A renegociação das dívidas dos estados como nova etapa do golpe, por Roberto Bitencourt

Foto: Roberto Bitencourt da Silva

A renegociação das dívidas dos estados como nova etapa do golpe

por Roberto Bitencourt

Os termos das negociações que se têm estabelecido entre os governadores estaduais e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, são expressão de nova e superior etapa do golpe capitaneado por Michel Temer (PMDB).

Especificamente em relação ao estado do Rio de Janeiro, nessa semana foram costurados parâmetros e medidas para a renegociação da dívida com a União, assim como pretensamente atenuar a intensa crise fiscal e administrativa.

Diga-se, crise em elevada medida criada pelos anos de governo Sergio Cabra Filho – hoje preso – e Pezão, ambos integrantes de uma camarilha (o PMDB) de testas de ferro de empreiteiras e multinacionais, que sangraram os orçamentos do estado, para satisfazer os grupos representados pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan).

Na prática, hoje o estado do Rio encontra-se sob intervenção federal. Tornou-se laboratório de um grotesco e nefasto ajuste fiscal para os demais estados. Trata-se de reflexo de uma das dimensões e da agudização do golpe, da ruptura com a Constituição de 1988.

Habitualmente, no Brasil, quando um novo modelo econômico, regime de acumulação capitalista e forma de (re)inserção na divisão internacional do trabalho se instaura, a tendência tem sido há décadas uma maior concentração de poderes da União.

Isso seja em que regime político formal for e a despeito da visão de país. O estatismo industrializante, autoritário e com leis trabalhistas de Getúlio Vargas, nos anos 1930-40; o alinhamento americanófilo, antipopular e o incremento da dependência externa com Castello Branco e demais militares conservadores e tecnocratas em 1964; assim como o neoliberalismo financista, privatista e lesa pátria de Fernando Henrique Cardoso, em 1995. Eis alguns exemplos caros.

Em que pesem as suas nítidas diferenças a respeito dos respectivos projetos de país, precisamente por serem conduzidos por perspectivas de mudanças nacionais drásticas, adotaram acentuado controle e alinhamento dos estados às diretrizes do governo federal.

No atual caso aberto pelo espúrio Michel Temer, o incremento do neocolonialismo, da semiescravidão dos trabalhadores e da redução de serviços públicos é o que se busca instalar. Uma nova etapa do golpe, que pode também ser considerada um estágio avançado da era FHC. Não gratuitamente, tucanos participaram abertamente do golpe e apoiam o ilegítimo governo Temer.

Banqueiros e rentistas ficam aí saltitantes de alegria. Os orçamentos públicos nas suas mãos. O projeto por trás do golpismo: mergulho na dependência e na subalternidade externas, representadas pela ênfase dada à exportação de bens primários, redundando na desindustrialização e na desnacionalização do aparato produtivo. Os bancos, o agronegócio e as multinacionais no controle dos estados e da Nação.

Educação, ciência, tecnologia e inovação no olho do furacão do extermínio, por desnecessidade no modelo que se visa instaurar. A seguir esse curso, ciência e tecnologia ficarão à míngua de vez e a educação tenderá a ser convertida, até a medula, em pobre assistencialismo social para crianças e jovens. A escola, efetivamente, depósito de infantes.

No Rio de Janeiro, a crise, o ajuste e o desrespeito do governador Pezão atingem com maior intensidade aos órgãos vinculados à Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação: Uerj, Faperj, Faetec, Uezo, Uenf, Cecierj. Sem condições estruturais mínimas de funcionamento, sem dotação de recursos e com salários de novembro ainda sem pagamento, as instituições associadas à SECTI-RJ estão na UTI. Para dizer o mínimo.

Assim, elaboração própria de conhecimento é a primeira iniciativa pública descartada pelo golpismo em marcha, em âmbito federal e que atinge em cheio ao Rio de Janeiro. O neocolonialismo turbinado dispensa o saber sistematizado.

Aumento da contribuição previdenciária dos servidores, diminuição significativa da provisão de serviços públicos, privatização da Cedae – transformando um bem público como a água em mercadoria –, são algumas medidas no horizonte do estado do Rio e que tendem a ser incrementadas. Caso o pacote de maldades de Meirelles e Pezão seja aprovado.

Importante recordar, contudo, que a mobilização e a organização dos servidores, nos últimos meses, tiveram capacidade de frear algumas destas medidas, encaminhadas pelo governador à Alerj, assim como retirar completamente qualquer legitimidade do governo Pezão.

O que ocorre no Rio é espelho das medidas draconianas adotadas em escala nacional, do realinhamento da economia nacional ao sistema capitalista internacional, do aprofundamento da dependência externa.

Seguramente, além da continuidade do movimento do funcionalismo fluminense, o enfrentamento ao projeto de desmonte dos estados e da Pátria demandará envolvimento e participação de demais segmentos da sociedade e de servidores de outros estados.

Roberto Bitencourt da Silva – historiador e cientista político.

 

Redação

1 Comentário

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  1. O Rio é só o começo. Reduzir
    O Rio é só o começo. Reduzir os salários dos servidores do Estado do Rio abrirá o precedente para que a mesma manobra possa ser aplicada imediatamente nas três esferas da administração publica e depois no setor privado. E só criar uma “grave crise” financeira como argumento de suporte para a medida “excepcional”. Ora, hoje o governo federal tem no orçamento um déficit de 170 bilhões, o que é um rombo gigantesco. Pronto está dada a desculpa perfeita.

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