Professor e escritor Joel Rufino dos Santos morre no Rio

Enviado por Mara L. Baraúna

Historiador era diretor do Tribunal de Justiça do Rio, que lamentou a morte. Autor foi premiado por obras como ‘Uma Estranha Aventura em Talalai’.

do G1

Professor e escritor Joel Rufino dos Santos morre no Rio

O professor, escritor, jornalista e historiador Joel Rufino dos Santos morreu nesta sexta-feira (4), por complicações de uma cirurgia cardíaca realizada no dia 1º de setembro. Rufino era diretor-geral de comunicação e de difusão do conhecimento do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que lamentou o falecimento. Ele estava internado na Clínica de Saúde São José, no Humaitá, Zona Sul.

Rufino ganhou o Prêmio Jabuti em 1979 e em 2008 (com as obras “Uma Estranha Aventura em Talalai” e “”O Barbeiro e o judeu da prestação contra o Sargento da Motocicleta”, respectivamente).

Joel nasceu em 1941, em Cascadura, no Subúrbio do Rio. Mudou-se para o bairro da Glória e cursou História na Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil, onde começou a dar aulas. Por conta do golpe militar de 1964, que implementou a ditadura, Joel deixou o Brasil. Morou na Bolívia e no Chile.

De volta ao Brasil, chegou a ser preso por conta da perseguição política. Como autor, venceu o Prêmio Hans Christian Andersen, considerado o Nobel da literatura infanto-juvenil. Casado com Teresa Garbayo, ele deixa dois filhos e quatro netos. Ainda não há informações sobre o velório e funeral. Em 2008, Joel foi entrevistado para o blog Máquina de Escrever, de Luciano Trigo. Confira algumas das respostas.

G1: Você viveu exilado no Chile e na Bolívia após o golpe de 64. Conte alguns episódios e encontros que o marcaram, no exílio.

RUFINO: Dos poucos meses que passei na Bolívia, me impressionou a mudez de seus índios. Logo compreendi que era uma defesa antiga, vinda da época da Conquista: eles só eram mudos com os que vinham de fora. O altiplano, para brasileiros, é fantástico: as neves eternas, os lagos gelados, as aldeias esparsas… Vi de perto a combatividade das suas lideranças camponesas. Quanto ao Chile, se tornou minha segunda pátria, embora me sinta internacionalista. Ali conheci Thiago de Mello, nosso adido cultural na época, um semeador de amizades. Tínhamos um time, o Pedaço de Mundo. No Chile conheci também Pelé, que tem a minha idade, numa excursão do Santos. Achei que se, além de tudo, ele fosse politizado, seria Deus.

G1: Após voltar ao Brasil, veio a prisão. Que resumo pode fazer dessa experiência?

RUFINO: Voltei do exílio em 1966. Até 1972, conhecei prisões breves e leves. De 1972 a 1974, cumpri pena da Justiça Militar. Passei pelo Doi-Codi, em São Paulo, assisti à morte na tortura de Carlos Nicolau Danielli, vi e ouvi dezenas de outros presos sendo torturados. Tive o meu quinhão de socos e choques elétricos, mas não conheci o pior, a “cadeira do dragão”. É uma experiência inenarrável, no limite do humano. Quem a experimentou, em si ou nos companheiros, não sabe dizer qual é a natureza do torturador. Agora que a Justiça começa a julgá-los, alegam que torturaram em defesa da pátria. Que criaturas são essas?

G1: Nos últimos anos o debate sobre racismo tem crescido no Brasil. Como avalia esse tema, especialmente em relação à questão das cotas?

RUFINO: A ação afirmativa, que serve de base aos sistemas de cotas regionais, raciais, de gênero etc é um princípio democrático. O Estado corrige injustiças ao estabelecer condições justas de concorrência na luta pela vida. Sou, portanto, a favor, embora reconheça efeitos colaterais indesejáveis na aplicação do sistema. Mas um jovem branco que se sinta preterido pelas cotas é, por isso mesmo, capaz de entender a histórica preterição do negro na universidade, na diplomacia, na política e na iniciativa privada.

Redação

8 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Ainda recentemente o portal

    Ainda recentemente o portal carta maior publico notícia que o Joel Rufino salvou uma pessoa de linchamento no Rio de Janeiro e fez um relato de sua vida cheia de vicicitudes. Joel escreveu artigo par revista caros amigos com uma beleza impar. É um brasileiro que fará falta. 

    Link: http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Direitos-Humanos/Historiador-impede-linchamento-enquanto-policial-assistia-ao-massacre/5/34343

  2. Dentre

    um montão de notícias chatas essa foi a mais chata para uma sexta-feira chata.

    Humano, Gentil, Fino, Bacana pra caramba.

    Se tem algum lugar legal, sabe-se lá aonde, é pra lá que tu vai. Agora estás imortal.

  3. lamentável a perda desse
    lamentável a perda desse grande brasileiro. Dias atrás deu um exemplo impar de como era constituído ao defender uma pessoa de linchamento. Fará falta ao país por sua postura sempre em defesa do povo e dos mais carentes.

  4. Joel Rufino dos Santos por Luiz Antonio Simas
     

    Luiz Antonio Simas

    5 min ·  

    JOEL RUFINO DOS SANTOS

    Em um momento de indefinição na minha carreira profissional, eu era um moleque branco azedo (continuo desbotado, mas não sou mais moleque), que queria largar a academia e estudar samba, futebol, rua e macumba. O problema é que não sentia confiança em embarcar nessa canoa. Um pequeno gesto, todavia, alterou os rumos da minha vida.
    O responsável foi Joel Rufino dos Santos, que nos deixou hoje. A pedido da querida Anita Mantuano (a quem devo muito e que já… foi embora também), Joel montou um grupo para participar de um encontro cultural em Casimiro de Abreu, falando sobre samba, futebol e educação. Para minha surpresa, Joel disse gostar das coisas que eu andava matutando e me convidou para ser o mascote da turma, ao lado de Nei Lopes, Zizinho (o Mestre Ziza) e Afonsinho.
    O mestre confiou no moleque num momento em que eu não botava a menor fé no que fazia e me enfiou entre as cobras criadas. Eu fui em frente. Aquele fim de semana em Casimiro, certamente trivial para os mestres, foi crucial para o aprendiz.
    Na semana passada, poucos dias antes de se internar, Joel me chamou para uma conversa, falou da operação e me convidou para coordenar um trabalho – um fuzuê – sobre a Lei do Ventre Livre e os dilemas do processo de abolição da escravatura no Brasil. Ele, em virtude da saúde, não poderia levar adiante o projeto e queria que eu assumisse isso. Eu prometi tocar o barco, agradeci pela confiança de sempre e desejei sorte na operação. Ele não falou nada e nos abraçamos carinhosamente. Foi a despedida.
    Continuo ciente de que meu trabalho não é tributário de qualquer talento especial (conheço minhas limitações, o tempo amansou vaidades e, por outro lado, não sou mais tão inclemente com as minhas falhas). Ouso dizer, todavia, que duas qualidades me acompanham e são elas que me amparam: eu sou feito profissionalmente de gratidão e esforço.
    Esse relato é apenas um registro simples da história de um homem comum que teve a sorte de conviver com um gigante.
    Eu contarei um dia as histórias de Joel Rufino dos Santos para o meu filho.

     

  5. Saiu uma notícia há uns dias

    Saiu uma notícia há uns dias que Joel Rufino impediu o linchamento de um jovem na zona sul do RJ.

    Ele se identificou como funcionario do TJRJ, e impediu o massacre, solicitando a presença da policia.

    Independente  de que o jovem fez, foi um belo gesto

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador