Parte de um prédio desabou no bairro do Janga, em Paulista, no Grande Recife, na manhã desta sexta-feira (7). Até o início da tarde, três pessoas haviam sido resgatadas, hospitalizadas e uma delas acabou indo a óbito.
De acordo com os bombeiros, há ao menos outros 16 moradores soterrados nos escombros. O trabalho de resgate deve continuar pela noite e madrugada de sábado (8).
Conforme mulheres entrevistadas pela TV Globo, enquanto aguardavam em agonia por notícias de parentes, declararam ocupar o prédio porque o encontraram vazio e não tinham onde morar. Seguiram para o local com crianças e os poucos pertences.
O prédio, parte do Conjunto Beira-Mar, estava interditado por ordem judicial desde 2010, de acordo com a Prefeitura de Paulista. Acabou reocupado em 2012. Uma vistoria foi feita em 2018 e confirmou a interdição, mas os moradores seguiram no local porque não tinham para onde ir.
Esse tipo de prédio, construído como projeto de moradia popular, chamado de “prédio caixão”, tem térreo e três andares e, em cada pavimento, há quatro apartamentos. No último mês de abril, um outro “prédio caixão” desabou em Olinda, também no Grande Recife, sob as mesmas condições.
Censo 2022 anuncia tragédia
A tragédia é o reflexo de um dramático problema brasileiro. Conforme o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dos 90 milhões de domicílios existentes no país em 2022, 12% (ou 11 milhões) estavam vagos. No entanto, o número de sem tetos é menor e considerável.
De tal modo que a quantidade de domicílios vazios é duas vezes maior que o déficit habitacional no país. A Fundação João Pinheiro aponta que em 2019, de acordo com levantamento, o déficit habitacional no Brasil era de mais de 5,9 milhões de domicílios.
Ocorre que o total de lares brasileiros subiu 34% entre 2010 e 2022. Dentro desse grupo, o maior salto foi observado nos domicílios vagos. São moradias que estão à venda, para alugar ou esperando para serem demolidas. O aumento foi de 87% no período.
A maior parte dos 53 municípios com a maior quantidade de domicílios vazios está concentrada no litoral, conforme o IBGE. Mesmo não estando entre estes municípios, Paulista, no Grande Recife, está na faixa litorânea. Enquanto algumas pessoas mantêm casas de praia, outras se lançam ao perigo por um teto.
MTST: a luta contra o processo de mercantilização
Dirigente nacional do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Sem Teto (MTST), Rud Rafael entende que os números do Censo 2022 confirmam o processo de mercantilização da moradia, “tratada muito mais pelo viés da política econômica do que pela questão social”.
A liderança sem teto explica que o processo de produção de moradias atende ao mercado, não às necessidades sociais. “A crise da moradia é uma artificialidade do mercado. Há uma falta de políticas públicas para o cumprimento da função social e de regulação do uso do solo urbano”, explica.
No ano de 2021, Rud lembra que houve a celebração dos 20 anos do Estatuto da Cidade. Essa lei criou um conjunto de instrumentos para o cumprimento da função social da propriedade, presente no artigo 5º da Constituição Federal, e o direito à moradia, no artigo 6º.
Minha Casa, Minha Vida
Uma das reivindicações do MTST está contemplada no novo Minha Casa, Minha Vida. A possibilidade de revitalizar imóveis vagos nos centros urbanos, para destinação da chamada Faixa 1, quem mais sofre pela falta de moradia, abre um estoque público de moradias.
A iniciativa deve combater a especulação imobiliária, ao não permitir que esses imóveis sejam adquiridos por incorporadoras, se refletindo na diminuição de 1,9% do valor dos aluguéis no Brasil, segundo o IGP-M, a queda mais significativa dos últimos 34 anos.
“O MTST entende que a sua atuação deve se pautar pela garantia da função social da propriedade com a aplicação dos instrumentos legais para destinação ou revitalização de moradias e outros usos populares da cidade. Produzir cidades deve gerar renda e emprego, mas observando esses aspectos”, diz Rud.
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