“O vento que passa”, por Alberto Caeiro

Enviado por Gilberto Cruvinel

O Guardador de Rebanhos

Poema  X

Olá, guardador de rebanhos,

Aí à beira da estrada,

Que te diz o vento que passa?

 

Que é vento, e que passa,

E que já passou antes,

E que passará depois.

E a ti o que te diz?

Muita coisa mais do que isso,

Fala-me de muitas outras coisas.

De memórias e de saudades

E de coisas que nunca foram.

 

Nunca ouviste passar o vento.

O vento só fala do vento.

O que lhe ouviste foi mentira,

E a mentira está em ti.

……………………………………………………………………………………………..

“O Guardador de Rebanhos”. In Poemas de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa. (Nota explicativa e notas de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1946 (10ª ed. 1993). – 40.

“O Guardador de Rebanhos”. 1ª publ. in Athena, nº 4. Lisboa: Jan. 1925.

 

Redação

8 Comentários

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  1. Há uma linha em branco depois do verso “E a ti o que te diz?”

    Há uma linha em branco depois do verso  “E a ti o que te diz?” para marcar a mudança de interlocutor no diálogo que constitui o poema.

  2. Estou lendo poemas

    Estou lendo poemas selecionados de Fernando Pessoa.

    Alberto Caeiro é um dos Heterônimos de Pessoas,  está ligado à natureza.

    Alvaro de Campos e Ricardo Reis, são outros heterônimos 

    O interessante, é que os heterônomios criticam o autor.

     

    1. Os heterônimos são personalidades autônomas e independentes

      A professora Cleonice Berardinelli, maior especialista pessoana no Brasil, no CD/DVD “o vento lá fora” com poemas de Fernando Pessoa e heterônimos que ela gravou com Maria Bethânia, diz:

      – Fernando Pessoa, ele mesmo, nunca disse palavrões, quando há um palavrão ele deixa pro Álvaro de Campos. Álvaro de Campos diz alguns e há um pesado que ele diz com todas as letras no começo do poema.

        1. Também não consegui ainda

          Também não consegui ainda identificar. Esta fala de Cleonice no DVD está logo antes da leitura do Poema em Linha Reta, mas nele não há palavrões.

          Há um soneto inédito do Pessoa, descoberto recentemente e publicado pela Granta Portuguesa onde há a palavra “cú” em um poema de Pessoa, o que aparentemente desemente a teoria de Cleonice.

           

          Fernando Pessoa
          Alma de Côrno

          .

          Alma de côrno – isto é, dura como isso;
          Cara que nem servia para rabo;
          Idéas e intenções taes que o diabo
          As recusou a ter a seu serviço –

          .

          Ó lama feita vida! ó trampa em viço!
          Se é p’ra ti todo o insulto cheira a gabo
          – Ó do Hindustão da sordidez nababo!
          Universal e essencial enguiço!

          .

          De ti se suja a imaginação
          Ao querer descrever-te em verso. Tu
          Fazes dôr de barriga á inspiração.

          .

          Quér faças bem ou mal, hyper-sabujo,
          Tu fazes sempre mal. És como um cú,
          Que ainda que esteja limpo é sempre sujo.

          1. Mas esse soneto é um poema menor…

            Nao me espanta que Pessoa o tenha querido inédito. Ao passo que o “merda”, do “merda, sou lúcido”, é um final magnífico para o poema.

  3. S Pessoa tivesse escrito em outra língua seria considerado gênio

    da humanidade. Mas o Português, como dizia Eça de Queiroz, é o túmulo do espírito humano (aviso: nao estou dizendo isso por qualquer atribuiçao de características à língua em si, mas apenas pelo fato dela ser bastante desconhecida; se Pessoa tivesse escrito em inglês, francês, ou mesmo espanhol, seria tao famoso como Shakeaspeare ou Baudelaire).

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