Pior pesadelo do Google, Vertager pode angariar R$ 21 bi da empresa para a UE

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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“O Google usa sua posição dominante para promover seus próprios serviços e tornar mercados viáveis”, aponta na acusação
 
 
Jornal GGN – Margrethe Vertager é a “dama de ferro da União Europeia” e “o pior pesadelo do Google”, segundo a revista Time. Ex-ministra da Economia da Dinamarca, a atual comissária de competição do bloco europeu comanda uma acusação contra o Google, que pode tirar da companhia algo em torno de 21 bilhões de reais de multa pelo formato de venda de produtos em serviços de busca. 
 
À Folha de S. Paulo, Vertager disse que os produtos do Google Shopping dominam as prateleiras no buscador, o que seria um abuso sobre a concorrência no mercado online. “O Google usa sua posição dominante para promover seus próprios serviços e tornar mercados viáveis”, disse.
 
Por outro lado, a empresa nega a acusação e afirma que a ação de Margrethe Vertager é “muito forte” e “decepcionante”. Em dez semanas, o Google terá que responder ao “comunicado de objeções”, antes de o bloco entrar ou não com uma ação. 
 
Leia a entrevista completa da Folha:
 
Folha – A sra. concorda que virou um pesadelo para o Google?
 
Margrethe Vestager – Estou tentando fazer meu trabalho. Para mim, tem sido uma grande transição de quem vem da política. Quero fazer algo baseado em fatos, evidências, sendo que estamos acostumados a ser legisladores, não aplicadores da lei. Trabalho em cima dos valores de nossa sociedade europeia, que deve ser aberta, com uma competição justa e a melhor escolha para cidadãos e consumidores.
 
Qual o impacto das práticas investigadas para as pessoas?
 
O Google é muito bem-sucedido e dominante na Europa em termos de pesquisa e tem usado essa posição para promover seus próprios serviços e tornar mercados viáveis. Se você faz uma busca por compras, o Google Shopping vai sempre aparecer em primeiro na resposta.
 
Às vezes, isso pode ser bom, mas, em outros casos, a resposta deveria ser outra e isso não é oferecido. Como uma empresa vai tentar ser melhor, oferecer algo novo?
A preocupação é que há um risco para nós, como consumidores, de sermos privados de inovações, de novos desenvolvimentos do mercado.
 
Ser dominante não é consequência da livre competição?
 
É justo poder crescer. Se eu perguntar às minhas filhas por que usam o Google, vão responder: “Ah, mãe, é o melhor”. E isso não é porque é uma empresa norte-americana, seja lá o que for. Estão se tornando dominantes porque têm feito um bom trabalho. No entanto, isso não permite fazer algo que não seja competitivo, meritocrático, que não foi escolhido pelos consumidores.
 
Não é natural que uma empresa privada como o Google coloque seu produto na frente numa pesquisa?
 
Você pode ser dominante, bem-sucedido. Todo o mundo, incluindo a mim, vai lhe parabenizar. Mas você não pode abusar dessa posição para tornar viável um mercado em que não é dominante (como o de compras) e não foi bem-sucedido. Afinal, os consumidores não estão escolhendo você pelos seus próprios méritos, mas apenas porque você se colocou na cara deles por ser dominante.
 
Há outras investigações em curso contra o Google?
 
O comunicado de objeções diz respeito ao Google Shopping, mas não significa que é tudo o que estamos fazendo sobre a empresa. Em paralelo, temos várias questões. Uma delas é o que chamamos de “scraping”, a cópia de certa parte de conteúdo, tirando de uma página e colocando na sua. Temos também questões sobre propaganda. É muito difícil para uma empresa fazer propaganda em outra que não seja o Google.
 
Uma das preocupações que temos ainda é que o Google está fortemente incentivando fabricantes a produzir equipamentos com o Android, e, portanto, fechando o mercado e dificultando o surgimento de novos sistemas operacionais.
 
Nos Estados Unidos, fala-se até em conspiração na UE pelo fato de o alvo ser uma empresa americana.
 
Obviamente, não concordo. Levei as acusações a sério, porque é ruim se a aplicação do direito à concorrência for usada de maneira política. Definitivamente, não é nosso objetivo. Nosso trabalho é guiado por escolhas, consumidores, inovações.
 
Um dos fatos que nos suportam no caso Google é o grande número de reclamações de outras empresas norte-americanas. Eu uso o Google, não tenho nada contra como empresa, mas o problema é sua conduta, seu comportamento.
 
A sra. realmente acredita que é possível controlar esse tipo de domínio na internet?
 
Acho que podemos fazer isso na Europa se queremos uma economia justa. Nós temos sistema político, regulação, legislação. Seja grande ou pequeno, tem de atuar de acordo com as mesmas regras, com o que está escrito, não importa a sua bandeira. Se temos um jogo e você é grande, é mais fácil competir do que quem é pequeno. Mas às vezes o pequeno é capaz de fazer coisas que o grande tem esquecido.
 
Como ser competitivo hoje na internet sem ser uma grande empresa?
 
Todas essas empresas provavelmente já foram pequenas. Quando começaram, não tinham cem anos de história e eram pequenas até pouco tempo atrás. O Skype começou pequeno, por exemplo. Você tem uma ideia, faz um software, as pessoas gostam e você cresce. Nosso trabalho é manter o mercado aberto. Se não garantir isso, não haverá chance de alguém crescer.
 
Os russos acusam a sra. de tomar uma ação política contra o governo de Vladimir Putin no caso da Gazprom.
 
As reclamações contra a Gazprom vêm desde 2011 e uma investigação foi aberta em 2012, antes de vir à tona essa agenda política da Rússia. É novamente um caso importante sobre o nosso mercado único, da UE, para mantê-lo aberto e competitivo. Para nós, o mercado único tem criado empregos, oportunidades, e, portanto, o uso dele tem de ser competitivo e justo, com esse propósito, e não para fins políticos, senão tira a legitimidade.
 
Como tem sido sua relação com o Google e o que pode ocorrer?
 
É uma relação profissional. Eles podem não concordar conosco, mas temos ainda que ter uma relação. Não tomaremos nenhuma decisão antes de receber as respostas. Nesse tipo de caso, há diferentes caminhos a tomar. Um é negociar compromissos. Se não for possível, uma decisão a ser tomada pela comissão é impor a multa.
 
O que diria para autoridades de outros continentes sobre essa experiência?
 
Isso depende muito da situação do mercado. A razão para nós é que aqui o Google é muito dominante, há áreas em que tem 90%, 95% de domínio de pesquisa. E não é muito diferente no Canadá, nos EUA, mas não tenho muita ideia de como seja no Brasil ou na Argentina. O desafio da globalização é impositivo e o número de agências de aplicação de direito à concorrência tem crescido.
 
Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

1 Comentário

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  1. As mídias brasileiras ainda

    As mídias brasileiras ainda não entenderam que não tem como concorrer com o Google PORQUE é uma nova forma de negócio.

    E só pode ser contida(se é que deve ser) por Estados nacionais fortes.

    A Globo não tem força para conter Google.

    Ou fortalece o Brasil ou vai quebrar!

     

    A ficha aidna não caíu. Se acham aliados de guerra fria. Será assim até se darem conta que são, para os EUA, apenas cucarachas.

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