Darcy Ribeiro e a barbárie que a civilização brasileira produziu, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Darcy Ribeiro e a barbárie que a civilização brasileira produziu

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Darcy Ribeiro dizia que “Se os governantes não construírem escolas, em 20 anos faltará dinheiro para construir presídios”. Duas décadas depois da morte dele, o diagnóstico que ele fez continua a reverberar nos discursos em defesa da escola pública e que denunciam o processo de encarceramento em massa que está ocorrendo.

O mérito de Darcy Ribeiro é evidente. Ele foi capaz de ver a realidade que estava sendo construída e que resultaria na tragédia em que vivemos. Todavia, enfatizar apenas esta frase dele é uma maneira perversa de esconder outra face da realidade.

Não basta construir escolas. É preciso que a educação seja social e economicamente valorizada e que ela seja continuada e profissionalizante. Também é necessário valorizar o professor, como agente de transformação social e um elemento essencial na construção do desenvolvimento econômico do país. Mas nada disso resultará em benefício para os consumidores da educação se eles não conseguirem empregos ou forem discriminados porque só tem educação fundamental.

De fato, em países mais ricos que o Brasil (e que investem muito mais em educação) a exclusão social já é uma realidade construída pelo próprio sistema educacional. Como afirma Ulrich Beck:

“…o diploma não é nem mesmo capaz de fazer as portas das ‘salas de espera’ se abrirem, convertendo-se ele próprio em critério de exclusão. Isso afeta cada vez mais os que tem apenas um diploma do ensino fundamental.” (Sociedade de risco, Ulrich Beck, editora 34, São Paulo, 2010, p. 225)

¨Por meio dessa função marginalizante, a escola fundamental se transforma, assim como anteriormente as escolas especiais, em depósitos de jovens desempregados. Como um ‘asilo juvenil’ educativo, ela se situa em algum ponto entre a rua e a prisão. Seu valor funcional se move na direção da terapia educacional. Consequentemente, a situação pedagógica se deteriora. Professores e currículos têm sua legitimidade ameaçada. Passam a ser projetadas sobre eles as contradições de uma ‘educação profissionalizante para nada’. Na medida em que a escola já não tem o que ‘oferecer’ ou recusar aos alunos, cessa sua autoridade. Reações anômicas da juventude já se fazem perceber (efetivas ou latentes) em tais guetos educacionais da falta de perspectivas profissionais. O sinal mais visível e radical dito seria a crescente violência contra os professores, sobretudo nas grandes cidades com um nível mais alto e constante de desemprego juvenil.” (Sociedade de risco, Ulrich Beck, editora 34, São Paulo, 2010, p. 226)

Num contexto em que as escolas públicas são percebidas pelos jovens como se fossem presídios incapazes de libertá-los de suas histórias pessoais de pobreza e exclusão a mim parece perfeitamente natural que os professores passem a sofrer os mesmos problemas psicológicos que os agentes penitenciários.

Portanto, não basta apenas construir escolas. É preciso fazer muito mais do que isso. Nos países ricos e pobres a obsolescência mais ou menos programada de contingentes populacionais cada vez maiores é um fato cruel imposto pelo neoliberalismo. Nesse contexto, em 20 anos não adiantará mais construir nem escolas/presídios nem presídios, pois estaremos vivendo em Estados fracassados ou à beira do fracasso.

No caso específico do Brasil, as desigualdades raciais, sociais e econômicas tendem a aumentar e a se tornar permanentes em razão do congelamento de investimentos em saúde e educação, da extinção dos programas sociais, do perdão fiscal concedido aos banqueiros, industriais e ruralistas. A reforma trabalhista, que condenará milhões de pessoas a empregos temporários, intermitentes e mal remunerados tornará ainda mais sem sentido a educação básica. Ao invés de estudar para sair dos guetos urbanos e grotões rurais, os jovens brasileiros estão sendo condenados a permanecer neles justamente porque irão a escolas públicas cada vez menos equipadas e valorizadas.

A civilização não se reproduz de maneira automática. A barbárie renasce com vigor algumas décadas depois que uma geração foi desprezada e abandonada à própria sorte. Como toda construção humana, a civilização sofre as consequencias inevitáveis do descuido governamental e da perversidade estatal. Quando isto ocorre o processo de reconstrução é doloroso, pois civilizados e bárbaros sofrerão as consequencias da barbárie que foi criada pela própria civilização.

Quando a educação não é mais vista como um instrumento capaz de garantir modificação no destino pessoal/social/econômico do adolescente, a religião e a criminalidade tende a se transformar em soluções permanentes. A união entre a fé e o crime organizado, como já está ocorrendo nas favelas do Rio de Janeiro, produz fenômenos políticos tão devastadores quanto o Estado Islâmico e o nazicristianismo à moda ucraniana. A elite do atraso do atraso pode ter conseguido se livrar facilmente do PT e da democracia, mas não conseguirá dominar a besta-fera que irá crescer nas entranhas das cidades brasileiras e espalhar terror, medo e morte pelos bairros nobres. 

Fábio de Oliveira Ribeiro

6 Comentários

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  1. Darcy…..

    O Brasil é inacreditável e surreal !!! Esta citação de Darcy Ribeiro só não é pior que a de José Eduardo Cardoso, acusando as penintenciarias brasileiras de masmorras medievais. Priimeiro porque ele só descobriu isto porque seus comparsas de crime estavam indo para a cadeia.  Segundo, porque então era o Ministro da Justiça, de um governo ininterrupto há quase 15 anos. Numa fase entre governos dito socializantes e progressistas há mais de 1/4 de século. Se as cadeias eram masmorras medievais, a culpa era de quem caro Ministro/Gênio? De Pero Vaz de Caminha? O mesmo ocorre com o parasita Darcy Ribeiro. Uma vida inteira, meio século de Cargos e Indicações Públicas. A Elite que não se enxerga elite. A Esquerda que não é esquerda. Quando no controle do poder público e político, sem nada realizar ou modificar, a esquerda são sempre os outros. Quantos 20 anos se passaram, enquanto mamavam nos contra-cheques poupudos de algum cargo público? Uma espécie de Cristovam Buarque, só que já falecido. Os garotos de 20 anos lotando presídios, morrendo e matando outros garotos de 20 anos, mal remunerdaos nas policias ou remoendo sua pobreza nas periferais, nasceram sob quais governos? Nos responda FHC? E Lula ou Dilma? Enquanto damos desculpas à mediocres e incompetentes, os assassinatos caminham a passos largos para ultrapassar os 100.00 por ano. Mas os contra-cheques ‘destes’ que se sacrificam por mudar tal realidade, que espetáculo !!!    

    1. #

      Conclusão do seu discurso: Jesus Cristo para presidente. Ou seria o Geraldo Santo?

      Amigo, você tem todo o direito de ter e expressar a sua opinião, mas chamar Darcy Ribeiro de parasita, passou da conta.

      Se liga cara! Nesse seu contexto, quem não é parasita?

    2. Darcy Ribeiro escreveu vários

      Darcy Ribeiro escreveu vários livros que são citados por antropólogos mundo a fora. Ele também criou a UNB, uma das universidades públicas mais importantes da América Latina. O que você fez além de ficar ofendendo ele na internet?

      1. darcy….

        Não são estes ‘santos e abnegados’ que tem a solução. Eu sei quem tem a solução para este país: VOCÊ. Ou sua esposa ou seu filho, ou seu paí ou seu irmão ou seu vizinho ou seu patrão ou seu funcionário. Quanto mais a sua a minha opinião, vontade tiver poder direto, imediato, objetivo, mais rápida e eficiente serão as ações do Estado. A Democracia está contida na máxiam Do Povo, pelo Povo, para o Povo. O resto é messianismo que inventam estas personalidades que não mudam nada, fora suas próprias vidas.  

        1. Blá, blá, blá… faça algo de

          Blá, blá, blá… faça algo de mais proveitoso do que ficar trollando na internet, meu caro. Quando você conseguir medir forças com Darcy Ribeiro, tendo escrito livros citados mundo a fora e criado uma universidade pública como a UNB, começarei a prestar mais atenção aos seus comentários. No mais, seu blá, blá, blá não passa disso: blá, blá, blá. 

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