Direito de propriedade, uma arma de destruição em massa

No Brasil, a propriedade deve atender a sua função social (art. 5°, XXIII, da CF/88). O exercício abusivo de qualquer direito, inclusive do direito de propriedade, pode ser considerado um ato ilícito (art. 187, do Código Civil). A legislação ambiental também impõe limites aos direitos do proprietário, obrigado-o a tomar medidas para minimizar os estragos ambientais que ele causa.

O art. 833, do Código Civil italiano, entretanto, é bem mais específico:

“O proprietário não pode praticar atos que tenham por objetivo unicamente causar dano ou moléstia aos outros.”

O aumento exponencial da poluição da atmosfera nas últimas décadas está intimamente ligado à exploração, comércio e consumo de combustíveis fósseis. O acúmulo de gases tóxicos liberados pela queima de derivados de petróleo produzem tanto o efeito estufa quando a mudança climática.

A propriedade de ações em empresas de petróleo pode, portanto, ser considerada a causa remota dos danos provocados ao meio ambiente e a todos os seres vivos no planeta. Todavia, isso não é considerado ilegal em nenhum lugar, nem mesmo na Itália.

Em razão do exposto, podemos dizer que o Direito não é mais uma ferramenta racional para garantir a paz social e a vida humana. Seu objetivo é perpetuar um “mal banal” causado por indústrias que lucram com a destruição da Natureza. O meio ambiente não tem direitos, nem as vítimas colaterais da injustiça ecológica institucionalizada.

O direito de propriedade é roubo (Pierre-Joseph Proudhon). A mais-valia é a parcela do trabalho não paga ao operário pelo proprietário dos meios de produção (Karl Marx). Nós chegamos agora ao estágio em que o principal meio de destruição da Natureza é a propriedade, instituição jurídica cujo exercício possibilita o roubo ou a revogação do direito à vida do homem e dos demais seres vivos (essa hipótese é minha).

Enquanto não houver mudança na concepção do Direito e uma reformulação radical do direito de propriedade, o Green Deal proposto por Yanis Varoufakis, Jeremy Corbyn, Naomi Klein e Bernie Sanders, será uma ilusão de ótica para fins eleitorais.

Concordo totalmente com a definição de crime de ecocídio https://ecocidelaw.com/the-law. Mas será preciso ir mais longe, porque o ecocídio não é fruto apenas da ação desta ou daquela empresa ou deste ou daquele governante.

O ecocídio também é um resultado difuso de uma estrutura social baseada na propriedade e na sua perpetuação. A ideia de que existe uma separação entre o homem (o proprietário) e a Natureza (objeto de apropriação humana) está embutida na base da propriedade. Ela neutraliza a relação de dependência mútua que o homem mantém com o meio ambiente e apaga qualquer responsabilidade humana pela vida de outros seres vivos.

Há bem pouco tempo um rio ganhou direitos na Nova Zelândia. Salvar um rio é algo bom. Mas aquele rio supostamente salvo também receberá partículas de plásticos que viajam pelo globo terrestre nas correntes de ventos e de humidade. Chuva ácida e plástica… e voilà, o direito do rio desaparece soterrado por um sistema globalizado de destruição em massa da Natureza.

A eficácia das Leis ambientais brasileiras era baixa. Sob o influxo do bolsonarismo ela desapareceu. Na atualidade aqueles que defendem a Natureza correm o risco de ser tratados como criminosos e até como terroristas.

Os limites legais impostos aos direitos dos proprietários estão rapidamente desaparecendo no Brasil. Todavia, o que precisa desaparecer é o próprio direito de propriedade. Caso contrário o resultado será tanto um ecocídio quando o subsequente genocídio.

Fábio de Oliveira Ribeiro

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