Um perfil de Nelson Barbosa

Um keynesiano pouco ortodoxo

Autor(es): Paulo Totti, de Brasília, Valor Econômico/Clipping Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão –27/08/2010

(http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/8/27/um-keynesiano-pouco-ortodoxo)

Nelson Barbosa tem 1,90 m e, durante a juventude, exibia seu porte atlético na Lagoa Rodrigo de Freitas, onde foi campeão de remo pelo Vasco da Gama e pelo Flamengo, nas categorias “4 sem” e “2 sem” – quatro ou dois remadores, sem timoneiro. Aos 40 anos, é secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e chama a atenção nos bastidores do Planalto não exatamente pela posição proeminente que ocupa à mesa de qualquer reunião de que participe. São suas algumas das ideias que ajudaram o Brasil a superar a crise financeira internacional de 2008/2009.

Levado a essas reuniões pelo ministro Guido Mantega, Nelson Henrique Barbosa Filho tornou-se conhecido de Dilma Rousseff, então chefe da Casa Civil, e do próprio presidente Lula, ao participar da equipe que formulou duas das iniciativas de maior sucesso no segundo mandato deste governo, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o Minha Casa, Minha Vida………..

……….Nelson foi assessor de Guido Mantega no Ministério do Planejamento e no BNDES e, novamente convocado, está em Brasília desde 2007, com mulher e filho. Jussara, mestra em educação pela City University de Nova York, trabalha em Brasília num escritório que dá assistência a quem quer estudar nos Estados Unidos. E o filho, Henrique, de 5 anos, se alfabetiza em escola particular. “Aqui há muito espaço verde e isso é bom para crianças”, diz.

O jantar foi finalmente marcado para depois do expediente na Fazenda, às 10 da noite de uma terça-feira no Dom Francisco da Academia, restaurante brasiliense notável pela coleção de vinhos portugueses e pela qualidade do bacalhau servido ao lado da piscina de uma academia de tênis. ………..

………A conversa começa com uma rememoração do repórter. Era 2005, auge da crise do mensalão. A militância do PT do Rio precisava de algo forte para recuperar a autoestima e as finanças, abaladas ambas pelas tropelias do momento. Promoveu-se um grande jantar a R$ 1 mil a cabeça e a recém-empossada ministra da Casa Civil, Dilma Roussef, foi a convidada de honra da noite. Sentado longe dos holofotes e ao lado de Jussara, Nelson comentou: “Dilma deveria percorrer todas as mesas, sorrir, cumprimentar as pessoas”.

– Dilma já era sua candidata?

– Percebia nela um potencial de candidata. Com o PAC, a candidatura se consolidou.

 – Surpreendeu que um discreto economista do BNDES tivesse a sensibilidade política de perceber que a candidata em potencial deveria interagir com os companheiros, sair pelo salão a distribuir simpatia.

Há ironia no sorriso de Nelson:

– Economista tem que saber muita matemática. Mas não basta. Tem, também, que saber de política. A ciência, aliás, se chama economia política… Conhecer história igualmente ajuda.

Nelson Barbosa estudou no Colégio Princesa Isabel, na rua das Palmeiras, em Botafogo, e entrou na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 1988. Mas nunca fez política estudantil. “Fiz política mesmo. Lembro que, num domingo de 1989, fui do Arpoador ao Leblon, ida e volta, com um bandeirão vermelho e distribuindo panfletos no calçadão da praia: “Lula presidente”. Não era filiado ao PT e até hoje não sou.”

Da graduação na UFRJ (1988/91) recorda-se da campanha pelo impeachment do presidente Fernando Collor (1991) e das aulas de Carlos Lessa: “Foi o meu melhor professor de economia brasileira. As aulas dele são um show”. Outra grata recordação da universidade é a do convívio com Maria da Conceição Tavares, sua orientadora no mestrado. “Não pude ir à festa dos 80 anos da professora. Estávamos na reunião do FMI. Mantega e eu ligamos de Washington.”

O hoje também presidente do Conselho de Administração do Banco do Brasil lembra que, em 1994, seu último ano de mestrado, não perdia “as famosas reuniões” de economistas do PT. “Famosas porque só participava gente ilustre, o Edward Amadeo, o José Márcio Camargo. Todo mundo era do PT. Eu ficava só ouvindo.”………

…………… Em 1994, fez concurso para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o Banco Central e a Petrobras. Passou nos três e escolheu o Banco Central. Em 1997, estava no Departamento de Fiscalização Bancária do BC, quando fez concurso para o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Aprovado, não chegou a assumir porque, simultaneamente, o aceitaram como bolsista na New School for Social Research de Nova York, “a escola americana mais heterodoxa”.

– Lá dedicam a Keynes mais do que duas horas por semestre?

– Muito mais. Não só a John Maynard Keynes. A Karl Marx também. Escola de tradição bem crítica, com ênfase no estruturalismo.

Acabou o doutorado em 2001 e ficou mais um ano porque Jussara fazia mestrado. Nesse ínterim, foi professor da New School e deu aulas particulares de matemática. “A grana era curta.”

Em 2003, a convite do professor José Carlos Miranda, seu colega na UFRJ e chefe da assessoria econômica do Ministério do Planejamento, foi conhecer o ministro Guido Mantega e colaborar na elaboração do Primeiro Plano Plurianual (PPA) do governo Lula. Ali já estavam as linhas mestras de programas sociais e de desenvolvimento que viriam a ser executadas somente no segundo mandato. Nelson não admite que o PPA tenha sido boicotado pela equipe do então ministro da Fazenda, Antônio Pallocci, mas essa, como ainda hoje circula em Brasília, teria sido a razão do seu inesperado regresso para o Rio e as aulas na UFRJ. Sobre o episódio, silencia.

Na universidade dedicou-se à sua especialização: economia internacional e economia monetária. “Com a passagem pelo Planejamento, pelo BNDES, e agora na SPE, estou é fazendo um “pós-doc” (pós-doutorado) de Brasil. Um dia discuto o preço mínimo do trigo; em outro, moradia popular ou incentivo ao etanol.”

– Você é um carioca na equipe de um ministro ítalo-paulista. Como se sente?

– A equipe de Mantega não é um “paulistério”. Na Receita está o Otacílio Dantas Cartaxo, nordestino. Arno Augustin, gaúcho, no Tesouro. A mineira Adriana Queiroz de Carvalho, procuradora. Chefe de gabinete é o Luiz Eduardo Melin, carioca. Paulista e amigo de longa data do ministro é o Nelson Machado, secretário executivo. A gestão é profissional………..

……….

– Não está na hora de pensar no financiamento a longo prazo da nossa economia?

Nelson fica mais sério. Do outro lado da mesa aparece o economista Barbosa.

– O investimento necessário requer um volume de financiamento que testa o limite da estrutura atual. Na crise, a solução de curto prazo foi encontrada via BNDES. Mas foi uma emergência. O ministro Mantega já declarou que quer mais mercado no financiamento de longo prazo e menos recursos públicos. Estamos preparando propostas nessa direção, que serão apresentadas ao presidente Lula. Mas tudo isso tem a ver com os juros. Não há mercado de longo prazo com juros muito mais altos do que os praticados por países com a mesma característica do Brasil. Tem que haver rentabilidade e atratividade.

– E quando veremos essa coisa maravilhosa?

– Penso que o próximo governo fará a transição para uma taxa real a níveis civilizados. Neste governo a taxa real baixou de 16% para 6%. Já se conseguiu o controle da inflação com crescimento, o rigor fiscal com distribuição de renda e o câmbio flutuante com menor vulnerabilidade externa, graças à quantidade de reservas. É o tripé da atual política econômica. O arcabouço é o mesmo do governo anterior. O direcionamento é que mudou, com os resultados conhecidos.

– Tem gente por aí dizendo que pode mais…

– E tem gente que não diz. Faz mais…

– Delfim Netto entende de economia, de política e de história. O que você acha dele?

– Delfim é economista em todos os sentidos. Ele tem a vantagem de ter tido uma formação de antes dos anos 60, pré-idade média da economia, quando começou a se impor a ideologia do “mercado resolve tudo”. Aliás, o líder liberal, Milton Friedman, sabia demais. Seus alunos é que apreenderam só uma coisa.

– O que você acha dos últimos ataques ao BNDES e à Petrobras?

– Ambos existem, graças a Deus. O BNDES deu rápida resposta à crise, atuou para manter os investimentos do governo e da atividade privada. Por isso o país não caiu na recessão.

– E os grandes créditos para frigoríficos?

– O Luciano [Coutinho, presidente do BNDES] já esclareceu em entrevista. Faz sentido fortalecer os produtores nacionais de alimentos para aumentar sua competitividade internacional. Essa operação foi feita a taxas de mercado, com a colocação de debêntures do BNDESPar. Mais: não faltou dinheiro no BNDES para pequenas e médias empresas.

– E os ataques à Petrobras?

– A Petrobras é vital para que os recursos do petróleo revertam em benefício do país como um todo. Ela precisa aumentar seu capital. Não vou falar mais sobre isso porque pode envolver o preço das ações de uma companhia aberta.

– Você está proibido de falar a favor, por causa do tal período de silêncio. Mas eu posso falar contra. Não há uma contradição da legislação?

– A legislação é feita para proteger o investidor, evitar manipulações…

Quem um dia foi aprovado em concurso para fiscal da CVM não quer discutir em público as regras do mercado de capitais. E é melhor mudar o rumo da conversa, enquanto já se está à sobremesa: creme de mamão com cassis, tortas de castanha com sorvete e musse de chocolate.

– Quais são os desafios do próximo governo?

– Cria-se no Brasil uma nova e exigente classe média. Melhorou a distribuição de renda, melhorou o salário mínimo, o acesso ao crédito e à moradia. Agora temos que entrar nas questões mais difíceis, atender a uma crescente demanda de serviços públicos universais de qualidade, tipo bairro mais seguro, hospital melhor, escola melhor. É bom, porque isso gera frentes internas de crescimento. Socialmente é por aí.

– Universidade e governo, qual é a diferença?

– Na academia briga-se por detalhes, você procura as divergências. No governo, buscam-se convergências. Tem que alocar prioridades dentro de um orçamento limitado. Recentemente, provamos que se poderia crescer mais e isso era sustentável. Mas é diferente de dizer que o Brasil pode crescer a qualquer taxa. Claro que existe limite para o crescimento.

– Para alguns keynesianos não há limite.

– Sou keynesiano, mas não pertenço à Igreja da Ressurreição Keynesiana, adepta do joga dinheiro, joga dinheiro, que tudo vai dar certo. Keynes não achava isso, mas o pessoal às vezes se empolga… No Brasil há também a Igreja da Microeconomia dos Últimos Dias. Ela acha que o Bolsa Família é ruim porque estimularia o pobre a não trabalhar. Essa seita não vê o impacto macroeconômico, não aceita que por aí o pobre entra no mercado. A discussão é velha, do século XVI, quando se votou a English Poor Law, a lei dos pobres da Inglaterra. O debate sobre o estado do bem-estar social tem esses extremos ideológicos. Você só pode se dar ao luxo de ter opiniões tão extremas se estiver na academia ou se for um desses economistas de banco ao qual ninguém presta atenção. No governo, o que você faz tem implicações na vida das pessoas. Por isso, hoje, o maior economista do Brasil se chama Luiz Inácio Lula da Silva. Ele sempre pergunta: “Em que isso vai beneficiar o trabalhador?”

– E qual é o produto potencial? 3,5%?

– Colocamos no PAC e se revelou correto: média de 5% de crescimento de 2007 a 2010. E é um crescimento com crédito, melhor distribuição de renda, inclusão das pessoas. Agora, é manter as conquistas e avançar mais na área da saúde pública universal, da tecnologia, do ambiente. A questão ambiental vai dominar a pauta da política econômica.

– O governo não descuidou da questão ambiental em favor do crescimento?

– Discordo. As obras do PAC passam por rigoroso processo de análise, modificações e licença ambiental. Belo Monte é um exemplo. Não haverá outra Itaipu, Tucuruí ou Balbina.

– Você estará no governo até 31 de dezembro. E depois?

– Vamos ver quando chegar o 1º de janeiro. Em outubro, o povo vai eleger o novo governo. Especular agora é inadequado e pretensioso……………………

Luis Nassif

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  1. Todo o poder ao Povo
     
    Todos

    Todo o poder ao Povo

     

    Todos os brasileiros e brasileiros tem direito a um sistema político que lhes garanta representação e participação e que assegure, de fato, que demandas, desejos e problemas sejam tratados conforme as reais vontade e necessidade
    da maioria.
    Hoje, não é assim. Por isso, os movimentos sociais produziram esta publicação que tem o objetivo de informar e multiplicar a informação sobre a importância de uma reforma política no Brasil.

     

    Uma mudança que avance além do sistema eleitoral e crie mecanismos para dar para dar ao povo condições de protagonizar efetivamente nas decisões do País.
    para atingir esse objetivo, defendemos um instrumento fundamental que assegure aos próprios cidadãos a possibilidade de convocar plebiscitos e referendos- algo que hoje somente o Congresso Nacional pode fazer.

                    A partir de um Plebiscito Popular, o povo dirá sim ou não a uma Constituinte Exclusiva e Soberana composta por cidadãos e Cidadãs eleitos/as exclusivamente para mudar o sistema político, e não pelo Congresso Nacional.

    Em setembro de 2013, a Plenária Nacional dos Movimentos Sociais aprovou a realização de um Plebiscito Popular pela Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político. A Plenária também definiu a pergunta será única: “Você é a favor de uma Constituinte Exclusiva e Soberana sobre o sistema político?”.

    Até lá, temos muito trabalho pela frente. Por isso, nas páginas a seguir falamos como poderemos fazer essa luta que contribuirá decisivamente para a democratização do Brasil.

    Que  venham os novos tempos de esperança.
    Que venham mais mudanças e que jamais cessem
    Que venham os meninos frutos do novo.
    Que venha as crianças, e cresçam fortes e sadias que sorriam
    que floresçam pois foram semeadas.
    Que fique no passado distante o vazio que dói, que corrói.
    Que fique no passado, e pra sempre, a fome  real e brutal,
    que agride, a miséria que impera.
    Que fique no passado os nobres que não sabem dividir,
    a minoria que pisa e desdenha.

    Que  Venha o horizonte que  mostra caminhos.
    Que venha o futuro por que ele é um rio que segue sempre em frente.
    Que venha mais e mais e novos desafios.
    Que venham mares que venham ares
    Que venha  terra pra cultivo, pra abrigo,
    Pra se dividir, pois somos todos, somos mistos, somos negros, somos índios sim,
    somos pardos, vermelhos,
    verdes, azuis, brancos, amarelos, arco íris.
    Que fique no passado distante as agressões físicas e da alma.
    Que sejam substituídas por carícias, por afago e zelo.
    Que fique longe, bem longe o desrespeito e o descaso aos nossos velhos e anciãos.
    Que venham os jovens ávidos do saber, do prazer, da labuta.
    Que venham eles, fortes, presentes e que fazem o futuro.
    Que fique para a trás a descrença, porque aqui já  se fez luz.
    Nós somos o combustível que s e mistura com o bem estar,
    Que venha você brasileiro, gentil, generoso.
    Que venha você brasileira, mulher guerreira.
    Que venham vocês que mudam destinos, que curam as feridas,
    Que venham todos, certeiros porque aqui  temos um coração,
    um coração de pai, de mãe e de irmão,
    Um coração valente.

                            que temos orgulho de ser….

    https://www.facebook.com/video.php?v=776449525741974

     

     

     

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