A tortura com os servidores do Rio de Janeiro e o comportamento dos partidos políticos, por Roberto Bitencourt da Silva

Foto Wilton Jr/Estadao

A tortura com os servidores do Rio de Janeiro e o comportamento dos partidos políticos

por Roberto Bitencourt da Silva

Desde os últimos dias de novembro de 2015 as vidas dos servidores públicos do estado do Rio de Janeiro foram profundamente afetadas pelos desmandos do governo de Luiz Fernando Pezão (PMDB).

Sobretudo, aposentados, pensionistas e funcionários ativos das secretarias estaduais de ciência e tecnologia e de cultura.

Adotando a prática de dividir para conquistar, o governador tem relegado esses setores ao limbo e ao desespero, no momento, com dois salários atrasados (abril e maio), além do 13º do ano passado. Demais segmentos ou recebem com menor atraso ou estão a receber em dia.

Uma flagrante violação de direitos que conta com a conivência do STF. Ano passado, a corte de Brasília decidiu proibir os arrestos das contas do governo para o pagamento do funcionalismo.

Essa semana, revelando um fiapo corporativo de “sensibilidade”, vedou o bloqueio de contas pelo governo federal, mas não os arrestos judiciais para o pagamento de funcionários dos Poderes Judiciário e Legislativo locais. O resto que “reclame com o bispo”.

As causas da gravíssima crise econômica e administrativa que assola o estado do Rio de Janeiro são por demais conhecidas, bastando mencionar que o ex-governador e padrinho político de Pezão, Sergio Cabral Filho (PMDB), encontra-se preso há meses, em função de comprovadas práticas de corrupção. Não raro, produtos associados à concessão de generosas e irresponsáveis isenções fiscais ao grande capital nacional e estrangeiro.

Instituições de ensino tão importantes para o estado e o País, com amplo reconhecimento acadêmico, como a Uerj, em franco processo de desmonte e inviabilização. A Faetec, uma das principais instituições educacionais que formam os trabalhadores dos quadros técnico-operacionais em atuação na Petrobras, totalmente sucateada. Hospitais, muitos fechados e tantos outros sem condições de atendimento. A segurança, sem recursos mínimos.

Uma miríade de servidores, em diversos setores do funcionalismo estadual, submetida a vexações constantes, por perda da dignidade profissional, por encontrar-se sob um verdadeiro acúmulo de dívidas. Doenças proliferam e mesmo dramáticos casos de suicídio têm ocorrido.

Casos de depressão e problemas cardíacos são comuns. A desmoralização e a perda de horizonte, sentido e dignidade profissional têm provocado situações sobremodo lamentáveis entre o funcionalismo. Uma verdadeira tortura. 

O governador Pezão faz o que bem entende, sem controle, nem fiscalização. O Judiciário e o Legislativo local, praticamente, nada fazem. O golpista presidente Michel Temer (PMDB) tem dado todo suporte para o exercício do arbítrio estadual.

Enviou tropas da Força Nacional para lançar bombas nos servidores em protestos. Inúmeras vezes. Meses a fio. Até tropas do Exército foram convocadas para viabilizar a aprovação de projeto que privatizava a empresa estadual de tratamento de água e esgoto.

O estrangulamento financeiro é recorrente, com a adoção da prática contínua de arrestos das contas estaduais. Um terrorismo puro e cristalino para dar sustentação ao governador – com mandato já cassado pelo TRE-RJ – e promover a agenda privatista e neoliberal dos governos de ambas as esferas da Federação. Um “exemplo” brutal que se quer dar a todos os trabalhadores e servidores do Brasil.

Mal comparando, o governo federal tem se comportado em relação aos servidores do Rio de Janeiro como o governo dos Estados Unidos agiram, especialmente, no passado,  em face de Cuba e Vietnã. Agressões armadas e restrições econômicas. Terrorismo e estrangulamento financeiro.

O desrespeito campeia. É a fome que pretende impor aos servidores e ao estado, que, diga-se, tem em seu mercado consumidor acentuada dependência do funcionalismo público.

Quanto à mídia comercial e massiva, na melhor das hipóteses, opera com pautas e enquadramentos de natureza fatalista, que em nada contribuem para oferecer visibilidade aos sérios problemas que afetam servidores e serviços públicos.

Isso posto, cumpre salientar que prevalece uma tímida repercussão em torno da tortura sofrida pelos servidores do estado do Rio. Seguramente, os partidos políticos possuem grande responsabilidade nesse cenário tortuoso.

A maioria esmagadora dos partidos se silencia. A violação contínua, ilegal, cruel, de direitos trabalhistas dos servidores, assim como, por extensão, dos direitos coletivos da população, tem se intensificado, contando ainda com a costumeira violência policial arbitrária nos atos em frente à Alerj.

O silêncio impera na maioria dos partidos. O assunto não é foco de atenção, não está incluído nas suas agendas.

Muitos, de natureza liberal-conservadora, por conivência e apoio absoluto às medidas do governo. Covardemente, adotariam a mesma posição do PMDB de Cabral/Pezão.

Outros, de perfil similar e até mesmo integrantes daquilo que se convencionou chamar de centro-esquerda no País, emudecem para não criar suscetibilidades com o PMDB, projetando eventuais alianças em eleições. Demais, igualmente de centro-esquerda e de esquerda, potencialmente imaginam que o caos lhes favorecerá como “salvadores” em alguma eleição.

Alguns raros, mais à esquerda do espectro partidário – que denunciam as medidas arbitrárias e cruéis do governo estadual –, infelizmente, não reverberam na medida da urgência do caso.

Ou apostam no quanto pior melhor nas potenciais e próximas eleições, ou simplesmente possuem em seus quadros pouquíssimos trabalhadores ou pessoas que em algum momento da vida estiveram mergulhadas nas vicissitudes das gentes adultas e trabalhadoras que dependem de emprego e salário para viver.

Cada um em sua respectiva posição, com sua peculiar visão e seu comportamento, em graus diferentes, por omissão, cumplicidade ou desleixo, é também responsável pela covardia e a tortura sofrida pelos servidores do estado do Rio de Janeiro, há quase dois anos. Vítimas de um governo reacionário, desumano, que está acabando com o estado.

Roberto Bitencourt da Silva – historiador e cientista político. 

Publicado no Diário Liberdade.

Redação

11 Comentários

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  1. Dou dois exemplos do

    Dou dois exemplos do sofrimento do funcionalismo: o de um sobrinho, e o meu.

    Meu sobrinho, hoje com 50 anos, com 06 filhos, e ainda alguns adolescentes, entrou num estado de depressão, e cotraiu Espondilite anquilosante, que é uma enfermidade reumatológica, autoimune, incurável, com crises de dores lancinantes e generalisadas. Sei do que se trata porque também sou portadora dessa enfermidade. 

    Esse sobrinho, é formado em Química pela UERJ, e por ter cursos graduados de Inglês, mantém duas matrículas no Estado. De repente, sem 13º, e recebendo alguns trocados como se esmola fora, passou a depender da ajuda dos pais, e de todos que dele se apiedasse pra não passar fome. Vale dizer que essa enfermidade, como muitas, aflora também em face das circunstâncias – caso dele. 

    O meu caso não é diferente, porque sou aposentada há quase 20 anos, e jamais me imaginei numa situação tão difícil como a que foi iposta por esses ladrões do RJ. Sou portadora de Espondilite e de Crohn – ambas auoimunes e incuráveis. Apesar de aposentada, sempre vi o desconto no meu contracheque como se ainda estivesse na ativa. Por isso não me conformo quando escuto falarem em Previdência quebrada. 

    Sou forçada a dizer que ao tempo de Cabral nosso salário sempre saiu dentro do prazo legal.

    É Cabral preso, Pezão e Dornelles investigados, bem como Picciani, que por muita sorte ainda não foi ver o sol quadrado, 05 conselheiros do Tribunal em desgraça pelas manobras espúreas, e, numa sucessão, um quadro horrível de se ver numa das cidades mais lindas e ricas do País.

    Todos os dias eu leio O Dia, que não muda o tema. Tem sempre uma notícia de que Pezão foi, ou vai a Brasília, para conversar com MT sobre a situação do funcionalismo, enquanto Temer quer sempre mais algum, alegando que o governo do RJ tem mais essa ou aquela dívida a pagar, etc. 

    Michel Temer é tão cínico que nunca demonstrou sua indignação pelos acontecimentos do Rio de Janeiro, porque lá estão os larões do seu partido. Infeliz também é toda a imprensa, na sua omissão.

    Sem dúvida, a situação do funcionalismo não fica apenas no funcionalismo, mas toda a Economia do Estado do RJ sofre as consequências dessa miséria política-administrativa, com a conivência de parlamentares, ou, no mínimo, a omissão de muitos.

    Agradeço a Roberto B. da silva por postar uma matéria tão importante como essa. 

  2. Bem, para um artigo que coloca simplesmente:

    “A maioria esmagadora dos partidos se silencia…..”

    “O silêncio impera na maioria dos partidos. O assunto não é foco de atenção, não está incluído nas suas agendas….”

    E não dá nome aos bois é de esperar o que?

    1. Ah, sei, se o artigo é ruim o tema deixa de interessar?

      Uma coisa nao justifica outra… Se o governo federal atrasasse 3 meses de salários — e ainda por cima seletivamente, “privilegiando” no atraso os servidores das universidades e fundaçoes de pesquisa — vc estaria calado em relaçao ao tema?

  3. A omissão do STF numa questão
    A omissão do STF numa questão tão séria e provocadora de misérias diversas para milhares de famílias é inacreditável…….

    1. O STF não é omisso.  O STF é

       

      O STF não é omisso.  O STF é contra o servidor – acabou de proibir arrestos para pagar SERVIDORES e fornecedores.

      Porém pode-se arrestar para pagar o judiciário, o MP e o legislativo.

      E o tesouro nacional ainda pode BLOQUEAR (isso é feito diretamente no banco central, sem passar pelas cortes) para retirar dinheiro das contas do estado do RJ para pagar empréstimos dos quais o governo federal é avalista.

      E as causas da crise do RJ não podem ser resumidas a corrupção.  Há e houve muita incompetência na gestão do estado do RJ, mas não se pode ignorar a paralisação total de toda cadeia de óleo e gás do país decorrente da lava-jato e da crise política.  Além da mudança de orientação da petrobrás com relação a indústria naval depois do impeachment.

      No Theatro Municipal do RJ, onde trabalho, sentimos o reflexo direto não apenas nas condições impossíveis de trabalho mas também no talent-drain.

      Só esse ano perdemos as primeiras bailarinas Márcia Jaqueline e Karen Mesquista e o primeiro bailarino Moacir Emanoel.  Sem falar do coro e da orquestra.  Mesmo pessoas que tem como objetivo de vida permanecer no Brasil estão se sentindo forçadas a procurarem a vida fora.  Minha impressão é que há mais cantores líricos cariocas na alemanha do que no RJ.

      E talvez esse seja o efeito mais perverso dessa crise.  O Rio de Janeiro se tornou um grande exportador de seus talentos e de seu futuro, e não porque o carioca passou a odia-lo, mas porque sente que não há futuro aqui.

      Perdemos também, e de forma permanente, o barítono Leonardo Pascoa, que sofreu um enfarto fulminante aos 42 anos.  É casado com outra cantora do Coro.  Seu pai foi cantor do Coro, aposentado.  Seu irmão é cantor do coro.  É uma família inteira de pessoas que não recebem seus salários.  E como amigo dele, posso dizer que as preocupações constantes com a manutenção da sobrevivência o estavam levando a níveis de estress cada vez maiores, isso com certeza foi um fator complicador.

      https://t.co/BXAxvRaFuz

       

       

      E talvez esse seja o efeito mais perverso dessa crise.  O Rio de Janeiro se tornou um grande exportador de seus talentos e de seu futuro, e não porque o carioca passou a odia-lo, mas porque sente que não há futuro aqui.

  4. Nunca vi em toda a minha

    Nunca vi em toda a minha vida, uma calamidade como esta em meu estado! O que que se está esperando? Que ninguém tenha mais nada a perder?

  5. Diz se que a natureza não

    Diz se que a natureza não reage, se vinga.

    O mesmo com a finanças públicas.

    O funcionalismo sempre foi a vanguarda do atraso, sempre votou olhando o próprio umbigo, ou seja, candidatos que se mostrem favoráveis ao status de privilegiados do funcionalismo público.

    Agora que a caixa d’agua secou, só dá pra tirar dela a água que entra, nada mais.

    Vale agora aquele ditado de quem pode mais chora menos. Funcionalismo público da ativa, vs aposentados.

    Poderiam dar a opção de trocar as suas aposentadorias estaduais pelo regime único da previdência e se submeterem ao teto, mas recebendo em dia.

    Que tal?

     

     

  6. Calamidade pública
    Sou uma desventurada pensionista de previdencia do Estado. Viuva desde 2008.
    Estou sobrevivendo. Não foi para isso que o meu falecido marido pagou esta previdência malfadada, mesmo depois de legalmente aposentado por tempo de serviço.
    Para q um Cabral da vida, não filho humano. Para q Sr Pezao partilhadas com o primeiro TUDO q foi pago por tantos.
    Quanto tempo mais terei q viver da caridade alheia, por desvio insano do poder público.
    Estou com câncer. Que mais preciso? Só q essa doença não dá só em mim.
    Tbm pegará os larápios!

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