Tanto Lula quanto FHC devem explicações, por Helena Chagas

Do Fato Online

Helena Chagas: Lula e FHC, FHC e Lula

“O fato de Fernando Henrique ter que se explicar não exime Lula de fazer o mesmo. Os dois devem respostas, e nenhum deles, por maior que seja, está acima dessa obrigação. A sujeira do roto não conserta os panos do esfarrapado”
 
Era 10 de dezembro de 2013, e os ex-presidentes Lula, Fernando Henrique, José Sarney e Fernando Collor acompanhavam a cerimônia dos funerais de Nelson Mandela no estádio FNB de Soweto, Johanesburgo, na tribuna para convidados (Dilma estava em outro local com os chefes de Estado). O áudio era péssimo e não se entendia nada do inglês enrolado do locutor. “Só o Lula entende esse inglês”, brincou FHC. Na fila de trás, ou Lula não ouviu ou se fez de desentendido. O troco veio quando o presidente sul-africano, Jacob Zuma, foi falar e recebeu sonora vaia do público. “Uma das maiores vaias que ouvi na vida foi para o Fernando Henrique, quando ele era candidato a senador em São Paulo”, contou Lula, sentado ao lado de Sarney. Fernando Henrique fez que não ouviu.

É assim, como gato-e-rato, cheia de implicância, ciúmes, vaidades, rivalidades, mas também proximidade quando necessária, a relação entre os dois mais importantes presidentes brasileiros da era pós-ditadura. As cutucadas dos dois dias em que ficaram grudados durante a viagem não impediu o petista e o tucano de, na volta, partilharem sozinhos a madrugada no jatinho da FAB que os levou de Brasília e São Paulo.

 A história fará justiça a Lula e a Fernando Henrique, com seus legados e pecados, mas certamente reconhecendo que foram ambos as faces de uma mesma e valiosa moeda no Brasil da redemocratização: a estabilidade da economia conquistada pelo tucano e a distribuição de renda que emancipou e deu cidadania de verdade a milhões de brasileiros, realização do petista.

 Na atual conjuntura, os dois são como água e azeite, sol e chuva, Fla X Flu, adversários porque símbolos e chefes de torcida dos dois maiores projetos de poder em disputa no país. Mais ainda, estão ambos agora sob intenso tiroteio, no centro de constrangedores escândalos a cobrar respostas e explicações.

São, na verdade, situações bastante diferentes, mas que envolvem vida privada e acusações de promiscuidade com empresas – no caso de Lula, supostamente usadas para patrocinar reformas e outros favores, no de FHC relacionadas a supostos pagamentos no exterior a uma ex-namorada para sustentar um filho.

É por aí que o clima de fofocas e baixarias que sempre cerca revelações públicas de ex-amantes vem apimentando as conversas em Brasília, onde a pergunta que não quer calar hoje é se o fato de Fernando Henrique ter se enrolado nesse tipo de acusação terá o poder de aliviar as coisas para Lula, na linha de uma Lei de Talião moderna: olho por olha, dente por dente, acusação por acusação…

Não por outra razão, a blogosfera petista vem festejando as entrevistas da jornalista Mirian Dutra, que a cada dia acrescenta alguma coisa a seu relato. De fato, o PT ganhou discurso para defender Lula atacando FHC nos embates belicosos e permanentes da Internet.

Os petistas estão vibrando também por ver que a grande mídia – a quem sempre acusou de tucana – foi obrigada a noticiar as acusações contra Fernando Henrique. É certo que, em alguns desses setores, o constrangimento é imenso, e não há como negar que boa parte deles usa pesos e medidas diferentes quando se trata de Lula e de Fernando Henrique. Mas é bom lembrar que as declarações de Mirian Dutra só tomaram contornos de denúncia na Folha de S.Paulo, que seguiu a pauta da revista digital Brazil com Z e noticiou o contrato supostamente fictício da jornalista com a Brasif.

E ainda que setores da grande imprensa queiram sair de fininho do assunto, não vai ser muito fácil. Os “grilos falantes” da web continuam em ação e, ainda que descontados os radicais à esquerda e à direita, podem desmoralizar veículos impressos ou televisivos que insistirem em brigar com a notícia – desde que haja notícia, é claro. A mídia tradicional não anda assim tão bem das pernas para correr o risco de ser acusada de esconder escândalos que não considera agradáveis e ver tudo publicado na Internet.

Estão, portanto, felizes e satisfeitos os que acreditam que vão resolver um problema político ao colocar Lula e Fernando Henrique na mesma panela, ou melhor, no mesmo patamar moral, policial ou seja lá o que for.  

Só que pode não ser bem assim. É um engano alguém acreditar que, ao expor as mazelas do adversário, estará escondendo as suas. O fato de Fernando Henrique ter que se explicar não exime Lula de fazer o mesmo. Aos olhos da opinião pública, os dois devem respostas, e nenhum deles, por maior que seja, está acima dessa obrigação. A sujeira do roto não conserta os panos do esfarrapado.

A esta altura do campeonato, o risco maior para os dois principais projetos de poder em disputa no país é que o distinto público, cansado de ver tanta coisa ruim, vá em busca de um terceiro. E ache.

 

Redação

42 Comentários

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  1. Ia tudo muito bem….

    Até aqui:

     

    “A história fará justiça a Lula e a Fernando Henrique, com seus legados e pecados, mas certamente reconhecendo que foram ambos as faces de uma mesma e valiosa moeda no Brasil da redemocratização: a estabilidade da economia conquistada pelo tucano e a distribuição de renda que emancipou e deu cidadania de verdade a milhões de brasileiros, realização do petista.”

     

    Daí eu parei de ler por amor e respeito ao meu aparelho digestivo.

  2. patética

    Helena, menina ixperta faça as perguntar para os dois e veja as respostas.

    Esta é a fala primária e precária do pig e associados, são todos iguais isto claro quando dos meus protegidos não consigo mais varrer por debaixo do pano as fabulosas c@&%#as.

  3. Realmente é tudo igual. Um

    Realmente é tudo igual. Um falcatrua para ajudar a amante no exterior o outro com a ajuda das maiores empreteiras – só com a maior não seria possivel – compra um barco de lata de 4 mil reais. É tudo igual.

  4. Um dos piores erros do grande

    Um dos piores erros do grande Lula foi trazer esta globete para o governo em 2003 (direção da TV Brasil) .

    Globetizinha que só enganou, e continua enganando trouxas .

    Quer dizer que Lula deve explicações sobre a casa que ele não comprou em Guarujá e sobre o sítio que QUE NÃO É DELE, e cujo proprietário já exclamou para deus e o mundo que Lula apenas utilizava eventualmente o imóvel como hóspede .

    É melhor eu parar por aqui para não descrever tudo o que penso sobre esta cambata de jagunços midiáticos .

  5. Materiazinha bem

    Materiazinha bem infantilóide.

    Quer dizer que o Lula tem que explicar um apartamento que não comprou e um sítio que ele “pecou” em frequentar, enquanto FHC (que não corre NENHUM risco de investigação, pois é tucano) é pego com conta no exterior para abastecer amante (caso idêntico ao do Renan Calheiros) e através de uma empresa que ganhou concessão de monopólio sem concorrência durante seu mandato.

    Então tá.

  6. Não explicou nada

    O que o Lula tem que explicar? Ela não o acusou de nada, ao contrario de FHC, este sim, cheio de escândalos escondidos debaixo do tapete. Lula é investigado desde 2003 e qual acusação está escondida sob seu tapete? Está criatura era a responsável pela comunicação do PT? 

    1. É quinta coluna demais para um governo só.

      “Está criatura era a responsável pela comunicação do PT?”

      Para você ver como é que chemos ao ponto ridículo a que chegamos, onde o Lula é tratado como criminoso sem ter feito absolutamente NADA, com escandalizções patéticas de botes de lata, hortas e caixas de cerveja. Já o FHC com uma denúncia direta de corrupção, com a denunciante garantindo ter provas documentais, é solenemente ignorado não só pela imprensa, mas pela polícia, Ministério Público, justiça… TODOS em plena OEPARAÇÃO ABAFA para proteger o tucano corrupto (com o perdão do pleonasmo).

      São figuras como essa “criatura” como você generosamente a denominou (eu falaria coisa muito pior, por isso vou parar por aqui para não ser acusado de misoginia) e aquele saco de estrume que está encostado no Ministério da Justiça. Com “criaturas” como essas no governo, não é de se espantar que a massa coxinhística fique tão assanhada. É quinta coluna demais para um governo só.

       

       

       

  7. Queridinha(o)s do Gov. Dilma: A Crônica de um Desastre Anunciado
    “O fato de Fernando Henrique ter que se explicar não exime Lula de fazer o mesmo.”
    Por que não, o fato de Lula ter que se explicar não exime Fernando Henrique de fazer o mesmo?

    Essa manjada senhora, exerceu por longo tempo o comando da Secom no governo Dilma e é exatamente por infestar os diversos escalões do poder com “pessoas aliadas” como essa, que estamos sendo, há uma década ou mais, atacados seletivamente, sem defesa, pois as linhas que deveriam tecer, fortalecer e ajudar a viabilizar essa defesa com eficiência, sempre foi corrompida e jogou contra, por conter na realidade simpatizantes, quando não aliados de primeira hora, do status quo inimigo.

    O resto é conversa mole jogada fora, não ministro da justiça, covardia e notinhas “enérgicas”, de Rui Falcão, à imprensa.

  8. Certo. Mas refresque nossa

    Certo. Mas refresque nossa memória. O Lula teria o que mesmo a explicar, tendo em vista que não tem contas no exterior, nem empresas que paguem sua Pensão Alimentícia em dólares?

    Cara HC, é óbvio que existe, entre os dois ex-presidentes, uma desproporção gritante de tratamento, Bem como de “culpas” que lhes são atribuídas.

    Basta verificar qual é o ex-presidente que tem uma ilha no Maranhão e canais de TV (Sarney); O que tem carros ostentação na garagem e jornal/rádio/TV (Collor); e o mais rico de todos, que tem apês em Paris, São Conrado (RJ), Higienópolis (SP), além de fazenda em MG e uma misteriosa em Osasco, e o patrimônio de seus familiares, que jamais bateram um prego em uma barra de sabão. Sem contar os milhares de dólares empregados no caso Chifregate.

  9. HC sempre em cima do muro.

    HC sempre em cima do muro. Como se a mídia tratasse os dois casos com a mesma medida. Se o Lula, que não tem absolutamente nada comprovado contra ele, fosse o suspeito de sustentar uma amante no exterior com um contrato fictício, de uma empresa contratada por seu governo, imagine, apenas imagine, o pandemônio em que estaríamos agora.

    Não sei por que ainda perco meu tempo lendo isso.

  10. Fhc só foi importante para a

    Fhc só foi importante para a meia duzia que enriqueceu e mamou nas tetas em seu governo, para o povo brasileiro não teve relevancia nenhuma, sofremos com desemprego, arrocho salarial e inflação galopante, um desastre.

  11. Concordo com o post-título

    mas a Irmandade não admite um pingo, uma vírgula sequer !…

    (Isso não quer dizer que vejo como culpa formada – mas a galera vai ver, no mínimo chamar este seu criado de coxinha, ou nada)

  12. Discordo
    Discordo de Helena Chagas. A “grande midia” mais conhecida neste blog por PIG não está noticiando o escandalo FHC-Miriam.
    È só ver os jornaloes e trio “revista-lixo semanal”

    Estava esperando que fosse materia de capa.
    Ledo engano!

    (PS, na verdade nunca esperei por isso)

  13. Eis a pedra de toque da sutileza: ffhhcc é igual a Lula.

    Falta cultura política e conhecimento a jornalista Helena Chagas. Mas acalmem-se: Não é correto exigir dela tal qualidade. Aliás, cada vez mais rara na profissão (?) de jornalista.

    Uma olhada no retrospecto econômico do capitalismo mundial coloca as coisas no seu devido lugar, e nem vou exigir dela, novamente, que tenha lido “O Velho” ou outro economista ou cientista social/político mais honesto.

    Também são raros os espécimes da área de humanas nesses tempos bicudos onde stf rasga constituição, juiz legisla e sequestra mandatos, e o meio é mais importante que a mensagem.

    Pobre Helena…

    A estabilização econômica não foi obra do ffhhc. Foi só um ajuste derivado das teses da Escola de Chicago, frente a explosão das dívidas públicas pós choque do petróleo e expansão do crédito na década de 70, no movimento de retração que enxugou a liquidez (excessiva e inflacionária) das economias periféricas para garantir o pagamento dos papagaios, e de quebra, entregar enormes patrimônios estatais com a seguinte “lógica”: Os credores endividaram os países para a expansão do parque logístico/infra-estrutura/bens de capitais, setor primário, etc, e quando o rombo da conta chegou a níveis insustentáveis (pelas flutuações ditadas pelos credores), sem que as emissões dessem conta de tapar o buraco, ops credores puxaram as cordas e tomaram esse patrimônio estatal a preço de banana, e pasmem: Com financiamento do restinho de dinheiro público que restava no caixa.

    Resultado: Depois de uma retraçõa brutal que encolheu salários (minimos) a menos de U$ 70, e juros que passaram a casa de duas dezenas, com apreciação artificial da moeda e desmonte da indústria, em 2002 tínhamos U$ 17 bi de reservas e estávamos à beira do abismo.

    Mas Helena insiste em dizer que tudo foi um sucesso. Bem, depende para quem, é claro.

    Agora coloca Lula e ffhhcc no mesmo saco, partindo de uma “lógica incrível”: Todo mundo deve explicações, não?

    Claro que sim, mas eu pergunto: Antes de explicar, precisa dizer primeiro sobre o quê…

    ffhhcc não deve explicar porque teve um filho que não teve, ou porque exilou a moça. Tem que explicar se usou empresa concessionária (Brasif) para transferência de recursos, e se ofereceu vantagem a essa concessionária pelo favor.

     (que bobagem o sujeito metido a “jênio” fez uma cagada dessas, era só dar o dinheiro a moça do seu bolso diretamente a ela…até D.Ruth sabia, nem ia descer de sua fleuma de intelectual moderna)…

    Assim como tem que explicar se a empregadora da moça teve vantagem por atender o pedido de exílio do ex-presidente.

    Agora vamos a Lula…

    O que tem que explicar Lula mesmo?

    Não sei, são anos e anos de inquéritos, matérias, reportagens, edição de fotos, boatos, delações editadas e duvidosas, delações consideradas para atacá-lo e para isentar adversários, devassa e…nada, absolutamente…nada!

    Nem vamos comparar a crise de 2008 com os soluços espasmódicos do setor financeiro na era ffhhcc, que mesmo assim quebrou o país três vezes, e vivíamos a cheirar o saco do FMI.

    Será que Helena, a Chaga, tem como responder como estaria o país se a crise de hoje fosse levada para 1999? Com certeza estaríamos acendendo fogueira com gravetos e Helena escrevendo na parede da caverna.

  14. Mediocridade

    Essa senhora foi ministra de Dilma, com desempenho medíocre, e agora parece estar cavando emprego na grande mídia. É um artigo para limpar sua barra e dizer “ainda sou a velha Helena, posso ter alguma utilidade”.

    Que tristeza.

     

  15. de chaga em chaga,
    só rindo

    de chaga em chaga,

    só rindo ela dizer que a grsnde mídia está falando

    do escandalo fhc só ´porque um jornal tucano e mediocre

    publicou uma materia muito  envergionhada e mixuruca …

  16. FHC vai entrar pra historia

    FHC vai entrar pra historia como o maior vendilhão do País e um lesa Patria.Enquanto Lula já entrou pra historia como o maior e melhor Presidente que este país já teve.Fique sabendo disso Dona Helena.

  17. Como são sutis os “falsos indignados” !!!!

    Cara Helena, Como assim? O Lula quer se eximir porque FHC está sendo acusado? Que manipulação semiótica é essa? Lula tem sido levado à exaustão nas tentativas de se explicar. Já expôs sua declaração de renda. As pessoas sabemtudo sobre sua vida. Verdades e não verdades. Sabe quem são seus filhos. Suas propriedades. Suas atividades politicas,profissionais e de lazer. Suas relações e amizades. Seus ganhos e despesas. E do FHC o que se sabe? A que FHC tem sido compelido a responder? Quem do MP ou PF pressionou FHC? Que setores do estamento meritocrático estão usando a maquina para pressioná-lo. 

    Pode parar, Helena Chagas…

    A partir de agora quem tem que se explicar é a senhora. Como ministra do governo Dilma produziu um desastre de Comunicação que deixou órfão um dos melhores periodos de governo por absoluto isolamento. Que sentimentos a movia na direção do imobilismo? Será que então a senhora já era movida por essa fé na neutralidade da midia? Esse tipo de gente que acredita que no imparcialidade da nossa imprensa é que vem fazendo o papel semelhante ao que exercia os legalistas nos iniciais da ascensão nazista na velha Alemanha… Fazem cara de paisagem até que a onda os engula, levando de roldão toda sua suposta pureza e neutralidade.

    Horas há em que ser honesto é reconhecer a própria desonestidade…

  18. quanto riso, quanta hipocrisia

    o que essa senhora pensa que somos.

    há quanto tempo o Lula está sendo investigado. seu filho. seus ministros. seus amigos.

    agora quero que ela cite uma investigação contra fhc. ou sua filha que recebia salario do senado sem dar as caras por lá. ou

    seu filho junto com a filha do jorge bornhausen que ganharam uma grana preta montanto uma feira Brasil/Europa na Alemanha.

    quanto cinismo, hipocrisia e falta de carater dessa senhora que se diz jornalista.

    pensar que o PT a agasalhou em seu governo durante tanto tempo.

    assim como o PT poderá  ganhar a guerra das comunicações. quantos quinta colunas o governo petista já teve neste míster de informar. e não aprende.

  19. Caspita!

    Quando ha acusações sobre Lula, todos cobram explicações de Lula, ainda que as acusações sejam vazias, como muitas cabeças por ai. Mas quando ha algo sobre FHC, que pode ser concreto, ai toda a imprensa diz que se FHC deve explicações, Lula também!

  20. Invertebrada

    Essa moça de boba não tem nada, mas se comporta como uma invertebrada.
    Acha que depois de passar uma boa temporada na SECOM , alimentando seus ex-patrões a base de “Mídia Técbnica” para distribuição de polpudas verbas ainda convence os leitores com esse  “texto isento”.
    Recomendo a ela e aos demais leitores do GGN o Texto de Machado de Assis  que segue atualiíssimo em tempos de Lava-Jato

    http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000249.pdf

     SUJE-SE, GORDO!
    UMA NOITE, há muitos anos, passeava eu com um amigo no terraço do Teatro de S. Pedro de Alcântara. Era entre o segundo e o terceiro ato da peça A Sentença ou o Tribunal do Júri. Só me ficou o título, e foi justamente o título que nos levou a falar da instituição e de um fato que nunca mais me esqueceu. — Fui sempre contrário ao júri,– disse-me aquele amigo, não pela instituição em si, que é liberal, mas porque me repugna condenar alguém, e por aquele preceito do Evangelho; “Não queirais julgar para que não sejais julgados”. Não obstante, servi duas vezes. O tribunal era então no antigo Aljube, fim da Rua dos Ourives, princípio da Ladeira da Conceição. Tal era o meu escrúpulo que, salvo dous, absolvi todos os réus. Com efeito, os crimes não me pareceram provados; um ou dous processos eram mal feitos. O primeiro réu que condenei, era um moço limpo, acusado de haver furtado certa quantia, não grande, antes pequena, com falsificação de um papel. Não negou o fato, nem podia fazê-lo, contestou que lhe coubesse a iniciativa ou inspiração do crime. Alguém, que não citava, foi que lhe lembrou esse modo de acudir a uma necessidade urgente; mas Deus, que via os corações, daria ao criminoso verdadeiro o merecido castigo. Disse isso sem ênfase, triste, a palavra surda. os olhos mortos, com tal palidez que metia pena; o promotor público achou nessa mesma cor do gesto a confissão do crime. Ao contrário, o defensor mostrou que o abatimento e a palidez significavam a lástima da inocência caluniada. Poucas vezes terei assistido a debate tão brilhante. O discurso do promotor foi curto, mas forte, indignado, com um tom que parecia ódio, e não era. A defesa, além do talento do advogado, tinha a circunstância de ser a estréia dele na tribuna. Parentes, colegas e amigos esperavam o primeiro discurso do rapaz, e não perderam na espera. O discurso foi admirável, e teria salvo o réu, se ele pudesse ser salvo, mas o crime metiase pelos olhos dentro. O advogado morreu dous anos depois, em 1865. Quem sabe o que se perdeu nele! Eu, acredite, quando vejo morrer um moço de talento, sinto mais que quando morre um velho… Mas vamos ao que ia contando. Houve réplica do promotor e tréplica do defensor. O presidente do tribunal resumiu os debates, e, lidos os quesitos, foram entregues ao presidente do Conselho, que era eu. Um dos jurados do Conselho, cheio de corpo e ruivo, parecia mais que lá se passou, não interessa ao caso particular, que era melhor ficasse também calado, confesso. Cantarei depressa; o terceiro ato não tarda. Um dos jurados do Conselho, cheio de corpo e ruivo, parecia mais que ninguém convencido do delito e do delinqüente. O processo foi examinado, os quesitos lidos’ e as respostas dadas (onze votos contra um); só o jurado ruivo estava inquieto. No fim’ como os votos assegurassem a condenação, ficou satisfeito, disse que seria um ato de fraqueza, ou cousa pior, a absolvição que lhe déssemos. Um dos jurados, certamente o que votara pela negativa,– proferiu algumas palavras de defesa do moço. O ruivo,– chamava-se Lopes,– replicou com aborrecimento: — Como, senhor? Mas o crime do réu está mais que provado. — Deixemos de debate, disse eu, e todos concordaram comigo. — Não estou debatendo, estou defendendo o meu voto’ continuou Lopes. O crime está mais que provado. O sujeito nega, porque todo o réu nega, mas o certo é que ele cometeu a falsidade, e que falsidade! Tudo por uma miséria’ duzentos mil-réis! Suje-se gordo! Quer sujar-se? Sujese gordo! “Suje-se gordo!” Confesso-lhe que fiquei de boca aberta, não que entendesse a frase, ao contrário, nem a entendi nem a achei limpa, e foi por isso mesmo que fiquei de boca aberta. Afinal caminhei e bati à porta, abriram-nos, fui à mesa do juiz, dei as respostas do Conselho e o réu saiu condenado. O advogado apelou; se a sentença foi confirmada ou a apelação aceita, não sei; perdi o negócio de vista. Quando saí do tribunal, vim pensando na frase do Lopes, e pareceu-me entendê-la. “Suje-se gordo!” era como se dissesse que o condenado era mais que ladrão, era um ladrão reles, um ladrão de nada. Achei esta explicação na esquina da Rua de S. Pedrovinha ainda pela dos Ourives. Cheguei a desandar um pouco, a ver se descobria o Lopes para lhe apertar a mão; nem sombra de Lopes. No dia seguinte, lendo nos jornais os nossos nomes, dei com o nome todo dele, não valia a pena procurá-lo, nem me ficou de cor. Assim são as páginas da vida, como dizia meu filho quando fazia versos, e acrescentava que as páginas vão passando umas sobre outras, esquecidas apenas lidas. Rimava assim, mas não me lembra a forma dos versos. Em prosa disse-me ele, muito tempo depois, que eu não devia faltar ao júri, para o qual acabava de ser designado. Respondi-lhe que não compareceria, e citei o preceito evangélico; ele teimou, dizendo ser um dever de cidadão, um serviço gratuito, que ninguém que se prezasse podia negar ao seu país. Fui e julguei três processos. Um destes era de um empregado do Banco do Trabalho Honrado, o caixa, acusado de um desvio de dinheiro. Ouvira falar no caso, que os jornais deram sem grande minúcia, e aliás eu lia pouco as notícias de crimes. O acusado apareceu e foi sentar-se no famoso banco dos réus. Era um homem magro e ruivo. Fitei-o bem, e estremeci, pareceu-me ver o meu colega daquele julgamento de anos antes. Não poderia reconhecê-lo logo por estar agora magro, mas era a mesma cor dos cabelos e das barbas, o mesmo ar, e por fim a mesma voz e o mesmo nome: Lopes. — Como se chama? perguntou o presidente. — Antônio do Carmo Ribeiro Lopes. Já me não lembravam os três primeiros nomes, o quarto era o mesmo, e os outros sinais vieram confirmando as reminiscências; não me tardou reconhecer a pessoa exata daquele dia remoto. Digo-lhe aqui com verdade que todas essas circunstâncias me impediram de acompanhar atentamente o interrogatório, e muitas cousas me escaparam. Quando me dispus a ouvi-lo bem, estava quase no fim. Lopes negava com firmeza tudo o que lhe era perguntado, ou respondia de maneira que trazia uma complicação ao processo. Circulava os olhos sem medo nem ansiedade; não sei até se com uma pontinha de riso nos cantos da boca. Seguiu-se a leitura do processo. Era uma falsidade e um desvio de cento e dez contos de réis. Não lhe digo como se descobriu o crime nem o criminoso, por já ser tarde; a orquestra está afinando os instrumentos. O que lhe digo com certeza é que a leitura dos autos me impressionou muito, o inquérito, os documentos, a tentativa de fuga do caixa e uma série de circunstancias agravantes, por fim o depoimento das testemunhas. Eu ouvia ler ou falar e olhava para o Lopes. Também ele ouvia, mas com o rosto alto, mirando o escrivão o presidente. o tecto e as pessoas que o iam julgar; entre elas eu. Quando olhou para mim não me reconheceu; fitou-me algum tempo e sorriu, como fazia aos outros. Todos esses gestos do homem serviram à acusação e à defesa, tal como serviram, tempos antes, os gestos contrários do outro acusado. O promotor achou neles a revelação clara do cinismo, o advogado mostrou que só a inocência e a certeza da absolvição podiam trazer aquela paz de espírito. Enquanto os dous oradores falavam, vim pensando na fatalidade de estar ali, no mesmo banco do outro, este homem que votara a condenação dele, e naturalmente repeti comigo o texto evangélico: “Não queirais julgar, para que não sejais julgados”. Confesso-lhe que mais de uma vez me senti frio. Não é que eu mesmo viesse a cometer algum desvio de dinheiro, mas podia, em ocasião de raiva, matar alguém ou ser caluniado de desfalque. Aquele que julgava outrora, era agora julgado também. Ao pé da palavra bíblica lembrou-me de repente a do mesmo Lopes: “Suje-se gordo!” Não imagina o sacudimento que me deu esta lembrança. Evoquei tudo o que contei agora, o discursinho que lhe ouvi na sala secreta, até àquelas palavras: “Suje-se gordo!” Vi que não era um ladrão reles, um ladrão de nada, sim de grande valor. O verbo é que definia duramente a ação. “Suje-se gordo!” Queria dizer que o homem não se devia levar a um ato daquela espécie sem a grossura da soma. A ninguém cabia sujar-se por quatro patacas. Quer sujar-se? Suje-se gordo! Idéias e palavras iam assim rolando na minha cabeça, sem eu dar pelo resumo dos debates que o presidente do tribunal fazia. Tinha acabado, leu os quesitos e recolhemo-nos à sala secreta. Posso dizer-lhe aqui em particular que votei afirmativamente, tão certo me pareceu o desvio dos cento e dez contos. Havia, entre outros documentos, uma carta de Lopes que fazia evidente o crime. Mas parece que nem todos leram com os mesmos olhos que eu. Votaram comigo dous jurados. Nove negaram a criminalidade do Lopes, a sentença de absolvição foi lavrada e lida, e o acusado saiu para a rua. A diferença da votação era tamanha que cheguei a duvidar comigo se teria acertado. Podia ser que não. Agora mesmo sinto uns repelões de consciência. Felizmente, se o Lopes não cometeu deveras o crime não recebeu a pena do meu voto, e esta consideração acaba por me consolar do erro, mas os repelões voltam. O melhor de tudo é não julgar ninguém para não vir a ser julgado. Suje-se gordo! suje-se magro! suje-se como lhe parecer! o mais seguro é não julgar ninguém… Acabou a música, vamos para as nossas cadeiras.

     

  21. Por que será que sempre que a

    Por que será que sempre que a coisa começa a apertar para o lado tucano já vem correndo um falso apaziguador querendo que PT e PSDB façam as pazes, ou que Lula e FHC se expliquem igualmente para mostrar que os dois são iguais? Ô moça, o Lula tem se explicado até demais, quem nunca se explica é o FHC que tem um baú de ossos considerável e nunca o abre. Mania que tem certas pessoas de quererm igualar o Lula com esse carcereiro de esqueletos!

  22. A tucana Helena Chagas

    Todos devemos explicações.

    Da tucana Helena Chagas eu quero explicações sobre “tudo que ela não fez”, e ela nada fez,  no governo Dilma.

    romério

  23. O Lula abriu seu sigilo, e

    O Lula abriu seu sigilo, e todos ficamos sabendo quando ele fatura para participar de congressos.

    Não consta que FHC tenha feito o mesmo

    Esses coxinhas …

  24. Materiazinha muito tucana

    Curioso como não vi manifestações como esta diante da torrente de matérias , de invasões de privacidade, de maledicências cometidas inclusive por FHC, contra Lula. Agora diante   destes vazamentos contrários  tenta colocar todos no mesmo nível. Dizendo somos todos iguais, assim não devemos ficar chocados. E ainda vai mais uma criticazinha aos ptistas, porque ficaram contentes festejando, como se a cada maledicência a cada ataque tucanos     não aparecessem grão tucanos se esmerando para de forma pesada anti-ética de deselengante  atacarem Lula ou a presidência.  Me parece que estes ataques não fizeram mal ao aparelho digestivo da articulista.

  25. Helena Chagas se “esquece” de

    Helena Chagas se “esquece” de que não existe essa se supostos pagamentos feitos por Fernando Henrique à sua amante no exterior. Os pagamentos foram feitos. Miriam Dutra disse e Fernando Henrique confirmou, apenas dizendo que não usou a Brasif para isso. E os constrangedores escandalos que afetam Lula, sào constrangedores para as forças policias-midiáticas-judiciais que os formulam. Mas que constrangedores, são ridículos.

  26. Explicações

    Quem nos deve mesmo explicações, a nós que a elegemos, é a Presidenta Dilma, por ter nomeado essa senhora para a SECOM e a mantido por 4 anos no cargo. Precisa também nos explicar por que mantém o Ministério da Justiça vago desde o primeiro dia do seu primeiro mandato. 

  27. Bullying

    Quem se recorda daquele garoto que faz bullying e persiste no bullying durante um bom tempo.
    Ganha inclusive apoios da turba, e logo ao chegar na escola, seu palco preferido, se junta com
    a turba para continuar o bullying. Os meses passam  até que um belo dia a resposta ao bullying, vem na forma
    de um soco preciso e bem dado pela vítima. Sem resposta o garoto chora e vários de seus amigos, reclamam,
    mas porque tanta violência. afinal não era nada de mais. Aliás, dizem, a vítima também deve ter culpa
     e  deve se explicar. Os amigos da vítima se regosijam com o soco, e os outros criticam esta manifestação afirmando
    que esta alegria é muito feia. É muito deselegante.  O diretor  encaminha a vítima para a diretoria….
    Durante semanas muitos pais se manifestaram criticando a violência física.  enquanto outros clamam
    pelo bom senso da vítima para se explicar e perdoar a brincadeira.

  28. HC

    Primeiramente adorei o HC.

    Segundamente : que jornalista mais medíocre.

    Terceiramente ? Nassif, vc está postando muitas coisas esta mulher. Pó pará !. Ela não vale a pena.

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