Os objetivos por trás da reorganização do ensino paulista

Enviado por Leo V

Do Passa Palavra

Mas afinal, qual é o objetivo por trás da “reorganização”?
 
Só a reorganização da educação em São Paulo pode afetar 3 milhões de pessoas. Por isso faz-se necessário mais uma vez, ousar lutar, ousar vencer. Por Alex Buzeli

Ao promover a primeira separação entre crianças e adolescentes nas escolas nos anos 90, o PSDB visava, principalmente, separar os professores. Normalmente, não como regra absoluta, mas como tendência, os professores do Ensino Fundamental II e Médio são os que mais puxam as greves e manifestações. Os professores do Ensino Fundamental I, os que trabalham com as crianças, possuem receio maior em participar das greves e mobilizações. Ao separar os professores do Fundamental II e Médio do Fundamental I, o PSDB acabou minando uma das principais bandeiras dos professores para pressionar o governo nas suas lutas, uma vez que as crianças não tinham suas aulas afetadas como nas greves anteriores a sociedade deixou de se mobilizar com intensidade em apoio aos professores tornando a greve, cada vez mais, um problema supostamente de professores e não da defesa da educação de qualidade, algo que envolve toda a sociedade.

 

Essa mudança agora vai pelo mesmo caminho, afetando o potencial mobilizador dos alunos. As manifestações de junho de 2013 mostraram ao país o potencial de luta de uma juventude que não aceita, por ineficazes, os canais tradicionais de negociação e controle de mobilizações. Ao separar o Ensino Médio o governo pretende, entre outros fatores que veremos, impedir a “contaminação” das lutas desenvolvidas pelos estudantes mais velhos para que essas não alcancem os estudantes do Fundamental I. A velha e tão conhecida tática maquiavélica: dividir para governar.

Outro problema efetivo diz respeito à falta de professores e à quantidade absurda de professores contratados de forma precária, sem direitos e com muitas obrigações. Não é segredo que os baixos salários, a violência e as péssimas condições de trabalho em geral, afastam grande quantidade de professores cotidianamente das salas de aula. O afastamento vem por meio de exonerações com profissionais saindo em debandada da área da educação e por meios de doenças profissionais agudas que afastam professores por problemas médicos. Com isso forma-se um déficit permanente no número de professores na rede. Esse déficit era resolvido pelo governo com o artifício de contratar professores sem vínculo efetivo com o Estado, mais de 50% dos professores de São Paulo trabalhavam sob esse regime. A justiça, que quase nunca defende os serviços públicos, pressionou o governador, vendo o absurdo da situação, a realizar mais concursos visando a alteração desse quadro. O governador não estava disposto a cumprir, mais uma vez, os ditames da justiça, com isso, sorrateiramente, começou a implantar com maior intensidade seu plano de enxugar a educação pública, sobrecarregando os profissionais já vinculados a rede.

Por um lado, as municipalizações das escolas de Ensino Fundamental I tiraram do Estado muitas escolas e professores, por outro lado, as salas de aulas estão cada vez mais superlotadas com o fechamento de muitas salas; só em 2015 foram 1.400. No lugar de contratar outro professor, ocorre a diminuição de uma sala. A matemática do governo é irrefutável, coloca-se onde tinha um estudante mais um, assim um professor a menos é necessário, desta forma o governo não é obrigado a contratar mais profissionais, não tem aumento de gastos e está tudo resolvido. E a qualidade da educação? Essa é a que menos importa para o governo.

A reorganização na vida dos docentes

Em setembro de 2015 o governador Geraldo Alckmin anunciou a decisão de promover um processo de reorganização da rede pública de ensino do Estado de São Paulo. O processo afetará 1.464 escolas de 162 municípios diretamente. Serão fechadas 92 escolas uma vez que o processo de lutas contra a reorganização já conseguiu reverter o fechamento de duas unidades. A justificativa do governo, como a praticamente 20 anos atrás no mandato de Mário Covas, também do PSDB, é a segmentação das escolas de acordo com a faixa etária, uma retomada do slogan que ajudou a causar o primeiro grande impacto na educação pública paulista “crianças e adolescentes em escolas diferentes”. Desta forma o Ciclo 1, o Ciclo 2, do ensino fundamental, e o Ensino Médio ficarão em escolas diferentes.

 

Mais de 74 mil professores serão afetados pela reorganização nas 1.464 escolas. Esse número representa 30% dos profissionais da rede. O decreto 61.466, aprovado após a divulgação da “reorganização” da rede, impediu a efetivação de professores aprovados no último concurso e proibiu a renovação de contratos afetando ainda mais a rede.

O que vai ocorrer com os professores das escolas fechadas? Irão para escolas mais próximas. Qual o problema disso? Ou eles vão tomar o lugar de professores que já estão nessas escolas ou não vai sobrar aulas pra eles, que terão que procurar outra escola. Ou seja, uma escola fechada afeta, indiretamente, muitas outras. O mesmo ocorre com as escolas que terão modificação de ciclos. Os professores de ensino médio, por exemplo, de uma escola que vai fechar essa modalidade de ensino, vão ter que procurar outra unidade provocando efeito cascata, potencialmente, em toda a rede. Verdadeiro caos instaurado na educação. Todo aquele papo pedagógico do professor acompanhar os alunos pelas séries, criar vínculos pessoais e até afetivos para facilitar o processo de ensino e aprendizagem, para saber o potencial e dificuldades dos alunos sem ter que recomeçar do zero sempre vai para o espaço. Nenhuma preocupação pedagógica importa ao governador, somente o corte de gastos sociais.

O objetivo oculto do governo

Goiás está demonstrando o caminho que possivelmente o governo do PSDB vai buscar no estado. Lá já estão passando 25% da rede para Organizações Sociais, a famosa OS, “administrar”, um eufemismo para “eu dou dinheiro público para vocês se enriquecerem privadamente sob o discurso que vocês são mais eficientes que o Estado”. O caso da Santa Casa de São Paulo é exemplar. O governo passou milhões de reais para a Santa Casa, o dinheiro foi descaradamente “desviado”, o governo continua a repassar a verba, o atendimento continua indo de mal a pior, o hospital demitiu milhares de profissionais entre médicos, enfermeiros e demais profissões auxiliares, e o hospital permanece sendo administrado por uma OS.

 

Ou então, o outro caminho explicitado por Goiás, porém já existente em São Paulo. O último objetivo do governo do estado é a educação. O primeiro é deixar os alunos nas escolas para impedir que os mesmos “aprontem” fora da escola. A escola para os governos tornou-se um objetivo de segurança pública, se for escola de tempo integral é melhor ainda, pois os alunos ficam mais tempo “presos” na escola. É triste dizer, mas a escola funciona, hoje, como uma espécie de cadeia não oficial em que o primeiro objetivo é manter os alunos “presos” na escola e o último é ensinar, educar. Assim como ocorre no presídio, o detento está preso, a educação lá funciona para a redução de pena; na escola funciona como paliativo, outra espécie de redução de pena, uma vez que, para o aluno, estar nesse modelo de escola é uma espécie de pena, para o professor seu trabalho assemelha-se cada vez mais ao do carcereiro e cada vez mais frequentemente explodem “rebeliões” dos alunos contra os que eles identificam como seus algozes, os “carcereiros”- professores. E por que Goiás demonstra explicitamente o caminho que a educação tomou em São Paulo? Lá teve início o processo de militarização de algumas escolas, nada mais claro para demonstrar a preocupação policialesca com a educação. Ou seja, a educação como política de segurança pública.

A repressão não é apenas velada é direta

O governo demonstra, cada vez mais, sua face truculenta. Todos os que ousam se opor às medidas do governador são presos por desacato ou qualquer outro argumento, são atingidos por bombas de gás, por sprays de pimenta, ou, se moram na periferia, são mortos por grupos de extermínio que possuem ligações com a Polícia Militar de acordo com anúncios, pasmem, do próprio governo.

O governo utiliza também o poder judiciário para atingir manifestantes. O judiciário estabeleceu multa de 100 mil reais ao sindicato dos professores, por dia, caso esses ocupem diretoria de ensino ou escolas. Além disso, esse poder, que deveria ser independente do estado, mas em São Paulo passa longe disso, vira e mexe estabelece critérios de perseguição legal aos manifestantes, como fez, por exemplo, contra os participantes das manifestações de 2013.

Nesse momento de ataques frontais e maciços contra os direitos históricos conquistados, com luta, pelos trabalhadores e seus filhos, a necessidade de organização e resistência é cada vez mais presente. Cada derrota pode demorar décadas para ser revertida. Da urgência de estarmos nas ruas depende a vida de milhões de pessoas. Só a reorganização da educação em São Paulo pode afetar 3 milhões de pessoas. Por isso faz-se necessário mais uma vez, ousar lutar, ousar vencer.

Redação

20 Comentários

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  1. Reorganização

    A forma como a Secretaria está fazendo a reorganização é absolutamente desastrosa, mas os argumentos desse artigo não tem nem pé nem cabeça. 

    “Ao promover a primeira separação entre crianças e adolescentes nas escolas nos anos 90, o PSDB visava, principalmente, separar os professores.”

    De onde tiraram isso?!!!. 

    1. E de onde vc tirou que nao?

      Vc é um dos maiores defensores de métodos “pedagógicos” de organizaçoes particulares (como o infame método fônico de alfabetizaçao) aqui no Blog. Está interessado nessa terceirizaçao da educaçao paulista que o texto denuncia?

      1. Às vezes eu acho que tem

        Às vezes eu acho que tem gente que, ou é boba; ou quer se fazer passar por tal. Rsrsrsrsrsrs

        Em resumo: Em 1950 a UDN, com “ajeitamentos” do padre e do juiz, udenistas, passou o rodo na Prefeitura da minha cidade que era muito menor do que é hoje. A primeira atitude do prefeito? Privatizou o único posto de saúde que existia, criando o que hoje se chama de ONG. Foram treze anos de serviços ultra-precários, até chegar uma instituição do Ministério da Saúde, a FSESP. E que porcaria é o PSDB senão uma neo-UDN?

    2. Faz todo o sentido. Como está

      Faz todo o sentido. Como está explicado no artigo (leia com atenção), ao separar Fundamental I do resto o governo separa os professores que costumam fazer greve daquels que em geral são menos predispostos à greve, assim as escolas Fundamental I continuam funcionando durante uma greve de professores.

      Simples assim. Ou precisa desenhar?

  2. Quem tem filhos no ensino

    Quem tem filhos no ensino público, sabe muito bem que continua o tal, finjo que dou aula e voce aluno, finge que aprendeu. Quantos dias de greve ??

  3. fechamento de escolas
    Precisamos também denunciar o fechamento do período noturno em várias escolas.
    Na diretoria de ensino Leste 3 o governo pretende fechar o noturno de 9 escolas, na Leste 2 de 19 escolas e em Guarulhos 33 escolas.
    Vai muito mais além do que as 94 anunciadas e caso se concretize será um duro ataque aos estudantes trabalhadores e também aos que pretendem voltar aos estudos na modalidade EJA.

  4. Todo castigo pra CORNO e pra

    Todo castigo pra CORNO e pra quem vota em TUCANO, é POUCO…

    São Paulo merece passar por uns perrengues para ver se acorda de vez ou afunda irremediavelmente.

    Estamos nas mãos de tucanos desde o governo Montoro e a coisa só piora em todas as áreas, seja em relação a educação, ao transporte público, à gestão da água, à cobrança escorchante dos pedágios paulistas e por aí vai.

    Esse pulhas emplumados não ascenderam ao poder magicamente.

    Alguém os colocou lá e esse alguém é justamente os que mais sofrem com todas estas mazelas.

    Se tenho dó?

    NÃO.

    Plantaram e agora está na hora da colheita maldita…

    1. Releia os dois primeiros

      Releia os dois primeiros parágrafos.

      Só neles contem algo que vai bem além de corte de gastos. Trata-se de forma de quebrar o poder associativo dos trabalhadores e alunos.

  5. Só um povo muito, muito, muito ignorante

     lê a veja, assiste a globo e vota insistentemente num governador ruim como o de São Paulo, por isso é fundamental se combater a educação.

  6. E esses caras ainda querem

    E esses caras ainda querem governar uma nação de 202 milhões de habitantes.

    Essa turma está completamente fora da realidade.

  7. Educação! Pra que?

    Todas as escolas municipais, estaduais e federais deveriam ser de tempo integral. Me parece ser a única maneira de se diminuir o tempo ocioso de nossas crianças e jovens. A grande maioria dos pais e/ou responsáveis não se preocupam se as crianças e/ou jovens estão ou não aprendendo, o que eles desejam é um local para deixarem as crianças e/ou jovens para poderem trabalhar sem a preocupação de “onde ou com quem estará meu filho agora”. Para essa grande maioria de pais a escola não passa de um “guarda volumes”. Outra coisa, eles, os pais, odeiam as greves de professores porque ficam sem ter onde deixarem suas “malas” durante parte do dia.

  8. Um detalhe escapou ao autor

    Um detalhe escapou ao autor (e provavelmente ao governador tucano): separar estudantes em escolas de acordo com o ciclo que cursam, somente pelo que foi visto nas manifestações de 2013 tem efeito nulo. Ou se esqueceram do uso massivo de redes sociais? Por bem ou por mal, hoje em dia é muito dificil ocultar informações. A tática utilizada nos anos 1990 foi bem sucedida naquele momento, mas não significa que o exito se repetirá (pessoalmente acho dificil). E não esqueçamos que os tucanos não são os mesmo do passado – o Nassif está aí para demonstrar isso. Afinal de contas, são de uma incompetência inacreditável, abaixo do nível crítico. Relembremos postagem de meses atrás do André Araujo – O secretariado de zés ninguéns do Alckimin. À conferir…

  9. Cê tá brincando …

    Repassar a rede de ensino para as OS? Alguem me corrija se eu estiver errada. Isso contraria a LDB e toda legislação educacional, incluindo a legislação do FUNDEB. O saco de maldades do PSDB  parece que não tem fundo … É inacreditável.

  10. A alegação de que há salas

    A alegação de que há salas ociosas faz parte da criação do círculo viciado : Piora-se o ensino público, afastando-se os que, mesmo com sacrifícios, vão para o ensino privado. Forma-se mais ociosidade. Fecham-se mais salas. Até ficar o ensino público redzido ao ensino fundamental bancado pelas prefeituras. O estado assim vai empurrando os alunos do ensino médio para as escolas particulares ficando com algumas poucas escolas. SE não me engano fizeram coisa semelhante com as ETEs.

  11. Em BH, ppp está fazendo 51 escolas

    O  prefeito Marcio Lacerda fez parceria público-privada para “privatizar” 51 escolas, sendo 46 de Educação Infantil e 5 de Ensino Médio. Por enquanto. 

    Com isto,  a prefeitura fica livre de lidar com pessoal de escolas – e lidar com eles é o que menos Marcio Lacerda  quer, na vida. Mas não é só ML, não. O Estado de Minas, pelo menos na gestão Aécio, já estava terceirizando até presídio, via PPP. 

    http://odebrecht.com/pt-br/comunicacao/releases/parceria-publico-privada-na-educacao-em-belo-horizonte-e-ampliada-para-mais-14

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