Para que serve previsão econômica se são banqueiros que dão as cartas

Para que serve previsão econômica se são banqueiros que dão as cartas

J. Carlos de Assis

Em 12 de abril de 2015, portanto há mais de seis meses, iniciei dessa forma um artigo que circulou nesse blog sob o título “Ainda há tempo de interromper o grande desastre”:

A economia brasileira teve uma contração de 0,2% em 2009, em pleno mundo conturbado com quedas ainda maiores devidas ao início da grande crise financeira planetária. Até que nos saímos bem no início. Fizemos nossa lição keynesiana, tanto do lado do consumo (aumento da bolsa família, aumento do salário mínimo)  quanto principalmente do lado do investimento (forte injeção de recursos do Tesouro no BNDES, que por sua vez, em 2009 e 2010, financiou em torno de 180 bilhões de reais adicionais nos dois anos).

A situação agora é simplesmente desesperadora. Tivemos estagnação no ano passado e o Governo já fala em queda do PIB de 0,2%.  Isso ainda reflete um extremo otimismo. Se for mantido o ajuste-Levy/Barbosa, teremos uma contração de uns 2%, no mínimo, por culpa exclusivamente desse senhor que partilha os ideais dos assassinos de Chicago que sujaram a mão de sangue no Chile de Pinochet no experimento de uma economia desumana do tipo da que nos querem impor. Sobre a estagnação do ano passado e o ajuste Levy/Barbosa, vem um terremoto muito maior: o estrago econômico da Lavajato na cadeia produtiva do petróleo, que representa mais de 13% da economia brasileira  e que, por isso mesmo, nos pode arrastar numa crise sistêmica, levando também bancos. Se nada for mudado, teremos uma contração global da ordem de 4% a 5%.”

No início de setembro, justificando que estava, com meus artigos, simplesmente repetindo os mesmos argumentos sem qualquer efeito prático, escrevi, sob o título “Meu último artigo sobre política econômica até o grande desastre”:

Estou comunicando ao editor, através deste artigo, que não mais escreverei sobre política econômica neste blog até o cumprimento definitivo do grande desastre. O grande desastre a que me refiro é o resultado da política econômica de Joaquim Levy, a sanha persecutória de empresas dos promotores da Lavajato e o carry over sobre 2015 da estagnação econômica do ano passado. Ao todo, uma contração de no mínimo 5% do PIB, elevando a taxa de desemprego a algo como 15 a 20%.

Nada que eu viesse a escrever alteraria esse quadro. Nada que qualquer dos meus colegas economistas progressistas vierem a dizer muda o nosso destino. A única mudança possível seria uma virada de orientação de Joaquim Levy, ou uma decisão da Presidenta de removê-lo da Fazenda ou, ainda, uma diretiva do PT para que ela respeite os compromissos históricos do partido com o crescimento econômico. Claro que nada disso vai acontecer. Portanto o grande desastre é inevitável. Passaremos, todos, pelo inferno, menos os bancos.”

Bem, o desastre chegou e eu decidi voltar a escrever com a intenção nada modesta de contribuir de alguma forma para a superação da crise. Contudo, se alguém ainda tem dúvida de que o desastre chegou, consulte comunicado de ontem da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda assinalando que o efeito da operação Lavajato sobre o PIB este ano será contração de 2,1%. Considerando que ainda teremos ainda os números do quarto trimestre, não será surpresa se a contração devida apenas à Lavajato sejam os 3% que previ.

Não só isso. O FMI, que sempre se esforça por melhorar os indicadores, fez uma projeção oficial de contração total da economia brasileira de 3% em 2015. É claro que isso é uma subestimação. Não está embutido nessa estatística todo o efeito do ajuste Levy, com seus brutais cortes de investimentos e de outros gastos públicos, ajudando – com a Lavajato – a travar a economia nacional de uma forma generalizada. Enfim, não gosto nada da ideia de que acertei nas previsões. Preferia ter errado em favor de um desempenho melhor.

A questão agora não é propriamente quem previu o que, mas o que fazer de agora para frente. A solução, estejam certos, não virá pela política. É que praticamente todas as instituições da República perderam totalmente a credibilidade. Temos que criar uma instituição nova a partir das bases da sociedade. Em outras palavras, é o momento da regeneração das instituições republicanas através da instituição do pacto social entre as classes fundamentais da sociedade, trabalhadores e empresários.

Isso não acontecerá por acaso: líderes trabalhistas e empresariais já começaram a falar a respeito. Eles tem interesses concretos comuns: o emprego e a retomada do crescimento econômico. Na medida em que vençam desconfianças recíprocas, poderão propor soluções práticas como a regeneração da Petrobrás e da cadeia produtiva do petróleo, e inspirar o Governo numa virada da política econômica, revertendo um processo no qual apenas os banqueiros e os financistas tem vantagens inequívocas.

J. Carlos de Assis – Economista, doutor pela Coppe/UFRJ, autor, entre outros livros de economia política, do recém-lançado “Os Sete Mandamentos do Jornalismo Investigativo”, ed. Textonovo.

                 

 

Redação

4 Comentários

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  1. Muita calma nessa hora.
    A

    Muita calma nessa hora.

    A queda do PIB ainda não chegou nos 5%, o desemprego não chegou nos 15 e o dólar nos 5 e ainda não há saques nos supermercados da periferia.

    Tudo questão de tempo.

    O Sr. crise ainda não chegou.

    Por isso podemos ainda brincar de “nós” contra “eles”.

    Quando o Sr. Crise chegar aí seremos “todos”, e não vai mais dar para brincar.

     

     

  2. questionem um liberal
    Perguntem a um liberal sobre o estado das coisas.
    E ele responderá:
    —as coisas vão val porque voces não aplicaram a receita corretamente. Falta aprofundar as medidas.

    Eles são incriveis.

    1. Achismo

      Talvez seja só achismo, mas você não deve ter conversado com um liberal nos últimos anos, certo?

      Ninguém que se defina como liberal acha que tem que aumentar a dose d que aí está (aumento de impostos e intervenção do Estado), pelo contrário, o que se espera é que o Estado diminua sua atuação, mas que essa diminuição venha acompanhada de diminuição da carga tribuitária, deixando a riqueza criada pelos indivíduos nas mãos dos próprios indivíduos, que saberão gerí-la muito melhor que qualquer governo.

      “O que certamente nunca houve no Brasil foi um choque liberal.[…] O liberalismo econômico, assim como capitalismo, não fracassaram na América Latina. Apenas não deram o ar de sua graça.”

      Roberto Campos

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