Uma batalha épica em pequenina proporção, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Enquanto estou escrevendo essas palavras a formiga está procurando o caminho de volta para seu formigueiro.

Uma batalha épica em pequenina proporção

por Fábio de Oliveira Ribeiro

A formiga que entrou no meu apartamento pelo vão entre a porta e o chão não reconhece os limites da minha propriedade. Ela não sabe nada sobre violação da posse, tampouco respeita a divindade da soleira cultuada pelos romanos.

Imediatamente sou avisado por Jano – bem na verdade não aconteceu dessa maneira, mas a narrativa ficaria menos interessante se eu dissesse apenas que olhei para o chão e vi a formiga – eu confronto o inseto invasor.

– O que você está fazendo aqui?

– Quem o convidou a entrar?

– Você não aprendeu que violar a soleira sem autorização equivale à uma declaração de guerra?

A formiga não toma conhecimento de minhas indagações. Ela está reconhecendo o terreno, provavelmente a procura de alimento ou avaliando o local para colonização.

Tento apanha-la ela se esquiva como quem diz:

– Quem você pensa que é, cuide de sua própria vida.

Tenho apanha-la uma vez mais, ela acelera o passo e posso ver que ela volta as mandíbulas para mim antes de fugir:

-Deixe-me em paz, ou então suporte as consequências.

Eu poderia pisar na formiga e encerrar esse pequeno conflito de uma vez por todas. Mas isso não seria justo. A formiga não representa verdadeiramente uma ameaça, no máximo um incomodo ocasional. Além disso, ao despertar minha atenção ela me livrou de alguns pensamentos melancólicos. Por isso ela não merece morrer. Mas isso não significa que ela possa ficar. Atrás de um batedor sempre há um exército prestes a invadir o território inimigo. Além disso, Jano recomendou que seria melhor preservar o invasor solitário para abortar uma invasão em larga escada.

Com cuidado apanho a formiga. Mas antes que possa joga-la pela janela recebi uma picada dolorosa no dedão da mão direita. Inseto mal agradecido, eu pensei. Maldito gigante que abortou minha missão, a formiga deve ter pensado.

Esse pequeno confronto ainda não terminou. Enquanto estou escrevendo essas palavras a formiga está procurando o caminho de volta para seu formigueiro. Melhor tapar o vão entre a porta de entrada e o chão, porque inseto belicoso pode voltar acompanhado de seus camaradas.

Fábio de Oliveira Ribeiro, 22/11/1964, advogado desde 1990. Inimigo do fascismo e do fundamentalismo religioso. Defensor das causas perdidas. Estudioso incansável de tudo aquilo que nos transforma em seres realmente humanos.

Este texto não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

Redação

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