Mais que caminhar, por Vera Lucia Dias

Mais que caminhar, por Vera Lucia Dias

“E jamais termina meu caminhar. Só o amor ensina onde vou chegar. Por onde for quero ser seu par.”

Paulinho Tapajós, Dorival Caymmi e Eduardo Souto

Terminado o curso de guia em 1998, minha inquietação pairava sobre a necessidade da circulação pelas ruas do Centro à noite. Devido à importância do lugar e por saber que a ocupação era necessária. Uma boa notícia foi chegando tempos depois.

Durante o ano de 2005, enquanto trabalhávamos, Clarice Franco e eu, em espaço criado por nós para falar de São Paulo na Feira de Artes da Praça Benedito Calixto, várias pessoas começaram a nos avisar sobre movimento de caminhadas no Centro à noite.

Fui conhecer e observei que se encontravam na entrada da Biblioteca Mário de Andrade e saiam em alegre passeio. Não havia horários fixos de retorno e percorriam bem à vontade com atividades variadas como alongamentos, canções, poemas.

Sob a liderança de Carlos Beutel, proprietário do restaurante vegetariano Apfel, o movimento apresentava uma qualidade vital, a constância. Gostei bastante e fiz a proposta de alterarem o local do ponto de encontro para as escadarias do Teatro Municipal e a definição do termino se possível até 22 horas. Também conversamos sobre a importância de um profissional do turismo credenciado no acompanhamento.

Conduzi durante um ano e depois devido a outras atividades, indiquei meu professor, Laercio Cardoso de Carvalho que permanece até o momento. Passei por experiências boas de conhecer tanta gente. De difícil foi por duas vezes ser solicitada a apresentar documento para a polícia e seguir acompanhados por batedores. Hoje todos estão acostumados com esse andar coletivo.

Carta de Mário de Andrade a Drummond em 1924: “eu tanto aprecio uma boa caminhada a pé até o alto da Lapa como uma tocata de Bach… Se eu estivesse nessas terras admiráveis em que vocês vivem com que gosto, com que religião, eu caminharia sempre pelo mesmo caminho (não há mesmo caminho pros amantes da Terra) em longas caminhadas”.

Para um profissional o objetivo na condução dos grupos como a Caminhada Noturna no Centro é proporcionar um Passeio que indique novos espaços culturais; divulgar pesquisas pessoais, falar sobre os significados de nomes das ruas, apresentação de textos e poesias ao grupo e pelo grupo, canções que lembram a cidade e a valorização do patrimônio histórico. Pode ser também a observação nas mudanças na geografia da cidade e sobre medidas de conservação ao ambiente urbano. E, na prática a dinâmica de observar horários, trânsito, fechamento de grupo, enfim o conforto possível. Afinal, também aprendemos sempre mais.

O encontro das idades

A Caminhada é aberta a qualquer participante. Ela proporciona encontros inusitados e inesquecíveis. Jovens contando seus desafios, poetas anônimos ou conhecidos e ainda idosos relembrando fatos da cidade. Muitos conversam durante o Passeio com sabor de antigas amizades. O interesse é o mesmo, caminhar e descobrir segredos do Centro, percebendo extratos sociais variados. Seja um lugar como o Centro Filosófico da Comunhão do Pensamento ou a Galeria do Rock, acontece muita troca de energia e disposição para o frio ou as travessias dos semáforos.

Exemplos de Roteiros já realizados:   

PAINEL DE DI CAVALCANTI

ROTEIRO NEGRO

FAMILIA SOUZA QUEIROZ

PORTAS E JANELAS

HISTÓRIA DOS BONDES PAULISTANOS

GALERIA DO ROCK

LARGO DE SÃO FRANCISCO

IGREJA DA BOA MORTE

VILA DOS INGLESES

SINAGOGA E GIGETTO

CIRCULO ITALIANO

CRUZANDO RIOS E RIACHOS

VISITA AO TEATRO MUNICIPAL

RAMOS DE AZEVEDO APAIXONADO

PARQUE DA LUZ

HIGIENÓPOLIS

ACRÓPOLES UM GREGO EM SP

“Na caminhada para-se e conversa-se. Caminhar é o ritmo certo para compreender, sentir-se próximo” Frédéric Gros

Eventualmente, quando solicitada faço a condução da Caminhada.

É um grande privilégio já que chegam profissionais de várias áreas, além de visitantes e moradores. Cada qual contribui com seu universo para a emoção única que as noites de quinta-feira proporcionam.    

Acreditamos que essa experiência, ofertada pelo Carlos e seu Restaurante, possa servir de estimulo a outras regiões da cidade.

Os passeantes relatam que ou para diminuir um pouco o número de horas passadas em frente à Tv ou aguardar um trânsito melhor, esse tempo aproveitado em conjunto já propiciou amizades, contatos e um olhar curioso de observadores.            

Esperamos que os passos trilhados por esse “caminhar” tenham continuidade e proporcionem sempre mais e mais emoções.

Atualmente sigo na tarefa de conduzir moradores e visitantes pelo Centro Histórico atendendo a solicitações e participando de Rodas de Conversas sobre a cidade de São Paulo. Os encontros versam sobre Mário de Andrade e sua importância, a língua Tupi na cidade ou a presença negra. Também em parcerias com outros profissionais como a guia Celia Pescuma, surgem atividades sobre temas como “Saberes & Sabores”, sobre a presença de “Castro Alves” em São Paulo, passeios “Do Largo ao Viaduto” ou “Essas Mulheres” – Veridiana, Maria Antônia, Angélica e Domitila.

Estudando, andando e revendo a cidade gigante.

Vamos caminhar.

www.caminhadanoturna.com.br

www.passeiopaulistano.com

 

Redação

2 Comentários

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  1. Bacana demais!

    Bacana como a Vera Lúcia propõe um pouco mais de vida “ao Vivo”.

    Gostei da iniciativa e do conceito por trás. Boas amizades, conversas e convivência social surgem de atitudes como essa.

    Apenas devemos corrigir sobre a autoria da música “Andança”, citada acima, que ao invés de Dorival Caymmi parece tratar-se do seu filho Danilo.

    Parabéns pela bela iniciativa.

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