É necessário recorrer da decisão que condenou Victor a apenas 18 dias, por Roberto Tardelli

Desferir chutes em uma mulher grávida é uma prova robusta para tipificação de indução ao aborto

da CartaCapital

É necessário recorrer da decisão que condenou Victor a apenas 18 dias

Em Direito, quando se pretende justificar a prisão cautelar de alguém ou uma exasperação de pena, dizemos que aquele um, normalmente o réu, “revelou absoluta insensibilidade moral”, que é essa incapacidade de refletir sobre o mal feito, de produzir alguns instantes, senão de arrependimento, ao menos, de respeito. A risada escancarada exibe um gesto de inteiro estranhamento, permeada por uma leitura, feita aos socos, como de quem mal sabe ler, não obstante o dinheiro que possa ter no banco, de uma sentença condenatória.

Falo do vídeo, que não mostrarei porque é impublicável, em que o cantor sertanejo Víctor Chaves tripudia sobre a pena que recebeu por ter dado chutes em uma mulher grávida. Quando atuava no júri, sempre que pensava em um exemplo concreto de covardia, imaginava a cena de um homem a chutar uma mulher grávida. Os jurados e as juradas concordavam: é realmente necessária uma covardia, mais do que aquela normalmente desprezível, para se chutar uma mulher grávida, pelas mais óbvias razões.

O cantor tripudia da condenação que sofreu e esse travo amargo hei de sentir, ele está certo. Depois de chutes na barriga de uma mulher grávida, a pena que lhe restou foi de ridículos 18 dias, quase um dia por chute que deu.

Não entendo como não passou pela cabeça dos operadores de direito que chutes na barriga de uma mulher grávida é, no mínimo tentativa de promover-lhe um abortamento, à evidência, sem seu consentimento. Ninguém leu o art. 125, do Código Penal? Ninguém se deu conta que uma mulher grávida atirada no chão e chutada poderia, ao menos, potencialmente sofrer a interrupção de sua gestação?

Que argumento canastrão é esse que não poderia ser ele enquadrado na Lei Maria da Penha, por não terem os peritos encontrado vestígios de agressão? Desde quando se há de exigir vestígios de agressão, para fins da Lei Maria da Penha, que visa justamente a proteção da mulher de relações abusivas e opressoras?

Uma única explicação apenas é possível: machismo, ainda que a sentença tenha sido prolatada por uma juíza de direito, motivo a se lamentar duplamente. O machismo não gera a impunidade, não alimenta a impunidade.

O machismo é a própria impunidade. Enquanto prevalecer, essas agressões e essas decisões, igualmente horrendas, se repetirão; ninguém precisa estimular o machista, ele vem já estimulado por uma licença para punir, agredir e matar, que imagina ter pela condição de macho que ostenta. Macho e covarde.

A cultura patriarcal é o berço dessa decisão, da qual se espera que alguém, com pensamento republicano e livre, venha a recorrer. O Ministério Público de Minas Gerais não pode, em hipótese alguma, deixar esse assunto transitar em julgado.

O raciocínio óbvio: se fosse ele negro e favelado, alguém cogitaria de presenteá-lo com vias de fato, ou estaria engrossando as estatísticas prisionais? Se ao invés de retirá-la de um elevador de luxo, ele o fizesse nas vielas imundas de uma comunidade abandonada de tudo, alguém pensaria em 18 dias, imediatamente convertidos em alguma pena alternativa?

Ou alguém está pensando que esse cantor ficaria mesmo seus módicos dezoito dias em cana? Ora, por favor, ele teve mil motivos para rir, imaginando dar um cavalo de pau na fazenda com um Camaro amarelo.

Há condenações que nos envergonham porque revelam perseguições ideológicas abjetas, que nos envergonham porque transformam o Direito Penal em instrumento de perseguição e de opressão, milhares delas. Mas, também existem as condenações que nos impressionam pelo seletivismo inaceitável e pela revelação das entranhas de um país dominado pelo preconceito e pela supremacia de gênero.

E eu que sempre odiei essa música sertaneja, do Camaro amarelo, passo a odiá-la ainda mais, porque é o veículo cultural dessa cultura machista, misógina e sexista. O sucesso dessas duplas sempre me aterrorizou.

Elas são as vias do retrocesso.

Redação

10 Comentários

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  1. Se fosse um petista, um pobre, um preto ou uma puta, os Bolsominions e os Coxinhas defenderiam que se cancelasse o CPF.

    Mas a indignação dessas lombrigas é seletiva.

    Então, não vão cancelar o CPF do Chutador?

    E ele riu da pena. É lindo para a cara do Judiciário.

  2. 1. Não existiu chutes na barriga de uma mulher grávida. Ele afastou ela do elevador com o pé. 2. O exame de corpo delito deu negativo (duvido que um chute na barriga passaria despercebido no exame). 3. Não se tratou da briga de um casal. A briga era entre nora e sogra, onde o esposo/filho tentou intervir. 4. A sogra poderia ter aberto um B.O. contra a nora, já que está destruiu bens em sua casa, mas preferiu dar a situação por encerrado (erro). Léo e família preferiram adotar um tom apaziguador, provavelmente por ter confiança na absolvição. Agora ele está pagando pelo fato.

    1. Não exatamente, Ives.
      A mãe do victor foi à casa do filho e tirou a criança da mãe, dizendo que esta não tinha competência para criar o próprio filho, e essa não foi a primeira vez que fez isso.
      A sogra queria se livrar da esposa do victor e ficar com a criança, por isso que ela, a esposa, saiu com a criança, desesperada, pedindo socorro para os porteiros no elevador.
      Ela contava contra si, com a cunhada, a sogra e o próprio marido, como se fosse uma família tribal.
      Assevere-se que não houve “tom apaziguador” por parte da família do victor. Só jogaram água na fervura enquanto tinha gente vendo.
      A esposa dele nunca deveria ter ido morar perto da família dele.
      Aumente-se ou não a pena do victor, nunca mais ele se recupera. Sua carreira foi pro buraco.

      1. Também achei esse caso todo uma pena.

        Sempre achei o Victor muito gente boa, além de bom musico, muito gentil e educado nos shows.

        Parece que realmente não tinha inteligência emocional suficiente, não soube se portar com relação a família. Jamais deveria ter botado para morar tão próximos assim, mãe e esposa, não tem nada a ver isso, mesmo que se dessem bem.

        E óbvio, jamais deveria ter partido para agressão.

        Também achei que a pena foi pequena, porém também não é o caso de se prender uma pessoa como ele, por isso. O certo seria uma alta indenização para a ex, e medidas protetivas para ele, e talvez os filhos.

      1. Po xará, concordo que o meu time, Vasco, anda fazendo pacto com o capeta, como pode ser constatado na parceria com o veio safado que se veste de ze carioca.
        Mas comparar os chutes de nossa defesa com os desferidos por este covarde fdp já é demais.

  3. A questão nesse caso não é necessariamente jurídica. Quanto custa um prêmio/perdão judicial? Sérgio Moro perdoou todos os pecadinhos dos criminosos tucanos e dos mafiosos prediletos de Jair Bolsonaro. Ele ganhou uma estadia no Ministério da Justiça.

  4. Revoltante , inaceitável , vergonhoso , triste , etc ..etc … esta decisão da juíza .
    Como está difícil viver neste país , convivendo com estas barbaridades , com toda a intolerância que reina e com um governo que estimula o confronto e não a paz , a destruição dos direitos obtidos pelos mais pobres , a maldita ” meritocracia ” e por ai vai.
    Pior ainda é pensar que esta situação ainda perdurará por muito tempo .
    Triste , muito triste .

  5. Uma vergonha, UM CAFAJESTE QUE AGE DE FORMA TRUCULENTA, “TIRANDO SUA ESPOSA GRAVIDA DO ELEVADOR, E QUANDO ELA JÁ ESTÁ NO CHÃO ELE AINDA A EMPURRA COM O PÉ”; e depois ainda “GRAVA UM VÍDEO DEBOCHANDO DO JUDICIÁRIO BRASILEIRO”. Por isso é que “””””””O STF PRECISA SE DAR AO RESPEITO”””””, E TOMAR PROVIDÊNCIAS, no sentido de PEDIR EXPLICAÇÕES a “BABACAS COMO ESTE Vitor Chavez”, e contra IGNORANTES como aquela moça de Santa Catarina TATHY FAVARETTO GIURIATTI, que: mais que DEBOCHAR DO STF, ACUSOU SEUS MINISTROS DE TEREM SE VENDIDO, e o atacou COM NOMES CHULOS; porque “POR MUITO MENOS QUE ISSO, MINISTROS DO STF COMO O BARROSO, O LEVANDOWISK E ETC; já disseram ofendidos”. – Será que o STF CONSIDERA AS OFENSAS DA DIREITA AO JUDICIÁRIO, COMO “”BRINCADEIRAS ENTRE VELHOS AMIGOS?”””

  6. A sentença é ridícula, uma afronta a todos, em especial às mulheres vítimas de violência doméstica q não se sentirão encorajadas a denunciar o agressor, principalmente se ele for da alta sociedade. Entretanto, o patético vídeo, q o cantor classificou como uma sátira (no planeta dele), foi divulgado em fevereiro de 2019, mto antes da sentença.

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