fiscal, em março de 2014. Bilous representava o tipo do jovem ativista que exigia reformas nos protestos de Maidan. Menos de um ano depois, no entanto, Bilous foi demitido em meio a alegações de que seus inspetores foram coniventes com a polícia e os promotores em vários esquemas de corrupção.

Isso não quer dizer que Kiev não tenha tomado medidas para combater a corrupção. A Ucrânia criou um novo bureau anticorrupção que irá funcionar como uma agência nacional independente, com autoridade para investigar funcionários do governo em todos os níveis, até mesmo a presidência. Os funcionários do governo são, agora, obrigados a divulgar anualmente sua informação financeira, que será acessível ao público. Estas medidas têm potencial para ajudar.

O problema das percepções. De acordo com uma pesquisa realizada pelo Instituto Internacional de Sociologia de Kiev (KIIS), a grande maioria dos ucranianos acredita que o nível de corrupção não melhorou, ou até mesmo piorou. “90% das pessoas estão insatisfeitas com a forma com que Poroshenko luta contra a corrupção”, disse o diretor-geral do KIIS, Volodymyr Paniotto.

O risco é que os ucranianos estarão menos propensos a aceitar a austeridade econômica caso eles acreditem que os funcionários públicos continuam a fazer negócios como de costume. Volodymyr Ischenko, que estuda os movimentos de protesto social na Ucrânia, no Centro de Pesquisa Social e do Trabalho, em Kiev, já observou rumores de descontentamento social e econômico na sociedade ucraniana.

Ischenko coletou dados sobreas manifestações públicas no segundo semestre de 2014, e notou algumas diferenças marcantes. Em áreas onde as manifestações anteriores eram geralmente pró-Ucrânia e anti-Rússia, o que Ischenko denominou de “manifestações patrióticas” – no final de 2014 Ischenko observou um número muito maior de protestos contra as condições sociais e económicas na Ucrânia.

“Muitas pessoas estão começando a falar mansamente sobre a ideia de outro Maidan. Talvez não num nível político mais elevado, mas por pessoas comuns em discussões cotidianas. A economia vai se deteriorar ainda mais, e estamos prestes a ver um enorme aumento nos preços da energia. Isso afetará não apenas os pobres, mas também a classe média. E a questão é: quanto tempo a sociedade vai tolerar isso?” disse Ischenko.

Ischenko não previu exatamente quando a Ucrânia poderá ver nova agitação social generalizada, mas teme que a iniciativa possa vir da ala ultradireita das milícias privadas, que cavaram uma tremenda quantidade de autonomia para si devido às fraquezas do Estado ucraniano e do poder militar.

Muitos desses batalhões controversos já deram a entender que eles poderão derrubar o governo existente, se as condições na Ucrânia não melhorarem. O Batalhão Azov prometeu “levar a guerra a Kiev”, enquanto militantes do Batalhão Aidar, recentemente, tentaram invadir o Ministério da Defesa para protestarem contra os planos de aglutinar o batalhão ao serviço militar regular, ou eliminá-lo.

Sergei Yuldashev, promotor em Kiev, afirmou publicamente que está preocupado com a possibilidade de Aidar tentar montar um golpe de Estado, a qualquer momento. Enquanto isso, o comandante do Batalhão Donbass, Taras Konstanchuk, ameaçou os membros do Parlamento, dizendo que “até começarmos a controlar aquilo que realmente vocês devem fazer nada fará sentido. Devemos entrar no prédio e dizer que tipo de leis vocês deverão assumir, seus vagabundos? Só há uma maneira de vocês saírem daqui, e isso é primeiro os pés”.

“Se houver outro Maidan, as forças de direita desempenharão o papel da liderança”, disse Ischenko, “eles atacariam o governo mais por não defender a nação do que por causar pobreza e crise social. Entre corrupção, economia e a direita nacionalista os ingredientes básicos para outra grande reviravolta existem – isso me lembra um pouco da Europa de 1930 durante a Grande Depressão”, concluiu Ischenko.

É importante notar que nada disto significa que uma revolta da massa está logo ali na esquina. Apesar dos protestos anti-austeridade pelos cidadãos comuns terem aumentados, até aqui Kiev conseguiu manter a agitação social abafada.

Portanto, se houver um “Maidan 3”, a sua tropa de choque poderá não ser formada pelos jovens ativistas democráticos suportados pelo Ocidente.

Josh Cohen is a former U.S. State Department project officer involved in managing economic reform projects in the former Soviet Union. He currently works for a technology company and contributes to a number of foreign policy-focused media outlets.

Redação

12 Comentários

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  1. Os analfas políticos

    Os analfas políticos teleguiados e os oportunistas, sonham em ver o BRASIL assim: em frangalhos. Os eternos traidores que não conseguem viver não colonizados, se matam para deixar o país dependente, envegonhado, indigno e serviçal. No USA, estariam no corredor da morte, pois aquele país, intolera traidores, tem nojo de traidores e deseja a morte dos traidores do seu país. O USA incentiva os traidores dos outros países a trairem seus países, mas o povo americano os detesta. Sabe que traidores nunca serão cidadãos, mas boizinhos lambedores dos pés, dos sacos dos seus algozes.

    1. Os latinos são tidos nos EUA

      Os latinos são tidos nos EUA como menos inteligentes que todas as demais etnias que compõem a população do país! Se querem ir para lá limpar privadas que vão, melhor, usem a lingua para o serviço ficar melhor acabado…

  2. A Ucrania é assunto Russo,

    A Ucrania é assunto Russo, ponto final

    A Russia esta certimssima em jogar duro nesta historia.

    A ousadia do ocidente ja ficou clara com o episodio PORNOGRAFICO de Kosovo que sempre foi Servio.

    Alias isso é um alerta para nossos interesses estratégicos, mostra como a força militar pode ser usada por naçoes centrais para desmembrar territorio patrio para atender agenda de supostos grupos etnicos estabelecidos.

    A Otan se deixar colocaria uma base dentro de Moscou.

    Os EUA e sua administraçao tola só vão conseguir radicalizar o regime russo e NINGUEM GANHA COM ISSO.

     

    1. Concordo plenamente. A

      Concordo plenamente. A Ucrania fica dentro da esfera Russa. Eles que combinem com os Russos primeiro, antes de tomar outras acoes.

      Por outro lado, Iria um pouco mais alem a ponto de dizer que a ideia de antagonizar Moscou faz parte da estrategia das industrias de armamento Americanas. A intencao eh re-criar a guerra fria contra um inimigo outrora todo poderoso, mas ainda capaz de destruir os EUA. A possibilidade de contronto, mesmo que remota,  justificaria gastos massivos do governo Americano na industria militar para conter uma ameaca que apesar de jamais se materializar, tambem nunca acabaria, haja visto que nao ha como se derrotar a Russia militarmente. 

      Logo, eh bem possivel que continuem antagonizando a Russia. Ha muito dinheiro envolvido e um clima de guerra perene e ad infinitum, contra um inimigo que nao pode ser derrotado eh o sonho da industria militar Americana.

      1. Eles mataram Bil Landen e agora??

        Os EUA “mataram” Bin Landen ( que deve estar vivo e rico em algum lugar…). Agora precisavam de um outro inimigo comum. E os bobocas caem nesta lorota e ficam temendo por Venezuelas, Cubas, Comunismos e agora também Russos…

    2. Sr Leonidas

      Sr Leonidas ,saudações.

      Concordo com seu comentáriuo sobre a Ucrania ,porém no caso de Kosovo ,que fazia parte da Yugoslavia(Eslávia  do Sul ),um país artificial criado pela Tratado de Versalhes ,temos que considerar que mais de 90 por cento de sua população não era eslava ,e sim albaneses ,e em sua maioria muçulmanos   e com idioma diferente do servio-croata.

  3. “Após encolher 7,5 % no ano

    “Após encolher 7,5 % no ano passado, estima-se contrair outros 6% em 2015.”

    Os ucranianos conseguiram o que desejavam. Ha, ha, ha…

  4. Toda guerra tem um forte

    Toda guerra tem um forte propósito geopolítico patrimonialista. É um desrespeita ao alheio e às regras anteriores. É a intolerancia atuando como arma de usurpação. Quem provoca a guerra acha que sairá ganhando. Acontece que as guerras são um jogo caro, tem um elevado custo para a sociedade, significa destruição e perda para todas as partes.

    Todos sabem como começa, mas ninguem sabe como termina.

    Na guerra, a primeira coisa a morrer é a verdade. É um ambiente propício para abusos, e promoções por abuso.

    É engraçado, para não dizer trágico, ver uma pessoa torcendo por um dos lados, como se isso fosse futebol.

    Guerra é a selva. Não há cidadania garantida. 

    Não ponho minha mão no fogo por nenhum dos lados. Os fatos que nos chegam são todos parciais. Nesse jogo não tem santo. 

    Não há guerra que resolva os problemas do mundo. As guerras, hoje em dia, servem mais para criação de poder ao insuflar o patriotismo no combate de um inimigos externos. Acontece que a economia de todos os países são interdependentes. A renda de um pais é a despesa do outro. Estamos todos ligados, se destruirmos outros paises, ficamos mais pobres também. 

    As regras sociais precisam ser respeitadas por todas as nações. A intolerância precisa ser desqualificada.

     

     

     

  5. Não é mera coincidência

    Da matéria acima:

    “Menos de um ano depois, no entanto, Bilous foi demitido em meio a alegações de que seus inspetores foram coniventes com a polícia e os promotores em vários esquemas de corrupção”.

    No Brasil ainda não estamos numa guerra civil e espero que nunca cheguemos a ela. Mas qualquer semelhança com a Lava Jato e o que está descrito no parágrafo entre aspas não é mera coincidência.

    1. Infelizmente a direção parece ser a mesma.

      O que temos, um governo enfraquecido, uma oposição fragmentada com líderes em que a população não confia, e o surgimento de uma mentalidade golpista, que enquanto estiver nas mãos dos grupos tradicionais de oposição não sai o golpe, porém deve “aparecer” com o tempo alguns “líderes” não comprometidos com a política tradicional e com viés francamente fascista.

      Vamos ver mas a tendência é esta.

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