Baltazar Garzón, Pinochet e os franquistas

Por João Peres

Nassif, Baltazar Garzón, juiz espanhol que mandou prender Pinochet, pode acabar na cadeia por defender o fim da anistia aos franquistas

Da Rede Brasil Atual

Juiz espanhol que mandou prender Pinochet agora é réu por investigar crimes do franquismo

Baltasar Garzón é acusado de tentar violar as leis de anistia feitas para proteger abusos cometidos durante ditadura espanhola

O Tribunal Supremo da Espanha deu mais um passo para levar a julgamento o magistrado Baltasar Garzón, famoso, entre outras, por mandar prender o ditador chileno Augusto Pinochet. O juiz Fernando Varela transformou em procedimento jurídico um processo no qual Garzón é acusado de ignorar a lei de anistia para investigar os crimes cometidos durante a ditadura franquista (1939-1975).

Varela quer ver o magistrado preso por vinte anos, encerrando assim uma carreira marcada pelo combate às violações de direitos humanos muito além das fronteiras espanholas. Em 16 de outubro de 1998 levou-se a cabo o processo que transformou o magistrado em figura mundial. Seu trabalho na Audiência Nacional, órgão criado para investigar os abusos do general Francisco Franco, fez com que Garzón ganhasse muitos inimigos e passasse a ter uma escolta particular. Foi durante a noite que Pinochet foi despertado na clínica na qual havia sido submetido a uma cirurgia, em Londres.

No quadro interno, ele passou a incomodar além da conta quando solicitou o comparecimento de autoridades judiciais de países nos quais houve revisão dos processos de anistia. De acordo com o jornal Página12, de Buenos Aires, Garzón esperava ter uma audiência com juízes argentinos que anularam as leis “ponto final” e “obediência devida”, formuladas para proteger os militares responsáveis pela morte de 30 mil pessoas durante a última ditadura militar (1976-83). O Tribunal Supremo espanhol decidiu não apenas proibir as audiências como processar o integrante da Audiência Nacional.

Uma manobra definida pelo Página12 como “uma autêntica jogada de manual sobre como proceder quando se quer arrebentar com a carreira de um juiz”. Varela acelerou o andamento do processo para coincidir com outros dois que correm contra Garzón. Um diz respeito ao uso de escutas telefônicas nas investigações de corrupção do Partido Popular e outro por aceitar pagamento por palestras feitas em universidades dos Estados Unidos. Agora, o Conselho Geral do Poder Judiciário pode imediatamente se reunir em Madrid e determinar a suspensão provisória de Garzón, uma medida de praxe.

Agora, o magistrado parece encontrar apenas tímidas defesas no meio político. Os socialistas, atualmente no poder, emitiram umas poucas palavras sobre o caso. O Partido Popular, como esperado, aproveitou para somar-se ao coro pela condenação.

As partes envolvidas no processo têm dez dias para que se manifestem. A saber, as partes são: Mãos Limpas, um sindicato de ultradireita; Falange Espanhola, uma organização ultranacionalista e conservadora do começo do século XX que apoiou Franco e segue existindo; e Liberdade e Identidade, outro grupo conservador fundado em 2006.

A Anistia Internacional, por outro lado, decidiu sair em defesa de Garzón. O diretor da organização na Espanha, Esteban Beltrán, considerou insólita a decisão, que envia uma mensagem equivocada a todo o mundo. “As leis de anistia que trataram de impedir em outros países a verdade, a justiça e a reparação para as vítimas, na maioria dos casos acabaram derrubar por tribunais supremos”, recordou. Os maiores sindicatos espanhóis decidiram organizar uma marcha na próxima semana em defesa do magistrado começaram a recolher assinaturas contra o processo.

Pinochet

A história de como Garzón levou Pinochet à cadeia é contada por Fernando Morais no livro “Cem quilos de ouro”. A história, publicada originalmente na revista Playboy, faz a seguinte descrição: “ O homem que mudou o destino de Pinochet é um espanhol míope, de 1,80 metro de altura, com cara de galã de cinema — e que nunca havia posto os pés no Chile”. Garzón enfrentou resistência por parte do Judiciário espanhol porque alguns de seus colegas entendiam que não havia amparo legal para ordenar a prisão por crimes cometidos no Chile.

Peitando esses problemas, o magistrado e sua equipe trabalharam em ritmo de maratona durante 72 horas para conseguir apanhar Pinochet. Um processo de 300 páginas foi apresentado ao Judiciário britânico com a necessidade de se fazer uma rápida análise, pois era sexta-feira e no dia seguinte, além do descanso dos juízes, o ex-ditador deixaria o país.

Morais narra outros casos nos quais o magistrado atuou: “Foi daqui, desses micros, que saiu a munição que Baltasar Garzón utilizou para pôr na cadeia gente de todo tipo – de terroristas da ETA, o grupo nacionalista espanhol que luta pela independência do País Basco, a policiais que torturavam terroristas da ETA. Daqui saíram mandados de prisão contra um ex-presidente da República do Togo, na África, acusado de corrupção, contra dois generais, um brigadeiro e um almirante argentinos, acusados de tortura, contra Amira Yoma, cunhada do presidente argentino Carlos Menem, denunciada por lavagem de dinheiro para narcotraficantes, contra o milionário ex-primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi, que Garzón acusou por sonegação de impostos, e contra capi da Máfia italiana e traficantes de drogas dos cartéis de Cáli e Medellín, na Colômbia”.

Na ocasião da prisão do ditador chileno, o juiz manifestou que “Sempre confiei na Justiça. Estou convencido de que Pinochet, mais dia, menos dia, desembarcará no aeroporto de Barajas, em Madri. E aqui será julgado pelos crimes que cometeu”. O fato é que o responsável pela queda de Salvador Allende morreu em dezembro de 2006 sem pagar pela morte de três mil pessoas.

http://www.redebrasilatual.com.br/temas/internacional/juiz-espanhol-que-mandou-prender-pinochet-agora-e-reu-por-investigar-crimes-do-franquismo

Luis Nassif

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