Os parâmetros da política industrial

Coluna Econômica

David Kupfer é um excelente industrialista, digno sucessor de Antônio Barros de Castro, nosso maior industrialista contemporâneo.

Dias atrás escreveu um artigo para o jornal “O Valor Econômico” – “Comigo ninguém iPod” – com conclusões um tanto imprecisas sobre política industrial.

O mote do artigo é a política de compras públicas, privilegiando o conteúdo nacional. Kupfer a defende em parte. Mostra que mudaram os paradigmas da indústria. Agora vale a especialização vertical, a chamada fragmentação da produção, a grande rede global de fornecedores especializando-se em componentes específicos.

Cita como exemplo o iPod, para taxar como extemporâneo e ingênuo o debate atual entre produção interna e global.  “Ingênuo porque opor local e global desconhece a complexidade da manufatura contemporânea, não somente no chão de fábrica mas em tantas atividades que se estruturam no seu entorno com o intuito de fazê-lo funcionar com alta produtividade e inovatividade”.

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Vamos por partes.

Esse novo desenho da indústria mundial tomou corpo na primeira metade dos anos 90, com o avanço da telemática e da logística. China e Brasil eram a bola da vez, especialmente depois que o país conseguiu estabilizar sua moeda e, no segundo semestre de 1994, permitiu a ascensão de milhões de pessoas ao mercado de consumo.

Ambos os países estavam sendo selecionadas por grandes multinacionais para abrigar as empresas-âncoras.  As jogadas cambiais dos economistas do Real desperdiçaram a oportunidade. O mercado interno refluiu, sob o peso da vulnerabilidade externa e de juros inacreditáveis.

Os erros continuados do câmbio, nos dois governos FHC e Lula e no primeiro ano do governo Dilma, enfraqueceram substancialmente a malha industrial. E agora?

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A partir dessa introdução, Kupfer tira duas conclusões:

  1. Que as políticas industriais brasileiras deveriam contemplar essa especialização vertical.
  2. Que sua função seria tirar o país da dependência da indústria, como fator dinâmico

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Há que se analisar melhor as correlações que faz entre o momento atual – nas indústrias de grande potencial de inovação tecnológico – e o quadro brasileiro, para não concluir que se está contra o conteúdo nacional.

Não existe vocação natural, ainda mais em se tratando de inovação e tecnologia.

A China tornou-se um grande polo de inovação através de regras rígidas de atração de capital externo, que permitiram aos seus industriais absorver tecnologia global. Não bastava se instalar no país: era necessário transferir tecnologia.

A exigência de conteúdo nacional tem levado muitas multinacionais a se instalarem no país. Não basta. Há que se exigir dos fornecedores externos parcerias com universidades, associação com empresas nacionais, garantia de transferência tecnológica.

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Não apenas compras públicas, mas acesso a financiamentos, incentivos fiscais, todo esse escopo de apoio ao investimento tem que se subordinar à transferência de tecnologia de ponta. E exigir do parceiro nacional beneficiado compromissos estritos com pesquisa e com a cadeia produtiva.

Luis Nassif

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