Cidades estão despreparadas para o futuro

Antonina: resgate de vítima em deslizamento de encosta

Antonina, no litoral do Paraná, cidade que no dia 11 de março sofreu o pior desastre natural em seus 360 anos de história, possui uma rede pluvial e sistema de esgoto ligados nas mesmas galerias com pelo menos um século de existência. Precisamente no dia 11, o volume de chuva chegou a 270 mm – mais da metade do previsto para o ano inteiro (350mm) –e o Instituto de Tecnologias Ambientais, Cimepar, órgão que faz o monitoramento meteorológico no Estado errou feio:

“…previsão climática para a estação do verão no Paraná indica que:

(1)  o regime das chuvas no Paraná ao longo do trimestre janeiro-fevereiro-março de 2011 estará próximo da normal climatológica. Contudo, as pancadas de chuva ocorrerão de forma bastante irregular, tanto no tempo (eventos de curta duração) quanto na distribuição espacial (eventos em pontos isolados). Com isso no decorrer da estação doe verão de 2011 deverá ser observado condição de estiagem (ausência de chuva por um período grande de dias) em diversos pontos do estado. Não se descarta a ocorrência de chuvas fortes (em alguns casos com potencial para ocasionar alagamentos), acompanhadas de incidência de raios e rajadas de vento fortes”.

Em antonina aconteceu outro fato inédito: No dia 10 de março a defesa civil municipal fez um monitoramento das áreas de risco devido ao imenso volume de chuvas durante o carnaval e lançou um alerta no sistema da Defesa Civil do Estado, com fotos de sinais de desmoronamento nos morros, o que possibilitou a pronta evacuação dos moradores dessas áreas salvando mais de 200 vidas que seriam ceifadas caso o alerta fosse ignorado ou nenhuma atitude tomada. No dia 11, as chuvas eram mais intensas e a Defesa Civil pediu apoio aos geólogos da Mineropar para análise dos solos nos mesmo locais já documentados pelo município, estudo do qual partiu a decisão de evacuação imediata.

No dia 11 a cidade sofreu com uma enchente nunca antes vista e deslizamento de várias encostas,uma das quais densamente povoada e que teve a maioria das casas completamente soterradas.

A infra-estrutura urbana de Antonina, do Rio de Janeiro ou São Paulo, os órgãos de tecnologia que fazem o monitoramento do clima, as entidades de apoio às tragédias naturais, os governos federal, estadual e municipal estão completamente despreparados para a ocorrência de desastres naturais.

Com as mudanças climáticas devido ao aquecimento global neste início de milênio, o despreparo se torna mais evidente. Já pegou desprevenido o Haiti, o Chile, o Japão, a China, o Brasil em diversas regiões e praticamente o mundo todo em diversos tipos de desastres naturais, apesar dos alertas sobre as transformações e suas conseqüências.

Existem diferentes hipóteses e até um grupo imenso de cientistas céticos quanto às conseqüências do efeito estufa. Mas é inegável o fato de que as áreas urbanas, em sua maior parte construída sem o mínimo planejamento, estão muito aquém de oferecer qualquer tipo de segurança contra as reações mais estrondosas da natureza.

Hoje, o poder público municipal sabe que o desenho da cidade terá que ser radicalmente alterado. Mas os custos para as obras necessárias visando dar maior segurança à população são imensos. O governo federal já sinalizou que não tem dinheiro disponível para isso, com apenas 380 milhões para ser usados em emergências em todo o território nacional. E o município, cujo PIB é de pouco mais de 30 milhões, precisa de pelo menos 100 milhões para efetuar as obras.

 

Cidades não estão prontas para as mudanças climáticas

“Nas próximas décadas, as mudanças climáticas irão fazer com que centenas de milhões de pessoas, na sua maioria as mais pobres e marginalizadas, fiquem cada vez mais vulneráveis a enchentes, deslizamentos de terra e outros desastres naturais. Esta é a previsão que fazemos baseados na melhor ciência que temos disponível”, alerta Ban Ki-moon, secretário-geral das Nações Unidas, no prefácio do relatório Cidades e Mudanças Climáticas, produzido pelo UN-Habitat.

Fabiano Ávila – Instituto Carbono Brasil

Se os cálculos das emissões de gases do efeito estufa das cidades englobarem processos como o consumo e geração de energia, os transportes e a produção industrial, as áreas urbanas aparecerão como as grandes vilãs mundiais, ficando responsáveis por 70% das emissões sendo que ocupam apenas 2% do território do planeta.

É justamente como protagonistas das mudanças climáticas que o relatórioCities and Climate Change: Global Report on Human Settlements 2011 (Cidades e Mudanças Climáticas: Relatório Global sobre as Ocupações Humanas 2011) apresenta as cidades. Produzido pelo UN-Habitat, programa da ONU direcionado para promover o desenvolvimento social e ambiental das cidades, o documento afirma que o modelo atual de urbanização está seguindo um rumo de alto risco devido às transformações no clima.

“Nas próximas décadas, as mudanças climáticas irão fazer com que centenas de milhões de pessoas, na sua maioria as mais pobres e marginalizadas, fiquem cada vez mais vulneráveis a enchentes, deslizamentos de terra e outros desastres naturais. Esta é a previsão que fazemos baseados na melhor ciência que temos disponível”, alerta Ban Ki-moon, secretário-geral das Nações Unidas, no prefácio do relatório.

O aumento populacional nas cidades e como consequência a ocupação de áreas de risco são fatores apontados pelo documento que tornarão cada vez maiores os números dos flagelados. Segundo dados da ONU, 59% da população mundial habitará áreas urbanas até 2030, sendo que a cada ano mais 67 milhões de pessoas passam a viver em cidades.

Baseado nessas estatísticas e nos fenômenos climáticos extremos que foram observados nos últimos anos, o estudo do UN-HABITAT traça um panorama sombrio para o futuro das áreas urbanas:

– Mais de 200 milhões de pessoas devem perder suas casas por causa das mudanças climáticas até 2050;

– Mesmo o mínimo aquecimento de 1°C ou 2°C na temperatura pode fazer com que de 6 a 25 milhões de pessoas fiquem sujeitas a inundações apenas no litoral do norte da África;

– Atualmente 40 milhões de pessoas vivem em áreas onde podem ocorrer grandes enchentes, em 2070 essa população será de 150 milhões, elevando os prejuízos para até US$ 38 trilhões;

– Na América Latina, entre 12 a 81 milhões de pessoas podem sofrer com a escassez de água até 2020. Em 2050 esse número deve ser de 79 a 178 milhões.

Corrida contra o tempo
Esse cenário pode ainda ser alterado, pois o lado positivo das cidades serem responsáveis por 70% das emissões é que ações vigorosas bem direcionadas podem surtir um grande efeito.

“O nosso relatório procura disseminar o conhecimento e contribuir para que as cidades consigam mitigar o aquecimento global e se adaptar às mudanças climáticas. Além disso, identificamos medidas já existentes e que podem ser replicadas em mais locais”, explicou Joan Clos, diretor executivo do UN-Habitat.

Entre essas políticas o relatório destaca, por exemplo, a cobrança de pedágio para a circulação de veículos privados nos centros das grandes metrópoles européias. Além de reduzir as emissões e melhorar a mobilidade urbana, os recursos adquiridos podem ser destinados para ações sustentáveis.

Outra medida citada é a reforma de prédios públicos e a obrigatoriedade de adoção de padrões de eficiência energética para novas construções. A cidade de Londres apresenta neste sentido uma politica exemplar pela qual o governo financia a troca de antigos aquecedores residenciais por modelos mais modernos e eficientes. Com isso, as emissões dos domicílios londrinos podem ser reduzidas em 60%.

Com relação à adaptação às mudanças climáticas que já são irreversíveis, o UN-Habitat recomenda algumas normas simples principalmente para a construção de casas populares em países em desenvolvimento. Melhores fundações, aterramento mais elevado e colocação de plataformas sob os móveis são medidas simples que podem evitar com que as pessoas percam tudo o que possuem em cada enchente.

“Muitas cidades não conseguem colocar em prática medidas de adaptação ou mitigação simplesmente por falta de conhecimento ou de acesso aos recursos internacionais que tem esse fim. Nosso relatório pode ajudar neste sentido, divulgando as melhores práticas já existentes e facilitando o intercâmbio de informações. É fundamental que as cidades percebam o quão importante é o papel delas para combater as mudanças climáticas”, concluiu Joan Clos.

 

Redação

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