O caso do transplante

Estão circulando emails sobre uma suposta máfia dos transplantes que teria atuado em Poços com o apoio do Serra.

Não embarquem nessa. É uma história mal contada que ganhou visibilidade por ter saído no Fantástico, anos atrás. E visibilidade porque um assessor de Serra acabou endossando as acusações do Fantástico sem ter estudado o caso.

Em meu livro “O jornalismo dos anos 90” abordo esse absurdo.

Aqui, coluna minha de 2001, spbre o tema:

LUÍS NASSIF

Os crimes do sensacionalismo

Foi uma tragédia familiar. O filho sofre um acidente e é internado no hospital Pedro Sanchez, de Poços de Caldas. Lá, constata-se morte cerebral. É transferido para a Santa Casa e os pais autorizam a doação de órgãos para transplantes. É feita.

Terminado o processo, o hospital Pedro Sanchez encaminha a conta para a família. Seis meses depois o pai do menino, ainda traumatizado pela perda, começa uma campanha contra os médicos que receberam os órgãos para transplante e que eram da Santa Casa local, nada tendo a ver com o Pedro Sanchez. Não se deu conta de que a doação foi feita para a Santa Casa e a cobrança, pelo hospital Pedro Sanchez.

Amplie-se essa confusão de pai sofrido em um programa de larga audiência -o “Fantástico”- e não há quem repare o mal feito. Um falso escândalo está colocando em risco todo um grupo de transplantes que transformou a vida de todo doente renal da região.

A ampla e necessária burocratização dos sistemas de doação por vezes acaba atropelada pela urgência do dia-a-dia. Mas o grupo começou a praticar o transplante no início dos anos 90 e sempre se esmerou em trabalhar dentro do maior rigor ético -feito reconhecido pelas sucessivas fiscalizações ocorridas. Mais: dos 174 transplantes feitos até agora, 169 foram pelo SUS. É o único centro transplantador do sul de Minas, o segundo do Estado.

Na cidade, o grupo é conhecido pela dedicação. Não raras vezes médicos da equipe levam doentes, rins, exames de sangue até Campinas, a sua própria custa.

O médico Álvaro Ianhez -acusado nessa história- foi vítima do mesmo sensacionalismo que quase liquidou outro grupo pioneiro e dedicado -os médicos paranaenses especializados em transplante de medula, liderados pelo extraordinário dr. Pasquini. Os transplantes eram feitos pelo SUS. Mas havia a necessidade de localizar doadores em bancos de dados. Uma falsa denúncia de cobrança por fora, a vontade da repórter de buscar o sensacionalismo, entrevistas editadas para reforçar a tese, uma entrevista com uma autoridade falando sob hipótese e -pronto!- reputações jogadas na lama, processos de transplante interrompidos, doentes correndo risco até se esclarecer a situação.

Esse mesmo quadro se repete agora, tendo como autores as mesmas pessoas, o mesmo programa de televisão e os mesmos métodos. Nesse jogo baixo pela audiência pouco importa se inocentes são sacrificados, se doentes são prejudicados e se a verdade é imolada no altar do Ibope.

Está na hora de haver um mínimo de consciência nessa busca obsessiva pela audiência.

Luis Nassif

1 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Retrataçao

    O mínimo que se espera de alguém com dignidade é que se retrate publicamente e peça desculpas ao pai. A decisão da justia é soberana e com base em provas. Você fez um grande desserviço ao jornalismo.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador