A criação da antiga lei do 13º salário é ainda educativa para os trabalhadores, por Roberto Bitencourt da Silva

A criação da antiga lei do 13º salário é ainda educativa para os trabalhadores

por Roberto Bitencourt da Silva

Chega o mês de dezembro, hora de os trabalhadores com vínculo empregatício formal receberem o seu 13º salário. O comércio e o fiapo de indústria ainda existente tendem a aquecer, por conta da elevação da capacidade de consumo da classe trabalhadora.

A princípio, muitos ficam felizes. Contudo, em especial, as frações do grande ao micro empresariado manifestam descontentamento em pagar o benefício aos seus empregados. Vistas curtas, sobretudo do micro ao médio capital, almejam consumidores para seus produtos e serviços, sem a contrapartida da dilatação do poder de compra na sociedade.

É praxe entre as burguesias posicionarem-se a favor da retirada de direitos trabalhistas, inclusive o 13º. O grande capital, nacional e gringo, até possui condições para assim se colocar, já que pode perfeitamente priorizar os mercados externos e pequenas faixas de consumo do mercado doméstico. O micro, pequeno e médio capital não tem essa alternativa.

Do ponto de vista do mundo do trabalho, isto é, de quem produz efetivamente a riqueza do/no País, é importante registrar que a lei do 13º salário é fruto do projeto do deputado federal trabalhista Aarão Steinbruch (PTB/RJ), aprovado pela Câmara dos Deputados em 1961, que aguardava sanção do Senado e do Executivo. Com isso, a lei é também e notadamente resultado de uma grande greve geral, promovida em 1962 e organizada pelo Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), então sob a liderança de comunistas e trabalhistas. Uma demanda sancionada pelo presidente João Goulart (PTB).

Na época, este e outros direitos trabalhistas (setoriais ou para o conjunto dos trabalhadores) – bem como avanços em aprovações de leis e demais medidas de governo, ciosas com os interesses nacionais e populares – foram alcançados por meio de ponderável exercício de politização, organização e mobilização dos trabalhadores, especialmente realizado e capitaneado pelo CGT.

Se o governo Jango caiu e foi instalada uma longa e feroz ditadura, um fenômeno histórico precisa ser recordado, por que nos interessa para o momento: a ditadura de 1964 praticamente não tocou nas leis trabalhistas. Apenas substituiu a estabilidade no emprego, após 10 anos – um direito timidamente aplicado –, pelo fundo de garantia. Registre-se que a ditadura prendeu e torturou sindicalistas, interviu arbitrariamente nos sindicatos, silenciou o sindicalismo nacionalista, trabalhista e comunista. Tinha ódio dos sindicatos. Foi terrível para os trabalhadores e para o País, incrementando a superexploração do trabalho e as desigualdades. Obscureceu a utopia de um Brasil soberano e justo.

Porém, estritamente em relação aos direitos do trabalhador, o próprio general Castello Branco via-se forçado a argumentar que “a revolução não foi feita contra os direitos sociais do trabalhador (…). Respeitaremos os compromissos internacionais decorrentes das convenções aprovadas na organização do trabalho e sem vacilações aplicaremos a legislação vigente” (O Globo, 2/5/1964, pág.13). As lutas e as experiências prévias dos/as trabalhadores/as faziam a ditadura colocar a barba de molho e não cutucar mais ainda a onça. Temos que recordar isso, por conta da miserável condição apassivada em que as classes subordinadas encontram-se hoje.

Quando, em nossos dias e no futuro próximo, os/as trabalhadores/as brasileiros/as não receberem mais nada, as frações assalariadas mais altas e a pequena burguesia estiveram submetidas a voraz processo de precarização, todos tropeçarem com salários e direitos exíguos, será oportuno lembrar o seguinte: o responsável principal é o governo Temer, com o suporte do PMDB, da Globo, Band, Veja, PSDB, multinacionais, bancos, DEM, fazendeirões etc. Mas, igualmente, as centrais sindicais contemporâneas possuem grande responsabilidade nesse cenário: particularmente CUT, Força Sindical, UGT, CTB, NCST e CSB que, juntas, representam cerca de 78% do movimento sindical. Em conjunto, marcaram aproximadamente 4 dias de “greve geral” (na prática, paralisações) distribuídos no intervalo de um ano.

A paralisação de 28 de abril desse ano, dotada de um mínimo de boa vontade e organização, foi demonstração clara da capacidade reivindicativa e do descontentamento dos trabalhadores e das trabalhadoras brasileiros/as. Ganhou capilaridade pelo território, com força de incidência também em cidades médias. Os patrões contabilizavam quedas nas receitas. O noticiário televisivo fazia cobertura ao vivo durante o dia. Preocupou e incomodou o poder.

Entretanto, as demais paralisações foram marcadas por extrema desmobilização, falta de apelos e de disposição político-sindical. Cumprir tabela burocrática. Só para constar e não ficar muito feio para as centrais. Há poucos dias, data previamente estabelecida para paralisação, contra a reforma da previdência, foi suspensa. Entidades que não organizam, não politizam e não mobilizam trabalhador algum. Desarmam a força latente das/os trabalhadoras/es.Em decorrência, não há qualquer receio entre as classes dominantes. Elas agem tranquila e folgadamente na supressão de direitos trabalhistas, sociais e no desmonte da Nação.

Inúmeros direitos históricos têm sido escanteados! Direitos que chegaram a perdurar por mais de 70 anos! Convenhamos, trata-se de um perfil de dirigentes e organismos sindicais que não está à altura dos sérios dilemas e desafios do mundo do trabalho brasileiro, nem da tradição do antigo CGT, que nos legou, entre outros, o 13º salário.

Ademais, cumpre observar que, em si, o sindicalismo é núcleo fundamental de politização e organização dos trabalhadores. Círculo tradicional da sociedade civil que permite, se aproveitado, estimular o potencial das classes subordinadas enquanto sujeitos políticos, portadores de ação, escolha, força de incidência sobre a realidade política, econômica e social, como também no processo de construção da agenda pública.

Todavia, enquanto persistir o primado da “pobretologia”, a concepção do pobre “coitadinho, incapaz e despolitizado”, que se insinua, inclusive, nos esquemas de percepção de setores expressivos das esquerdas e do sindicalismo, amplos estratos dos trabalhadores serão tratados somente como objeto da ação alheia. Precisamente o que tem ocorrido há mais de uma década.Uma visão bastante adequada ao eleitoralismo predominante: o princípio da resolução exclusiva dos problemas sociais via ritual eleitoral do voto. Visão politicamente miserável e nefasta para as trabalhadoras e os trabalhadores do Brasil, como facilmente se tem percebido.

Roberto Bitencourt da Silva – historiador e cientista político.

Redação

5 Comentários

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  1. O tico pensa assim: “Vou

    O tico pensa assim: “Vou gastar uma fortuna pagando o décimo-terceiro para esses meus empregados inúteis”.

    E o teco pensa assim: “Ainda bem que no final de ano tem o décimo-terceiro para garantir o reforço no faturamento”.

    Seria tão bom se esses dois neurônios conversassem…

  2. Décimo terceiro salário NON

    Décimo terceiro salário NON ECSISTE. O que existe é simplesmente o acerto de contas do dinheiro que deixou de ser pago ao trabalhador durante o ano. Senão vejamos, com uma continha simples:

    Salario mensal = R$ 1.000,00 –> 12 meses= R$12.000,00 –> 13 salario somado= R$ 13.00,00 no ano

    Transformando o salário para pagamento SEMANAL, temos:

    R$ 100,00/4 = R$ 250,00 –> R$ 250,00 x 52 (semanas de todo ano) = R$ 13.000,00

    Portanto, quando você recebe sario MENSAL, você recebe sobre 4 semanas que multiplicado por 12 meses resulta em 48 semanas. O “patron” fica te devendo 4 semanas (1 mês), que são cobertas com o pagamente do “décimo terceiro”.

    Resumindo: se tirarem o “décimo terceiro” ESTARÃO TE ROUBANDO NA CARADURA!!!!!

     

     

  3. Vieram para matar

    Nenhuma lei acontece por que tudo está bem, as leis existem para “normalizar” um processo que está disfuncional!

    São como remédios!

    Se há uma doença, remédios serão necessários.

    O Brasil até o século XIX foi o maior traficante mundial de escravos!

    O Brasil traficou dez vezes mais escravos que os estados Unidos!

    Éramos a maior sociedade escravagista do planeta!

    Não é por um acaso, que o Brasil é o pais com o maior numero de negros fora da África!

    A CLT foi consequência dessa sociedade doente!

    A mortalidade infantil absurda da época de FHC quando morriam crianças de diarreia!

    Morriam crianças de fome sem que a mídia desse conta disso!

    Com a PEC 55 + reforma trabalhista + o fim de programas sociais + aumento de produtos essenciais como gás e outros serviços levará pessoas de volta à miséria!

    Um dos tripés do golpe é fazer com que o governo deixe de apoiar parcela da população através de politicas de preços e serviços sociais – não é sem motivo cortes no bolsa família vis a vis perdão de dívidas bilionárias!

    É dentro deste contexto, de um pais com o histórico de maior traficante humano, que se processa uma reforma trabalhista!

    Onde até pessoas que serão prejudicadas diretamente defendem tais mudanças!

    É irracional, que pessoas que nem tanto serão atingidas não compreendam a violência que pode seguir a isso!

    Pessoas com fome, dor, sem escola, sem perspectiva, sem humanização vão viver com amor ao próximo?

    Imagina os Marinhos, o bispo macedo, o jucá, o temer numa situação igual a essa?

    Será que eles transbordariam de amor ao próximo?

    É exatamente isso o que estamos plantando…

    E ainda acham que vamos colher riqueza…

  4. Quem dita o valor dos salários é o mercado de trabalho

    Você acredita mesmo que, em 1962, a lei do 13o salário fez aumentar em 1/13 o salário dos trabalhadores?

    Em qualquer circunstância, quem determina o valor dos salários é o mercado de trabalho. Nenhuma lei escrita pode mudar isso, porque o patrão não é obrigado a contratar. Quando o 13o salário foi instituído, o que ocorreu de fato foi uma mudança no cálculo contábil dos valores anuais dispendidos com os empregados: ao invés da conta ser dividida por 12, passou a ser dividida por 13. Em outras palavras, o valor do salário em folha oferecido pelos patrões passou a descontar o 13o salário.

    O mesmo ocorre sempre que o governo inventa um novo encargo trabalhista: o valor é descontado do salário oferecido em carteira. Entre custos diretos e indiretos, o patrão sempre paga o mesmo, pois quem determina o quanto ele deve pagar é o mercado de trabalho. O que a legislação trabalhista pode mudar é qual o percentual deste montante que será pago na forma de salário direto ou indireto. Em outras palavras, quanto do dinheiro do patrão vai entrar direto no bolso do empregado, e quanto irá para o bolso do governo na forma de encargos depositados em bancos estatais. O resto é jogo de cena.

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