O discurso econômico e a luta política

Coluna Econômica – 18/06/2010

Recentemente houve uma discussão curiosa no meu Blog. Um comentarista desenvolveu a seguinte lógica: dois comentaristas econômicos de rádio são mercadistas, defensores do câmbio apreciado; Serra defende um modelo econômico de câmbio depreciado; se, mesmo assim, eles defendem Serra e atacam Lula, a única explicação plausível é o preconceito de classes.

Nas discussões, outro comentarista rebateu essa tese. Explicou que Lula faz parte do jogo político macro, articula-se com os maiores poderes da República, logo não pode ser vítima de preconceito algum.

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ParPara entender melhor a questão, é preciso distinguir ângulos do debate político. Há um que se dá em torno do jogo político aberto, no qual os personagens mais evidentes são os partidos políticos, a opinião pública midiática e os movimentos sociais.

Há um segundo jogo, subterrâneo, em que se disputam alianças com os grandes interesses econômico-financeiros. É através desse segundo jogo que grupos políticos logram ascendência sobre parlamentares, sobre alta burocracia pública e sobre a mídia, e se trama a conquista do Estado – para compreender a definição dada por FHC quando explodiu o episódio Satiagraha.

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Tem-se, portanto, de um lado o presidente ou candidato a presidente. De outro, o parlamento. E no meio o jogo político de garantir a governabilidade e o controle do Estado. Esse controle se dá ou através da cooptação dos parlamentares ou através de um discurso político que garanta a legitimidade do governo – e aí a mídia tem papel relevante.

Até algum tempo atrás esse jogo estava restrito a negociações com chefes políticos, grandes grupos econômicos e a mídia ecoando um conjunto de interesses.

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E aí se chega em José Serra.

Até o final dos anos 80, os interesses empresariais eram representados basicamente pela FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e por empreiteiras –que sempre tiveram grande influência sobre sucessivos governos.

No início do Real, o PSDB – através de Pedro Malan, Gustavo Franco, Edmar Bacha, Pérsio Arida – articulou uma aliança com grupos de banqueiros investidores que participaram ativamente do processo de privatização. De seu lado, Serra manteve a proximidade com alguns grandes grupos empresariais paulistas.

Na época, se pensava nele como um industrialistas, em contraposição ao mercadismo vigente na era Malan. E, aí, analistas da mídia pendiam vigorosamente para Malan, mesmo porque o PT não era alternativa política.

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Com o tempo, Lula cria o chamado novo desenvolvimentismo e o mercadismo não tem um representante direto. Entra Serra na parada, tentando articular interesses de grandes grupos paulistas mas sem perder o apoio dos financistas tucanos.

É nesse momento que se dá o nó na cabeça dos analistas. Mantém a crítica ao desenvolvimentismo mas poupam Serra e esquecem seu discurso. Então, como justificar a análise pertinaz contra toda forma de desenvolvimentismo, se seu candidato é, ou ao menos era desenvolvimentista.

A saída é focar no discurso do preconceito, como forma de diferenciação dos candidatos. Mas o pano de fundo é a velha luta pelo controle do Estado. Propostas políticas são apenas álibis para consolidar alianças. 

Luis Nassif

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