O mito das redações independentes, por Luciano Martins Costa

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
[email protected]

do Observatório da Imprensa

DISCURSO HOMOGÊNEO

O mito das redações independentes

Por Luciano Martins Costa

Uma das características mais representativas da imprensa brasileira na última década tem sido a homogeneidade dos pontos de vista que expõe claramente em seu conteúdo ou deixa implícitos na hierarquia de suas escolhas editoriais. A rigor, não há concorrência entre os grandes jornais de circulação nacional – e a liderança do Grupo Globo sobre as outras redes de televisão é aceita passivamente pelo setor, desde que sobrem fatias consistentes do bolo publicitário para todas elas.

Esse é um retrato básico do sistema da mídia, que serve para ilustrar como certas edições parecem ter sido planejadas numa única redação – e como expressões e mantras utilizados para defender determinados pontos de vista, criados por um colunista de um jornal, são imediatamente adotados por articulistas de outro jornal.

A homogeneidade do discurso, exercitada ao longo dos anos, faz com que as narrativas se tornem muito assemelhadas, e é isso que faz da imprensa brasileira uma força política considerável. Esse sistema precisa encontrar repercussão nas instituições e na sociedade – condição indispensável para manter seu valor percebido –, mas também necessita ser alimentado por verbas publicitárias para custear seu funcionamento.

A influência da mídia tradicional nas instituições vem sendo demonstrada há muito tempo e se reflete na manutenção de um estado permanente de crise no campo da política e de um viés sempre pessimista quanto à situação econômica do país. Sua influência direta sobre a sociedade, porém, foi colocada em dúvida no final do ano passado, quando a imprensa perdeu a eleição presidencial.

Por isso, as manifestações do domingo (15/3) precisam ser capitalizadas ao extremo pelos editores: elas consolidam o apoio de grande parcela das classes médias urbanas ao projeto de poder que move a imprensa.

O noticiário intenso sobre supostas consequências dos protestos, como uma improvável reforma ministerial, torna mais denso o protagonismo daqueles que foram às ruas tentar inverter o resultado da eleição de 2014. A pesquisa oportunista do Datafolha sobre a queda na aprovação da presidente da República (ver aqui), apresentada sem referência ao contexto que definiu as opiniões, tem esse propósito.

O discurso em cima do muro

Essa oportunidade de consolidar sua influência sobre parte da sociedade explica o grande interesse da mídia em fazer barulho em torno de um relatório não oficial sobre a política de comunicação do governo federal e, de certa forma, ajuda a entender o estremecimento causado pela demissão do executivo que durante doze anos comandou a área de comunicação da Petrobras.

As grandes empresas de mídia temem que a demissão do gerente da estatal, Wilson Santarosa, e uma possível substituição do chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Thomas Traumann, venham a produzir uma redução nos gastos com publicidade do Executivo e da Petrobras. Então, temos o cenário estranho no qual a imprensa agride continuamente o governo enquanto os responsáveis pela comunicação oficial, tanto no Planalto quanto na Petrobras, despejam rios de dinheiro em anúncios de duvidosa eficiência na mídia tradicional e patrocinam comédias de alto custo e baixa qualidade no principal grupo de comunicação do país.

Enquanto isso, o interessante projeto dos coletivos de cultura e a proposta de fortalecer as iniciativas de mídia regional e comunitária ficam às moscas.

Na sexta-feira (20/3), curiosamente, há uma ruptura na homogeneidade das escolhas editoriais dos principais diários. O Estado de S.Paulo e a Folha de S.Paulo noticiam que a presidente Dilma Rousseff não vai fazer uma reforma ministerial, enquanto o Globo aposta na manchete: “Pressionada, Dilma fará mudanças no Ministério”. Essa suposta divergência, porém, não esconde o propósito das duas abordagens diferentes, que é provocar uma mudança na composição e na orientação do governo.

O projeto de poder apoiado pela mídia tradicional foi derrotado nas urnas, mas seus operadores não consideram que a eleição acabou. A imprensa brasileira não é uma instituição democrática e tampouco atua como um contrapoder dedicado a questionar o Estado, como defendem alguns. O sistema da mídia poderia ser esse contrapoder democrático, mas se comporta como uma instância na disputa direta do poder, que utiliza o jornalismo como instrumento de pressão.

O mito das “redações independentes” é apenas uma justificativa moral para discursos proferidos de cima do muro.

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

5 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Mito?

    Peço desculpa ao autor do artigo, mas que conversa de mito é essa? Isto é banditismo aberto e declarado. É um projeto de oposição ao governo, à petrobrás, e ousaria dizer ao país. Servilhismo dos jornalistas. Feito e articulado nas redações. O que estes caras “das redações” copiantes fazem, se deixando levar como ingênuos carneirinhos é degradante.

    Que jornalista, uma classe tão informada, não sabe que se está desinformando, falseando dados e fatos. O foto shop na fotografia do richa com um bandido, excelente exemplo, só é possível porque sabem que contam com os “jornalistas” que existem por aí. É grotesco e bandido. Nada de mito.

  2. A julgar pelo comportamento

    A julgar pelo comportamento da imprensa (incentivo à Marcha as Famiglias mafiosas, desdém pela soberania do povo que elegeu Dilma Rousseff, envio de dinheiro sujo para o HSBC-Suíça e proteção irrestrita e irritante da quadrilha tucana desde os tempos de FHC, ataques sistemáticos ao PT por causa do Enem, Cotas, Mais Médicos, etc…) cheguei à conclusão que a única liberdade que os jornalistas brasileiros merecem é aquela que os milicos deram para eles durante a Ditadura Militar. Simples assim. E olhe que não morro de amores pela Ditadura, pois minha casa foi invadida a chutes várias vezes em 1967, quando eu tinha 3 anos de idade, porque meu pai era comunista. Estes caras não fazem nem jornalismo, nem política. O que eles fazem é merdalismo e despolitizar o povo. 

  3. No fundo, os gringos estão

    No fundo, os gringos estão fazendo a mesma coisa que os portugueses fizeram. Quando cá chegaram, nossos antepassados trocavam bugigangas (espelhos, colares, facas, facões e machados) por terras e trabalho no corte de pau-brasil. O lucro da exploração do pau-brasil era fabuloso, pois naquele tempo o corante vermelho só era produzido numa ilha do mediterrâneo a partir de um crustáceo. O tecido tingido de vermelho em Portugal custava uma fortuna, mesmo sendo mais barato que o produzido pelos concorrentes. É óbvio que os portugueses não dividiram os lucros com os índios. Os norte-americanos sabem que há um imenso pote de ouro negro em nosso litoral. Em razão disto eles dão uns trocados para os neo-índios (jornalistas incluídos) derrubarem o governo. O que são alguns milhões de dólares jogados fora quando muitos bilhões de dólares estão em jogo?

  4. Os chefões da grande mídia brasileira

    Os chefões da grande mídia brasileira só têm compromisso com os grandes rentistas e com seus fabulosos lucros. Imbecilizam o povo em seu favor depois o abandona no mato sem cachorro. Eles não admitem que o povo tenha alguma chance, não suportam esta história de Brasil para os brasileiros, de um retirante nordestino está no lugar de um deles, de uma mulher séria e honesta realizar obras que eles jamais realizariam em todas as frentes: habitação, usinas, refinarias, estradas, eclusas, portos, aeroportos, arenas, universidades, creches, escolas técnicas, água para todos, luz para todos, RBT, VLT,metrôs, ferrovias, transposições, bibliotecas virtuais ,, ginásios poesportivos, centros de referências sociais, UPAS, unidades básicas de saúde em todos os bairros das cidades do país, Pronatec, ciências sem fronteira, mais médicos, 50 mil professores doutourados em matematica, física, química e bilogia …. quem tem olhos, veja ! quem tem ouvidos, ouça !

  5. Pessoal,
    Segue apenas um

    Pessoal,

    Segue apenas um trecho (pág. 44) do livro “Padrões de manipulação na grande imprensa”, publicado em janeiro 2003 e de autoria do saudoso Perseu Abramo:

    “Assim, é sustentável a afirmação – pelo menos em caráter de hipótese de trabalho – de que os órgãos de comunicação se transformaram em novos órgãos de poder, em órgãos político-partidários, e é por isso que eles precisam recriar a realidade onde exercer esse poder, e para recriar a realidade precisam manipular as informações. A manipulação, assim, torna-se uma necessidade da empresa de comunicação, mas, como a empresa não foi criada nem organizada para exercer diaretamente o poder, ela procura transformar-se em partido político. Aliás, os grandes e modernos órgãos de comunicação, no Brasil, parecem-se efetivamente muito com partidos políticos”.

    Notem que essa publicação é de janeiro de 2003, quando o Lula mal tinha sentado na cadeira de presidente. Imaginem se fosse escrito agora, 12 anos depois do PT chegar ao poder.   

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador