Mãe de menina trans pede veto para lei que proíbe discussão de gênero

Do Jus Brasil

Mãe de menina trans pede veto para lei que proíbe discussão de gênero
 
Com quatro anos, criança jogou fora todas as roupas de menino. Caso lei seja sancionada, família de criança teme pela integridade da filha.

A mãe de uma criança trans de 5 anos escreveu uma carta para o Prefeito de Teresina, Firmino Filho (PSDB), pedindo que ele vete o projeto de lei que proíbe a discussão de gênero em escolas da capital. Além de considerar o PL retrógado, a família da pequena teme que a não abordagem sobre transgêneros coloque em risco a integridade da criança e comprometa o convívio social com outras crianças.

“Onde fica a orientação do MEC para trabalhar com temas transversais? O que será das outras crianças como Paty*? Como a administração municipal pretende fazer a inclusão nestes casos? O senhor já parou para pensar que crianças também sofrem homofobia e transfobia? Com discussões tão avançadas sobre o tema, por que sancionar essa lei que atrasa o desenvolvimento da sociedade? Pois não falar no assunto não vai fazer Patys, as Lauras, as Milenas e os Vitos desaparecerem da sociedade”, escreveu, completando “fica o apelo de uma mãe pela igualdade”.

Segundo o Projeto de lei nº 20/2016, de autoria da vereadora Cida Santiago (PHS), fica proibida a distribuição, utilização, exposição, apresentação, recomendação, indicação e divulgação de livros, publicações, projetos, palestras, folders, cartazes, filmes, vídeos, faixas ou qualquer tipo de material, lúdico, didático ou paradidático, físico ou digital contendo manifestação da ideologia de gênero nas escolas municipais de Teresina.

“Você não falar sobre transgênero não vai fazê-las sumir, vai apenas excluir essas pessoas. A gente não pode andar para trás, temos que evoluir. Com a aprovação de uma lei como essa, as Patys ficarão desamparadas. Por desconhecimento, você vai matar a vida escolar de um ser humano”, disse a mãe da menina, que pediu para não ter a identidade divulgada.

O projeto foi aprovado pela Câmara de Teresina e aguarda apenas a sanção do Prefeito de Teresina, Firmino Filho (PSDB). Grupo ligados aos direitos humanos, direitos LGBTs, bem como Ministério Público pediram o veto completo ao projeto com o argumento de que coloca direitos dos cidadãos em risco.

Descoberta

A mãe de Patrícia conta que sua filha tem corpo de menino e foi criado como tal, recebendo brinquedos e roupas masculinas. Entretanto, com menos de um ano, Paty preferia as bonequinhas, copos, e os pratinhos rosa da irmã aos seus utensílios azuis. “Com um ano e meio de idade, ela sempre pedia para vestir as roupas da irmã, assim como fazia da blusa da escola um vestido”, disse.

Mesmo em meio a essas manifestações, a mãe afirmou que a criança era conduzida para os padrões masculinos, mas recusava tudo que não fosse feminino.

Me de menina trans pede veto para lei que probe discusso de gnero

Próximo de completar três anos, um dia ela disse que se chamava Raquel. A gente chamava pelo nome e ela dizia que seu nome era Raquel. A gente tentava conduzir para o padrão do gênero masculino, mas sem nunca dizer que era errado. Ela tinha brinquedos de menino, mas só queria brincar com os de menina”, contou a mãe.

Ainda em meio a essa divisão entre se sentir como uma menina, mas sendo criada como um garoto, aos quatro anos, a mãe de Patrícia é surpreendida pela filha com um entulho de roupas. “Ela disse que não iria mais vestir roupas de menino. Ela fez um bolo de roupas e ficou apenas com duas peças. Argumentei que ela ficaria sem o que vestir e ela respondeu que dividiria as roupas com a irmã”.

Com discussões tão avançadas sobre o tema, por que sancionar essa lei que atrasa o desenvolvimento da sociedade?”

Mãe de Paty, sobre o PL que proíbe discussão de gênero nas escolas públicas de Teresina

O ato de jogar as roupas, bem como uma conversa com a cunhada médica, foram o estopim para a mudança. A mãe passou a pesquisar sobre o assunto, assistir documentários e então tomou consciência de que seu filho era uma criança trans.

“A gente já tinha acompanhamento psicológico desde os quatro anos. Quando percebi que era irreversível, que meu filho era uma menina, precisava que um profissional me desse sua chancela, que me ajudasse a observar, lidar, acompanhar, entender tudo isso e conduzir a situação da melhor forma possível”, contou a mãe.

Após um ano conturbado de “transformação”, Paty entrou em 2016 em uma nova escola, dessa vez com nome social e sem desconfiança daquelas que já a viram como um menino.

“Como a gente tentava impor um padrão social, ela não dormia, passava o dia inteiro chorando, passava o dia estressada. Todos achavam que o tinham direito de dizer que ela estava errada. Quando ela passou a se vestir como menina, tudo melhorou. Depois que ela mudou de escola, ela se tornou outra criança, uma menina feliz. Aceitei que minha filha fosse menina para que ela pudesse ser feliz”, contou.

Carta

Em meio a polêmica sobre o projeto de lei que proíbe a discussão de gênero nas escolas públicas, a mãe de Paty escreveu a comovente carta pedindo o veto do prefeito de Teresina, Firmino Filho (PSDB), ao PL. O relato descreve toda a transcição do Patrício em Patrícia, relatou como teve de lidar com a família, amigos e escola.

” Foi duro entender e aceitar que minha filha é uma criança trans e foi por amor que tive que ‘matar’ o menino dentro de mim para que a Paty nascesse “, escreveu.

A mãe conta que a” transição “começou na escola onde entrou ainda como menino, que as crianças entenderam e assimilaram Paty, mas o mesmo não aconteceu com os adultos.” Paty foi matriculada na escola ainda um menino, quando começamos a fazer a transição foi difícil para os adultos entenderem, enquanto as crianças aceitaram a novidade normalmente “.

Decidida a mudar de escola, a mãe encontrou mais um empecilho, nenhuma das seis escolas particulares procuradas se disponibilizou a acolher o caso de Paty.”Nenhuma das escolas que eu visitei (e podia pagar) me acolheu. Uma chegou a me pedir um laudo psiquiátrico alegando a doença da minha filha; em outra as vagas desapareciam ou eram marcadas reuniões que nunca aconteciam. Estava claro que ninguém sabia lidar com o assunto”.

Com a ajuda do Ministério Público do Piauí, a família foi procurar uma escola pública que tem obrigação de ter políticas inclusivas.” Foi a melhor atitude que tomei “.

“Senhor Prefeito, a questão de gênero é uma realidade na rede pública Municipal, a Paty é a prova disso. Por isso, venho através desta pedir o veto da lei que veda a distribuição, exposição e divulgação de material didático contendo manifestações de gênero nos estabelecimentos de ensino da rede pública Municipal, pois é contraditório existir leis de inclusão de pessoas LGBT e não poder falar sobre elas”, escreveu a mãe..

*Patrícia é um nome fictício para preservar a identidade da criança

 

Redação

7 Comentários

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    1. Diante de um drama desses, é tudo o q vc tem a dizer? E c/ má fé

      Haja insensibilidade. Conservadorismo acima de tudo, mesmo da felicidade de uma criança. Qual a sua proposta de soluçao, jogar a menina no mar?

      E má fé além de tudo. A mae nao está dizendo que o “Estado brasileiro” está atrasando o desenvolvimento da sociedade, tá dizendo que essa lei retrógrada faz isso. E jamais Felicianos e Bolsonaros se apoiariam no que diz essa mae, eles sao os algozes de casos como esse (com o seu entusiasmado apoio, mesmo se implícito; pode nao apoiar a eles, mas apóia as idéias retrógradas deles)

  1. O fascismo e o obscurantismo

    O fascismo e o obscurantismo avançam mesmo sem terem ainda deposto a presidente Dilma. Imaginem depois, se por uma tragédia extrema vier a acontecer o pior.

  2. E a vereadora criminosa?Continua solta?Afrontando o estado de di

    reito?Canalha nazista!Segundo o Projeto de lei nº 20/2016, de autoria da vereadora Cida Santiago (PHS), fica proibida a distribuição, utilização, exposição, apresentação, recomendação, indicação e divulgação de livros, publicações, projetos, palestras, folders, cartazes, filmes, vídeos, faixas ou qualquer tipo de material, lúdico, didático ou paradidático, físico ou digital contendo manifestação da ideologia de gênero nas escolas municipais de Teresina.

  3. Eis o covil onda a besta fera foi gerada.

    CIDA é membro da Renovação Carismática Católica (RCC) na qual atua nos ministérios de Pregação e Fé e Política. Participa do Movimento carismático há 18 anos, Semeando a Cultura de Pentecostes e trabalhando intensamente em defesa da vida e da dignidade humana. É idealizadora da Caminhada a Favor da Vida, onde as pessoas pró-vida podem se manifestarem contra toda forma de pratica abortista.

  4. E é pra isso que estamos avançando

    Não se trata só de agredir e constranger quem tenta debater o assunto, não querem nem mais o trabalho de discutir e explicar seus pontos de vista: querem proibir falar do tema! Tá ficando medieval, tá ficando sinistro, tá virando ditadura!

    Por essas e outras que estou preparando meu desembarque do Brasil. Houve uma época em que pensei que iria viver num país onde se pudesse falar de qualquer assunto sem embargo. Um país realmente livre de amarras, um país avançado, moderno, onde se discutisse ideias de boa, sem problemas.

    Mas a pior herança que a mídia vai deixar, dessa campanha anti-PT, é essa geração de fascistas que está se criando. Pra vencer a cabeça de ultradireita dessa garotada de Facebook de hoje só daqui a uns 20, 30 anos. E aí eu já vou estar velho, eu queria aproveitar meu país era agora!

    Tem uma geração inteira formadinha na ideia de que homofobia e racismo é mimimi, que não existe violência contra a mulher, que maconheiro tem que tomar porrada, que as oportunidades são iguais pra todos (e por isso pobre é pobre por opção) e que bandido bom é bandido morto. Nem 1% dos jovens de hoje consegue desenvolver um pensamento que vá além desses chavões rasteiros. É a herança da mídia brasileira, caia Dilma ou Dilma fique, e eu não quero conviver com isso. Vou embora para algum lugar onde você possa pensar e falar sem apanhar no meio da rua…

     

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