Triunfo Democrático para os Separatistas Catalães, por Craig Murray e Ruben Rosenthal

Tradução comentada, por Ruben Rosenthal, do artigo de autoria de Craig Murray publicado em seu blogue, em 29 de abril

do Chacoalhando 

Triunfo Democrático para os Separatistas Catalães 

por Craig Murray e Ruben Rosenthal

Tradução comentada, por Ruben Rosenthal, do artigo de autoria de Craig Murray publicado em seu blogue, em 29 de abril. 

Nas eleições gerais realizadas na Espanha, o Partido Esquerda Republicana da Catalunha, pró-independência, com 15 cadeiras conquistadas, pode se tornar indispensável para viabilizar um governo de esquerda liderado pelo PSOE (123 deputados) e com a (esperada) participação do Podemos (42), desta forma superando a maioria absoluta de 176. Um aspecto interessante, pouco divulgado pela mídia tradicional, é que o ERC conquistou a maior fatia dos votos na Catalunha, o que contrariou a falsa propaganda de que a Independência Catalã é um movimento de direita. O mapa da distribuição dos votos na Catalunha, por municipalidade, apresentado ao final do artigo de Craig Murray, é de uma clareza inequívoca sobre a predominância da esquerda independentista nestas eleições. A vitória de partidos de esquerda é muito bem vinda neste momento em que o obscurantismo da extrema direita se alastra pelo mundo (Introdução ao artigo, pelo tradutor).

Os resultados na Catalunha da eleição geral na Espanha representaram uma retumbante vitória para os Separatistas Catalães, o melhor resultado eleitoral que já obtiveram, alcançado apesar de suas lideranças estarem exiladas ou encarceradas, mantidas como prisioneiros políticos, e apesar da avalanche de propaganda na mídia tradicional contra o movimento separatista. Quatro dos agora eleitos estão presos. A reação do estado Espanhol foi declarar inelegíveis, para as eleições do Parlamento Europeu, os dois principais candidatos separatistas, Clara Ponsanti e Carles Puigdemont.

O Partido Esquerda Republicana da Catalunha conquistou a maior fatia dos votos, o que contraria a persistente propaganda falsa de que a Independência Catalã é um movimento de direita. Mais de 60% dos votos foram para partidos declaradamente de esquerda. É ainda importante notar que existe uma nítida correlação entre a localização geográfica dos 3,6% dos votos conseguidos pelos neo-fascistas do Vox na Catalunha, e as guarnições da ocupação militar espanhola no país.

Estes dados são muito difíceis de se obter na mídia britânica. Só foi possível (ao autor do artigo) obtê-los a partir de fontes Catalãs. O periódico (inglês) The Guardian publicou 55 artigos nos últimos três anos promovendo Inés Arrimadas, a líder da ala Catalã do partido direitista Ciudadanos, incluindo pelo menos três artigos de Opinião escritos pela própria Inés. O The Guardian procurou tenazmente retratar a opinião pública na Catalunha como sendo contrária à Independência, e Arrimadas, como sua verdadeira representante (foto a seguir).

Ainda assim, na Eleição Geral, Arrimadas conseguiu apenas 11,6% dos votos na Catalunha. Os três partidos nacionalistas de direita espanhóis, o fascista Vox, o franquista PP e o Ciudadanos de Arrimada, este apoiado por serviços de segurança estrangeiros, conseguiram juntos, patéticos 20,1% dos votos, uma impressionante rejeição ao nacionalismo espanhol.

O Partido Ciudadanos surgiu como um esforço camuflado para ajudar a conter a esquerda e o populismo anti-União Européia do Podemos. Para esta finalidade, ele foi fundado e apoiado pelo BND (Bundesnachrichtendienst), o serviço de inteligência externa da Alemanha.  O partido permanece como uma ferramenta favorita dos serviços de inteligência estrangeiros, particularmente o MI6 (britânico), que com certeza vê ligações entre os nacionalismos Catalão e Escocês. Isto explica a particularmente ativa conexão entre Ciudadanos e o The Guardian, periódico porta-voz do MI6 na mídia.

É impossível correlacionar diretamente os resultados obtidos pelos partidos na eleição com potenciais resultados em um (eventual futuro) referendo (sobre a independência da Catalunha), pois vários partidos, incluindo o Podemos e os Verdes, têm posicionamentos ambivalentes sobre a Independência. Além disso, um percentual dos votantes tem uma opinião que difere da do partido que apóiam. Por exemplo, um pequeno, mas significativo número de simpatizantes do Partido Socialista do primeiro ministro Pedro Sánchez, também apóia a Independência Catalã.

Dada a violência desmedida das forças paramilitares franquistas contra votantes durante o referendo na Catalunha (em 2017), considerando o aprisionamento e exílio da liderança pacífica (pró-separatismo), e ainda a gigantesca propaganda na mídia ditada por Madrid, a vitória no nacionalismo Catalão na Eleição Geral representou um incrível triunfo do espírito humano. Muito provavelmente não irão aparecer na mídia (tradicional) os resultados da eleição de 2019 na Catalunha, (bastante reveladores, quando) expressos por municipalidade, como vistos na figura abaixo.

Em amarelo, aparecem as municipalidades em que ocorreu vitória da esquerda separatista, em rosa, os separatistas de centro, em vermelho, os socialistas (do PSOE).

Notas do Tradutor:

 1Craig Murray, de nacionalidade escocesa, foi embaixador do Reino Unido no Uzbequistão, quando denunciou as bárbaras torturas perpetradas contra os opositores do regime do presidente Karimov. Por esta atuação, contrariou os interesses dos Estados Unidos e da própria Inglaterra, sendo demitido do Serviço Diplomático. Exerceu o cargo de Reitor da Universidade de Dundee, e é ativista do movimento pró-independência da Escócia. Através da rede de contatos que formou durante seu período serviço diplomático, Craig recebe informações privilegiadas, que frequentemente repassa aos leitores de seu blogue. Foi dos primeiros a denunciar como farsa, as acusações contra a Rússia, de envenenamento em Londres do ex-agente Sergei Skripal e de sua filha Julia.

2Os termos colocados entre parênteses foram adições colocadas pelo tradutor, para auxiliar em um melhor entendimento do artigo.

3 Resta ver se o apoio do ERC à formação do governo majoritário de esquerda estará condicionado à realização de um novo plebiscito sobre a independência da Catalunha. Talvez o ERC não tenha alternativa, pois se a negativa a este apoio não possibilitar a formação de um governo de esquerda, o ERC estará cometendo o mesmo erro do Podemos em 2016, ao se negar a formar um governo com o PSOE, o que abriu caminho para o governo direitista de Mariano Rajoy, do PP, e resultou na perda significativa de cadeiras do Podemos na atual eleição.

Redação

4 Comentários

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  1. Devagar com o andor que o santo é de barro. Me parece que cada vez mais se desenvolve nas “esquerdas” do Brasil o gosto pelo bizarro, pelas explicações estriônicas e pelas teorias da conspiração típicas da “locosfera”, destas “esquerdas” que se gostam de auto-intitular “verdadeiras” e para quem todas as outras são “falsas” esquerdas, não importa que essas tristes figuras tenham caido de paraquedas sem nenhuma história de militância nos partidos e movimentos sociais de esquerda pelo menos as que se conhece.

    Nacionalismo na Europa com as raríssimas e parcas exceções tem pouco a ver com ideais solidários e universais, com a luta contra o colonialismo ou o imperialismo, pela soberania e pelo desenvolvimento nacional como conhecemos nos nossos países da América Latina, África e sudeste da Ásia. Definitivamente não, e quem afirma o contrário desconhece a realidade desses “nacionalismos” europeus e mais ainda a distância que os separa de nossas realidades.

    As comunidades autônomas Pais Vasco e Cataluña, como instituições administrativos e regionais da Espanha, são as duas mais regiões mais desenvolvidas. Possuem Parlamentos próprios (como as demais “autonomias”) e uma amplo leque de liberdades políticas independentes do ente central que conhecemos como Reino de Espanha ou simplesmente Espanha, Estado com um território plurinacional e plurilinguístico integrados como realidade na história comum da Peninsula Ibérica.

    Na España o alinhamento automático ao “nacionalismo catalão”, pelo menos do ponto de vista das esquerdas, tem sido um erro e um erro que não se justifica como contraposição às direitas, seja a do velho PP, do novo Ciudadanos ou do “novíssimo” Vox que vivem todas da exploração do fantasma basco e catalão, utilizado como arma demagógica eleitoral, idéia que se repete a exaustão de que os “independentistas”, com ajuda e a conivência dos partidos de esquerda, “querem romper España!”. Não, não vale a máxima de Karl Schimidt que o inimigo (os indenpendentistas) do meu inimigo (as direitas) é necessariamente meu amigo (das esquerdas) pelo menos para quem de fato ainda leva no peito os ideais universalistas democráticos e socialistas.

    As direitas espanholas foram todas alimentadas e tratadas carinhosamente pela chamada “caverna midiática” de Intereconomia e de Liberdad Digital, da direita monárquica de ABC ou direita neoliberal de El Mundo. Todas elas, imprensa e partidos políticos, carregam o ADN franquista em seu código político “genético” reciclado por uma mescla borrosa e confusa de nacional catolicismo neoliberal.

    O caso de Ciudadanos que se origina com partido que se organiza primeiro em oposição ao projeto independentista catalão é particularmente grave porque demonstra a que ponto chegou a deriva neoliberal da social-democracia européia.

    El País que foi sempre visto como a imprensa de esquerda na Espanha, por seu vinculo e apoio político ao PSOL, utilizou Ciudadanos para minar, à esquerda, o crescimento de PODEMOS e a para minar qualquer possibilidade de uma aliança PSOE e PODEMOS principalmente em termos programáticos. El País endossou a frivolidade do discurso “antipopulista” das direitas espanholas com o argumento de havia partidos constitucionais (PP, Ciudadanos e PSOE) e partidos populistas anticonstitucionais como PODEMOS de modo a manter o PSOE sempre longe de uma aliança com PODEMOS e com outros partidos de esquerda ou nacionalistas bascos e catalães seja de esquerda (Bildu e ERC respectivamente) e de centro direita (como respectivamente PNV basco e o requebrado PDCAT vindo da antiga Convergencia Democrática de Pujol e Artur Más duas velhas e turbias raposas política catalã mestre de cerimônias desse nacionalismo catalão de ocasião)

    Só para se ter uma ideia, no dia seguinte a vitória do PSOE, a principal associação patronal da Espanha e um informe do Banco Santander sugerem uma aliança entre PSOE e Ciudadanos de modo a isolar as esquerdas e como forma clara de pressão.

    Ë preciso que o independentismo se leve a sério e responda qual será a moeda do no “Estado Catalão”, ou qual a solidariedade que os independentistas catalães têm para com os milhões de outros espanhóis castellaños manchegos o leones, andaluzes, extremenhos, aragoneses, galegos, murcianos e valencianos que afluiram à Cataluna buscando melhores condições de vida em uma região mais desenvolvida para viver e que ajudaram a fazer o desenvolvimento dessa região da Espanha. Me desculpem mais isso cheira chauvinismo e ao dizer isso não me sinto mesmo de esquerda, mas justamente o contrário. Apenas é preciso saber que não é exatamente tudo maniqueistamente preto e branco nessa história.

  2. No domingo, encontrei o Barbarroxa, que morou com a gente no início da década de 90, na casa dos Estudantes Universitários. Por ser Catalão, perguntei a ele sobre a independência da Cataluña. Ele disse que é Catalão mas seu pai é de Aragão e sua Mãe de Andaluzia. E eles são tão discriminados na Cataluña quanto o Nordestino é discriminado em São Paulo. E que a Catalunha só quer sua independência por ser mais rica, tal qual São Paulo.

  3. A vitória da esquerda na Catalunha é a derrota da direita do PdCat do senhor Puigdemont, autor do fracassado golpe de estado separatista. Simples assim. Não significa que eles sejam mais ou menos separatistas. Aliás, metade da população catalã não é separatista. Ocorre que o sistema de peso de votos, dando mais força às populações do leste interior, provoca uma “distorção “

  4. Apreciei muito o comentário do sr. Policarpo seguindo-se ao texto da tradução comentada que fiz de artigo do escocês Craig Murray, ativista pela independência da Escócia. Além de nos brindar com um bom leque de informações sobre as nacionalidades e as relações políticas internas na Espanha, o sr. Policarpo questionou a falta de clareza das propostas dos independentistas e o apoio incondicional das esquerdas aos movimentos nacionalistas europeus. Em outra tradução comentada recentemente publicada no GGN, fiz questão de ser bastante didático nos comentários sobre a distinção do nacionalismo dos povos colonizados na África e nas Américas, do nacionalismo-populismo europeu, em geral de direita.
    Entendo que o melhor objetivo de um artigo não seja buscar a concordância geral e sim suscitar a discussão, e nisto creio ter sido bem sucedido na escolha do artigo que traduzi. Na maioria dos artigos que escrevi (incluindo as traduções comentadas) desde que me aposentei como professor universitário há menos de dois anos, e que foram publicados no GGN, procurei sempre apresentar o contraditório, mas para o leitor atento ficava evidenciado que o artigo não era estritamente neutro. Este foi o caso também com o artigo sobre o resultado das eleições na Espanha.
    Entendo que parte da simpatia que o autor Craig Murray tem pela independência da Catalunha seja porque, se esta for concretizada, poderá vir a fortalecer ainda mais o movimento pró-independência da Escócia, do qual ele é adepto fervoroso. De minha parte, de uma forma genérica, sou favorável à autodeterminação dos povos, e não existe apenas um povo na Espanha. Mas nos comentários que escrevi, seguindo-se à tradução, enfatizei que há uma questão que precisa ser considerada seriamente neste caso, e no momento atual, que é a da viabilização da formação de um governo majoritário de esquerda na Espanha, mesmo que o PSOE majoritário se oponha a um novo plebiscito na Catalunha. Esta é uma questão que o ERC precisará decidir.
    O fato da Catalunha ter alcançado notável desenvolvimento não invalida moralmente a opção majoritária pela separatismo. Outros fatores interferem nesta intenção claramente manifestada. Artigo em O Globo analisa que a região denuncia a distribuição desigual dos fundos públicos na Espanha, o que seria responsável por sua asfixia financeira apesar do desenvolvimento alcançado. Suponho que a autonomia atual ainda mantenha a região atrelada às decisões de política externa do país, ou estou enganado? Pergunto então ao sr. Policarpo, que demonstrou ter mais erudição sobre o tema do que eu, talvez porque tenha carteirinha de militante em partido político ou movimento social de esquerda chancelado por ele, como ficaria a Catalunha em face dos compromissos da Espanha com a OTAN, no caso de envio de tropas para outros países? Uma Catalunha, majoritariamente de esquerda, e supostamente não intervencionista, fica obrigada a participar do esforço de guerra? Outros questionamentos de natureza semelhante podem ser levantados.
    Outro comentário, o do sr. Rui Ribeiro, questiona o preconceito dos catalães contras os migrantes das outras nacionalidades. Não duvido que possa haver mesmo um preconceito real, mas não há como negar o significado da eleição, exatamente pelo ERC, da sergipana Maria Dantas para o Parlamento Espanhol, mostrando que o partido é permeável a entrada de imigrantes em seus quadros. Sua auto-definição como ‘antirracista, antifascista e antimachista’, associada à sua imagem usando a camiseta estampada com Marielle Vive, é reveladora de que podemos estar certos de que pelo menos um voto da esquerda independentista estará comprometido com os direitos humanos e pelo fechamento dos centros de internamento dos imigrantes (Brasil de Fato).

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