A responsabilidade pela crise da água, por Nabil Bonduki

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Da Folha

Nabil Bonduki: A responsabilidade pela crise da água

Para não tomar medidas impopulares em período eleitoral, o governo Geraldo Alckmin tem deixado de adotar providências indispensáveis para enfrentar o estresse hídrico que afeta o Estado de São Paulo. De forma irresponsável, está criando o que pode vir a ser uma calamidade pública nas regiões de São Paulo e Campinas, onde vivem cerca de 25 milhões de cidadãos e onde se gera 23% do PIB nacional.

O nível do sistema Cantareira, que atendia 8,8 milhões de habitantes só na região metropolitana de São Paulo, caiu a 4,5%. Em um mês poderá estar zerado. O sistema Alto Tietê, que atendia 3,5 milhões de moradores, está abaixo de 11% da sua capacidade. Mesmo que as chuvas de verão venham dentro da média histórica, a recuperação das represas será tímida.

Estima-se que, se os índices pluviométricos ficarem na média histórica, em 2015 a situação estará pior do que em 2014. Se chover menos que a média, faltará água e o racionamento, que vem sendo adiado por motivos eleitorais, embora metade dos paulistanos sofram com cortes não comunicados, terá que ser rigoroso. Não existe, ou não foi anunciado, um plano de contingência para essa possibilidade.

A crise não é apenas resultado de uma seca sem precedentes. Estava anunciada desde 2010, mas a Sabesp, raciocinando como empresa privada, vendeu mais água do que poderia. Relatório da própria empresa, de 2011, afirma que ela estava retirando do sistema mais água do que repunha.

Depois de passar anos sem promover campanhas educativas de peso para difundir o uso sustentável da água, as decisões da gestão Alckmin foram pautadas pela lógica do lucro e pelas eleições. Embora tente passar uma imagem de tranquilidade, a questão é mais profunda.

Assim, em depoimento na CPI na Câmara Municipal que investiga a crise hídrica, a presidente da Sabesp, Dilma Pena, afirmou, com a arrogância dos “sábios”, que a seca do verão de 2014 só ocorrerá daqui a 3.338 anos, desconsiderando os efeitos devastadores das mudanças climáticas.

A Sabesp, semiprivatizada, está mais preocupada em vender água e distribuir dividendos do que promover o uso racional de um bem escasso. Nos últimos cinco anos, seu lucro líquido foi R$ 8,2 bilhões, dos quais R$ 2,5 bilhões foram distribuídos aos seus acionistas.

Ademais, a Sabesp fracassou em medidas estruturais, como na redução das perdas causadas por ineficiências. Entre 2009 e 2014, a empresa investiu R$ 1,1 bilhão no Programa de Redução de Perdas, mas o resultado foi insignificante: segundo dados apresentados por Pena, entre 2009 e 2013, o índice de perdas de micromedição caiu de 31,4% para 30,4%; o índice de perdas físicas, de 20,4% para 19,8%.

Reportagens publicadas no “Jornal da Tarde” e na “Carta Capital” mostraram que as empresas contratadas para a execução desse programa são de propriedade de ex-diretores da própria Sabesp, suspeitando-se de fortes ligações com o PSDB.

Já que a Assembleia Legislativa não investiga e que inexiste controle social na Sabesp, a CPI em curso na Câmara Municipal é uma oportunidade para desvendar a caixa- -preta que está por trás da crise hídrica que afeta os paulistas.

NABIL BONDUKI, 58, arquiteto e urbanista, professor titular de planejamento urbano na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, é vereador (PT) e membro da CPI da Sabesp

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

6 Comentários

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  1. A culpa da crise eu não se de

    A culpa da crise eu não se de quem é, a midia diz que é de são pedro e eu acredito, mas gostaria de agradecer ao nosso competentem governador geraldo que ao mesmo tempo tempo em que aparece na televisão dizendo que não vai faltar agua as torneiras de minha casa estão secas, muito obrigado governador!!

  2. 106 bilhões…

    … este número chamou a minha atenção ontem… pelo que li serão  os litros restantes de água no sistema Cantareira no mês que vem… se fosse eu paulistano providenciaria penico e areia… em algum momento do mês de janeiro/15, caso continue a não chover, ou do mês de março/15, se as chuvas vierem na média para o verão, os reservatórios estarão totalmente secos e ninguém mais terá água para descarga sanitária… 

    106 bilhões de litros = 106.000.000 m³

    Retirando 20 m³/s ou 1.728.000 m³/dia a raspa das represas durará 61 dias.

    Agora imaginem uma grande bacia hidrográfica com 106.000 km², muito maior que a existente onde a Sabesp capta água para a grande São Paulo… e pensem que nos próximos cinco meses choverá um total de 1.000 mm, isto é, superior a média histórica… quanto água cairá… os mesmos 106 bilhões de litros.

    São Paulo corre o risco de ser abandonada enquanto obras emergencias, que deveriam estar em construção, não ficarem prontas. Poços artesianos extraíndo os aquíferos, dutos e estações de bombeamento deveriam estar em execução.

  3. CartaCapital realizou mais um

    CartaCapital realizou mais um Diálogos Capitais nas Livrarias, dessa vez em um debate com os estudiosos Julio Cerqueira César (USP) e Antonio Zuffo (UNICAMP) spbre a crise hídrica que vive o Estado de São Paulo.

    Assistam a entrevista com dois especialistas concedida na TV Carta.

    http://youtu.be/Wqe6LQ5fMgo

  4. Gestão Neoliberal!

    A crise de abastecimento em São Paulo evidencia o fracasso da política neoliberal dos tucanos que mercadorizaram um bem público. Uma vez que o acesso à água é um direito universal e não um serviço privado, cabe ao Estado garantir o fornecimento de água potável à população. Contudo, ao invés de investir os recursos públicos na manutenção e distribuição de água, os tucanos em parceria com a Sabesp preferiram manejar os seus lucros para o setor financeiro. Por isso, mais que um produto comercial, a água em São Paulo é vítima da especulação dos rentistas. 

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