As gatas, ou de como as maracutaias nasceram, cresceram e tomaram conta do Brasil

Por Sebastião Nunes

A primeira gata criada por Deus tinha apenas duas tetas. Naqueles tempos, as fêmeas pariam só um filhote de cada vez. Então, para que mais tetas? Bastam duas, pensou sabiamente o Criador: enquanto uma amamenta, a outra se reabastece.

            Certo dia, no entanto, uma gata saiu do sério e pariu três filhotes. Ceguinhos, ás apalpadelas, arranhando-se ferozmente, com mais fúria do que seria razoável em seres recém-nascidos, os bichaninhos puseram-se a fungar em direção às minas de leite. Funga que funga, o primeiro – crau!, aferrou-se à primeira teta. Funga que funga, o segundo – crau!, aferrou-se à segunda teta. Quanto ao terceiro, fungou, fungou e afinal, cansado de fungar, foi mordiscar o rabo da mãe, buscando tirar leite dos pelos. Pesarosa, a pobre mãe apelou para o Criador:

            – Senhor todo poderoso! – exclamou ela. Me dê mais uma teta para que eu possa alimentar meu terceiro filhote.

            Condoído, fez-lhe Deus a vontade. E puseram-se os três gatinhos a mamar, a ronronar e a crescer.

AS GATAS DE SEIS TETAS

            Tendo crescido, um dos gatinhos, que era gata, arranjou um namorado. Esfregaram-se em cima dos muros e dos telhados e, certo belo dia, a jovem amanheceu com vômitos, soluços e vontade de comer bacalhau. O namorado, que não era besta, caiu fora, ficando a gata de três tetas a cuidar de sua filhota querida grávida. Foi assim que certo dia nasceram seis filhotes, lindinhos de morrer, três machos e três fêmeas. Funga que funga, lá se foram os ceguinhos em busca das maternais tetas. Cadê? Eram duas apenas. Entreolharam-se mãe e filha. Que fazer? A avó tinha três tetas, a mãe duas, cinco. Faltava portanto uma para ficar pau a pau. Apelaram de imediato para o Criador, que estava penteando a barba:

            – Senhor! – disseram elas.  Nos forneça mais sete tetas, para que possamos alimentar todos os nossos lindos filhotes!

            O Criador, que não era bobo, perguntou:

            – Mas por que as duas querem mais sete tetas? Aí serão doze tetas e os gatinhos são apenas seis.

            – Ah! – responderam elas. – É que pode acontecer visita de órfãos, podemos ter outros filhos, qualquer coisa do tipo. E se o Senhor foi capaz de criar três tetas para uma, pode criar quatro para a outra. Além disso, fica como no primeiro dia da criação: enquanto uma teta amamenta, a outra se reabastece.

            – De fato – concordou o Senhor. E criou mais três tetas numa gata e quatro na outra, de modo que ambas ficaram com seis. E fez mais: ordenou aos preguiçosos genes que desse dia em diante reproduzissem em todas as gatas as tetas recém-criadas.

 

CONTINUA FALTANDO TETAS

            Tendo seis tetas cada uma, as gatas, mãe e filha, puderam descansar e – como o ócio gera a sabedoria – chegaram a inventar o esporte olímpico chamado revezamento: um idiota sai correndo feito louco com um pedaço de pau. Quando está caindo de cansaço, aparece outro idiota pra continuar correndo com o pedaço de pau – e assim por diante. De forma que as gatas (e suas tetas) se revezavam no doce e aprazível esporte de amamentar os nenéns. Assim foram eles, os seis, mamando e crescendo, até que três filhotas ficaram de beiço caído por uns gatos saradões da vizinhança, e foi aquela esfregação infeliz, no alto dos muros e em cima dos telhados. E como tudo que começa mal termina pior, em outro belo dia – uma de manhã, outra de tarde e a terceira de noite – viram-se as gatinhas prenhas e mal pagas.

            Que fazer? Nada, ninguém faz nada nesses casos, a não ser ter desejos, enjoo, ficar de olho parado, engordar, tecer sapatinhos e toucas (ah, desculpe, isso era antigamente, hoje compram tudo pronto, até amor materno, em hipermercados), e esperar para ver no que ia dar. Foi assim que nasceram, de cada gatinha nova, doze lindos e robustos filhotes, lindos de morrer! Tão lindos que toda a vizinhança ficou babando de inveja. O único problema era alimentar trinta e seis gatinhos por três gatas com dezoito tetas. Mas tudo é possível, ou não é?

 

A REDISTRIBUIÇÃO DAS TETAS

            Recapitulemos. A primeira gata tinha só duas tetas. Ganhou mais uma, ficou com três, repassando duas para a primeira herdeira. As gatas de duas e três tetas ganharam mais sete, ficando ambas com doze, legando seis tetas para as filhotas. Mas as novas mães tinham seis tetas e doze filhos cada uma, criando sério problema de produção e distribuição de leite, ameaçando romper a bem costurada cadeia alimentar felina. Solução? Apelar para a graça divina, que nunca se cansava de vestir o roto e remendar o esfarrapado.

            – Senhor! – clamaram em uníssono. – Temos cada uma doze bocas para alimentar, mas apenas seis tetas cada! Sua Santíssima Graça poderia conceder-nos mais doze tetas per capita, de modo a termos dezoito tetas cada uma de nós?

            Deus chamou São Pedro e ordenou que reunisse o Conselho Tutelar. Contou aos conselheiros o caso de reivindicação de tetas, desde a primeira gata, aquela que tinha apenas duas tetas. E pediu a opinião do Conselho, pois alguma coisa não Lhe cheirava bem naquela história toda. Havia algo errado, tetas de menos ou filhotes demais – o que seria?

            Foi quando o Arcanjo Gabriel, o da Espada Chamejante, levantou o dedo e disse:

            – Até pode estar errado, Senhor, mas não há novidade alguma. O que está acontecendo com as gatas em geral é o mesmo que acontece no Brasil com as câmaras de deputados, o senado federal, o SFT, os tribunais menores e maiores, as câmaras de vereadores e qualquer outro órgão público, federal, estadual ou municipal.

            – Confesso que não entendi – disse Deus, confessando em público, pela primeira vez, sua ignorância em qualquer assunto existente ou por existir.

            – Muito simples, Senhor – explicou Gabriel. – Trata-se apenas do Milagre da Multiplicação das Tetas, um esporte nacional brasileiro praticado há séculos. Apenas um pequeno milagre, sem intervenção divina, e nada mais do que isso.

 

**********

 

Ilustração: colagem sobre a Loba Romana, aquela que amamentou os pais da pátria.

Sebastiao Nunes

4 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. A solução americana

     

    Os americanos solucionaram o problema da pobreza e de falta de recursos, de uma maneira surpreendente. A falta de “tetas para mamar”, não existe lá, vejam só a nova política americana:

    Atualmente, os políticos americanos pensam em aumentar o salário mínimo americano, de 10 dólares a hora, para 15 dólares por hora. O resultado, em todos os Estados que fizeram isto, foi o aumento imediato do desemprego, pois não podendo mais manter tantos funcionários, o empregador demite uma parte deles. Isto pode parecer mau, a princípio, mas vejam só a Sabedoria:

    Ao demitir uma parte dos empregados, o empregador os substitui por máquinas, que além de muito mais eficientes, não solicitam do governo nenhuma aposentadoria, nem direito social, ou auxílio médico. Produzem muito mais e custam muito menos ao país. Por estas e outras que a produtividade do trabalhador americano é cinco vezes maior do que a do brasileiro.

    E os desempregados que aumentaram? Simples, agora para resolver o desemprego, o governo está criando uma lei para banir todos os imigrantes ilegais, como tem feito na Flórida. Os imigrantes que se virem nos seus países de origem.  Aí o desemprego diminui nos EUA, e os americanos que ficarem trabalhando por lá ganharão mais, e as empresas terão mais máquinas, mais eficiência.

    Brilhante, Genial.

    1. Tão “brilhante e genial” que me deu até vergonha alheia de vc

      Ou do seu comentário, igualmente “brilhante e genial”.

      1. Solucionaram o problema, qual dos?

        Deve ser entao uma aparente e mera alucinacao minha. Se nao me engano vi um tal de Sanders da esquerda populista (para eles esquerda “radical” e independente) entre os “democratas” “competindo” ( leia-se angariando votos para) com a “Cassandra americana” (do “Sai de baixo”) ex do tarado-pelas-estagiarias da casa branca.

        Detalhe que o “empurraozinho” dele vai ser determinante na vitoria dela contra o  tio-patinhas-membro-da-klu-klux-klan-casado-com-uma-piriguete-o-Leste-Europeu-que-poderia-ser-sua-neta e no fim vai manter aquele sorriso dela bem preso na cara, tipico da mistura de botox com laquê.

        Ou seja, aos “desempregados” e em nome da modernidade, eficiencia e lisura das contas publicas da qual vc se refere – e da qual tb hipoteticamente uma sociedade circunscrita a um territorio tanto se beneficia – devemos ser gratos justamente pois sao provavelmente eles que elegerao o Sanders e que farao a diferenca dando a vitoria aos democratas. A eles somos gratos por adiarem o comeco de uma possivel 3 guerra mundial. Como os brasileiros mais humildes, nao saem na capa de revista mas estao escrevendo historia.

        Aos “Cruzes” e os “Rubios”, que nao passam de nomes latinos para engordarem a conta de votos do Trump, inclusive papel parecido ao do comentador, damos os nomes de traidores e carrascos e lhe guardamos aquele lugar especial na historia: o do esquecimento.

  2. já tenho um título para esse

    já tenho um título para esse ótimo texto, título

    parafraseado de tenesse willians –

    gatas e gatos de togas em

    tetas de vinco quente….

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador