Os sucessos de Roberto Carlos no cinema

Do Bahia na Rede

O sucesso no cinema do Rei Roberto Carlos

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À sua imagem e semelhança: expressão mais visível do cinema da jovem guarda, filmes do rei Roberto Carlos marcaram uma geração.

Por Marcos Pierry

A presença de astros da música popular no mundo do cinema é estratégia recorrente de produtores, diretores e dos próprios artistas, instados a fustigar qualquer brecha de massificação conforme a vigência de modelos bem específicos de circulação da arte a partir do pós-Guerra. Uma das ações de peso do modelo cultural pautado pela pressão de um potencial de mercado busca, justamente, fazer do que se torna sucesso em uma mídia fenômeno de vendas em outro meio de comunicação.

A migração do disco para a película encontra em Elvis Presley um de seus expoentes, ainda em um tempo em que as ondas do rádio pareciam falar mais alto que a imagem da TV. Do diretor Michael Curtiz, o mesmo de Casablanca, a produção de 1958 Balada Sangrenta traz o rei do rock a enfrentar as vilanices do personagem de Walter Matthau, a quem o público das comédias se acostumou a ver como o parceiro de Jack Lemmon. Gogó e quadris a postos, o roqueiro topetudo estreou em 1956, com Love me Tender, e iria estrelar três dezenas de filmes, incluindo Saudades de Um Pracinha, O Seresteiro de Acapulco, Ame um Pouquinho Viva um Pouquinho e diversos outros que embalariam matinês nas salas de projeção e, décadas depois, esquentariam a programação televisiva.

Da telinha para a telona

Cá nos trópicos, outro soberano da música, nascido em Cachoeiro de Itapemirim (ES), também deu motivo para jovens casais suarem as mãos no escurinho do cinema. Ele é Roberto Carlos e os filmes de que participou, lançados no período de 1968 a 1972, nunca deixaram de estampar seu nome desde o título; como a comprovar o poder de uma marca já testada e aprovada, inclusive na televisão, por meio do programa Jovem Guarda (65) e outras atrações da Record.

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As produções, todas dirigidas por Roberto Farias: Roberto Carlos em Ritmo de Aventura (68), Roberto Carlos e O Diamante Cor de Rosa (70) e Roberto Carlos a 300 Km por Hora (72). O rei da juventude, a rigor, já tinha estreado no cinema uma década antes, no mesmo ano do Balada Sangrenta de Elvis: fazendo uma ponta em Alegria de Viver, de Watson Macedo, e, ao lado de Erasmo Carlos com, pasmen!, Cauby Peixoto à frente, uma performance da música Let’s Rock que entrou no longa Minha Sogra É da Polícia, de Aloísio T. de Carvalho.

Os títulos que de fato contaram para a sua majestade são os da trilogia de Roberto Farias, àquela altura um realizador já ambientado tanto com o riso frouxo das produções da Atlântida, onde havia começado, quanto à reflexão social e o tom trágico que marcam Assalto ao Trem Pagador (62), seu momento de maior aproximação com o cinema novo. Estruturados, dentro do possível, à maneira hollywoodiana, os filmes do rei não perdem o sabor de paródia com o próprio mainstream e, malgrado as derrapadas e incontinências da proposta, com elementos do chamado cinema de autor.

Inicialmente inspirado em filmes dos Beatles, Farias apostou em cenas de ação, humor e clipes musicais memoráveis, consolidando o carisma do cantor junto ao público jovem ao lançar verdadeiros sucessos de bilheteria, que venderam, no total, estimados 10 milhões de ingressos. Apesar da repercussão, uma coisa era certa. Nos politizados anos 60/70, a ditadura como moldura, aderir à alegria fácil servida na tela dos Robertos significava praticamente assumir-se alienado.

Auxílio luxuoso

Os créditos renderiam um texto à parte para dar conta de participações como a dos escritores Paulo Mendes Campos ou Bráulio Pedroso no roteiro; o ator José Lewgoy, de algum modo, a reeditar os vilões que o tornaram célebre no período das chanchadas; Reginaldo Faria, Raul Cortez, Flávio Migliaccio e Paulo Porto também no elenco; José Medeiros na fotografia; Rafael Valverde e Raimundo Higino na montagem. Uma equipe que somente um diretor com experiência e trânsito poderia reunir.

Na primeira película, …Em Ritmo de Aventura (68), RC é perseguido por uma quadrilha que quer escravizá-lo como criador musical em série. O ídolo corre de um lado a outro, passando por Rio, São Paulo e Nova York em imagens incríveis, como as sequências aéreas no alto do Cristo Redentor, o voo de helicóptero no interior de um túnel, piruetas da Esquadrilha da Fumaça ou o número musical de Quando na cobertura de um prédio na Paulicéia.

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Repleto de músicas consagradas (Você Não Serve Pra Mim, Namoradinha de Um Amigo Meu, Por Isso Corro Demais, Eu Sou Terrível, Como É Grande o Meu Amor Por Você, Negro Gato…), o filme tem passado por uma reavaliação e perdeu um pouco da pecha de LP ilustrado do Roberto, algo não muito distante do resultado atingido por RC e o Diamante Cor de Rosa (70), próximo trabalho da série. A novidade é Erasmo Carlos, o Tremendão, e Wanderléa, a Ternurinha, cantando, respectivamente, Vou Ficar Nu Pra Chamar sua Atenção e Você Vai Ser o Meu Escândalo enquanto o rei solta a voz em As Curvas da Estrada de Santos. Desta vez, o jogo de gato e rato com os bandidos ganha cenas no Japão, Israel e Portugal.

No terceiro longa, RC a 300 Km por Hora (72), somente o velho parceiro Erasmo permanece no elenco. Ele e Roberto, vivendo dois apaixonados por automobilismo, decidem ficar longe dos números musicais e investir nos personagens. O excesso de merchandising comprometeu a narrativa e Roberto Carlos posteriormente reprovaria seu trabalho de ator. O campo de referências desloca-se das produções dos Beatles – Os Reis do Iê Iê Iê (64) e Help! (65), dirigidos por Richard Lester – para o Elvis Presley de Amor à Toda Velocidade (64). Mas, embora ainda rentável, a fórmula dava sinais de esgotamento.

RC contra Godard

De qualquer maneira, com os filmes do xará Farias, Roberto entrou para a história do cinema brasileiro. A longevidade do especial de TV de fim de ano, exibido desde 1974 pela Globo, e que já contou com o rei de bigode, chapéu e bengala chaplinianos a homenagear o ícone do cinema, não reduz a importância da trilogia para sua imagem de astro da música. São filmes que marcaram a jovem guarda e, de quebra, deram uma aula de mercado.

RC tonou-se, desde então, presença obrigatória em trilhas de filmes e telenovelas, como pode ser visto, e ouvido, neste 2012 no longa À Beira do Caminho, de Breno Silveira, o mesmo diretor de 2 Filhos de Francisco, e Salve Jorge, trama de Glória Perez com direção de Marcos Schechtman.

O cantor voltaria a cruzar o caminho de outra lenda da sétima arte nos anos 80, quando apoiou o veto do presidente Sarney a Je Vous Salous Marie, de Jean-Luc Godard. Talvez um pouco demais, mesmo para quem ganharia, tempos depois, um dia oficial em sua homenagem (26 de fevereiro) na terra do cinema, Los Angeles. Mas rei é rei.

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Jornalista, professor e crítico de Cinema

Luis Nassif

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