Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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Rei do Camarote e Huck “Gigante”: bombas semióticas na guerrilha dos memes

 

Uma semana depois do contra-ataque involuntário às bombas semióticas do Enem feito por um estudante que simulou ser um candidato atrasado, veio a reação: uma nova bomba semiótica, dessa vez em um novo front, ainda mais letal por atingir dessa vez a percepção e a memória, instâncias pré-linguísticas. O vídeo do “Rei do Camarote” transformou-se em novo meme que explode em uma guerrilha memética cujo ponto de partida foi o filme publicitário “Gigante” protagonizado pelo apresentador Luciano Huck: memes intencionalmente elaborados para tornar o contínuo midiático ainda mais tenso e pesado.

A proximidade do final do ano e a lembrança que também nos aproximamos da Copa do Mundo e eleições presidenciais, está tornando cada vez mais pesada a atmosfera midiática nacional. Toda semana novos petardos de bombas semióticas cada vez mais sofisticadas são disparados no imaginário social, politicamente cada vez mais turvo e tenso. Se na semana anterior acompanhamos um contra-ataque do que chamamos de “bomba pós-moderna” (a simulação de um estudante que se passou por candidato atrasado na prova do Enem e que colocou a nu o mecanismo de montagem das bombas semióticas – clique aqui para ler), nessa semana tivemos a resposta imediata que abre um novo front de batalha ao lado das guerrilhas semiológicas: as guerrilhas meméticas.

Muito se fala de uma guerra memética desde o cenário aberto nas manifestações de junho. Mas, assim como no Marketing, nesse novo campo de guerrilha procuram-se agora criar memes artificiais. É o caso da matéria apoiada por um vídeo sobre o chamado “Rei do Camarote” publicado pela “Vejinha” ou Veja São Paulo.

“Rede”: meme dos apoiadores
da Rede Sustentabilidade de
Marina Silva?

Esse caso é a confirmação de uma tendência iniciada pelo filme publicitário “Gigante” criado pela agência de publicidade DPZ em setembro. Nele vemos um comercial do cartão de crédito Hipercard do Itaú e o apresentador Luciano Huck como um gigante caminhando pelas cidades do Rio de Janeiro, Recife, São Paulo e Porto Alegre. Isso em plena efervescência das manifestações e da metáfora do “gigante acordou” nas hashtags das redes sociais. Claramente, a criação pega carona no clima político reinante.

A coisa torna-se ainda mais turva quando o jornalista Luiz Nassif aponta para o sincronismo entre a Rede Sustentabilidade de Marina Silva, Itaú e Natura com a mesma imagem – principais apoiadores da candidatura de Marina Silva, o Itaú muda o nome “Redecard” para “Rede” e a Natura enaltece suas consultoras dando destaque à palavra “Rede” no material publicitário – clique aqui para ler.

Portanto, estamos diante de uma novidade na guerra que se trava no contínuo midiático atmosférico: a guerrilha memética com novas bombas semióticas que não mais trabalham com retórica e persuasão no sentido clássico, mas agora com percepção e memória.

A ambiguidade do “Rei do Camarote”

O caso do “Rei do Camarote” parece confirmar a psicologia do rumor descrita por Gordon Allport e Leo Postman em 1947 que apontam dois fatores que impulsionam um boato que poderia ser sintetizado na seguinte fórmula:

A = i X a

Onde /A/ de alcance é igual à /i/ de importância multiplicada por /a/ de ambiguidade. O alcance de um boato (e modernamente de um meme) é determinado pela sua importância (o fator novidade não no sentido tradicional jornalístico, mas de bizarrice, inesperado) multiplicado pela ambiguidade – o fato é tão inesperado e bizarro que se cria a ambiguidade: é real ou falso? Alexander de Almeida realmente existe?

A performance overacting do personagem, o fato dele estar sempre dançando sozinho, a mão pesada da edição do vídeo (a composição dos planos são muito estereotipados – o personagem posando ao lado de baldes de champanhe, planos detalhe das pernas de mulheres no camarote, planos de câmera em contra-plongees do personagem segurando garrafas de bebidas caras, os vários planos visivelmente posados etc.), o fato de o personagem ao final de cada frase dar um sorriso forçado ao estilo Narcisa Tamborindeguy, tudo isso somado confere uma atmosfera ambígua – além da vergonha alheia ao personagem.

A ambiguidade do vídeo (no espectador cria-se uma confusão de registros entre o jornalístico, o cênico e o espontâneo) transforma-o em meme. Propositalmente o vídeo transita entre o jornalístico e o que em cinema chama-se mockumentary – estilo de filme onde eventos ficcionais são apresentados em estilo documental. Em outras palavras, o vídeo pegou um personagem real para representá-lo em linguagem ficcional, numa tal simbiose que se cria uma forte ambiguidade que, para Portman e Allport, seria o elemento propulsor de boatos, mentiras e memes.

Mas ao contrário dos memes espontâneos, esse possui intencionalidades, a primeira delas mais óbvia: a mercadológica, demonstrada na resposta que a revista deu à suposta falsidade do personagem – “quando uma pessoa vira personagem de uma capa da Veja São Paulo é comum que sua vida mude bastante depois que a revista começa a circular”. O personagem é sucesso porque a revista é sucesso, quis dizer a redação da revista.

A segunda, mais imediata: a riqueza do protagonista vem da recuperação de frotas de veículos de pessoas físicas e jurídicas inadimplentes – ecos de uma suposta conjuntura de crise econômica, quadros inflacionários e recessivos que o descontrole fiscal e cambial estaria provocando no País. O “Rei do Camarote” se associa à imagem do colar de tomates no pescoço da apresentadora global Ana Maria Braga, esse um meme mal sucedido na tentativa de criar uma bomba semiótica de um suposto abismo econômico nacional.

A terceira é mais profunda e preocupante: embora a ostentação desavergonhada de quem fala que gasta 70 mil em uma noite em um camarote de balada cause vergonha alheia e indignação moralista, quem desdenha quer comprar… e principalmente a nova classe média criada paradoxalmente pelo sucesso econômico que o vídeo quer desmentir: novo grupo social que foi integrado à sociedade de consumo por meio do crédito e facilmente seduzido por esses ícones de status e prestígio. Sua mobilidade social foi mais rápida que sua consciência de cidadania, seu poder de compra veio primeiro que a consciência política. Contradição com a qual a Esquerda terá que enfrentar em um futuro muito próximo. A intencionalidade profunda dessa vídeo/meme sabe disso e aposta nos frutos dessa contradição.

Luciano Huck e o meme do “Gigante”

O início dessas novas bombas semióticas criadas para o front das guerrilhas meméticas certamente está no filme publicitário “Gigante” onde Luciano Huck pega carona na metáfora do “gigante acordou” das manifestações de rua de junho. Mais do que uma estratégia de marketing oportunista (aproximar um cartão de crédito ao público jovem que saiu às ruas), há também as ambições políticas e lobistas do próprio apresentador (sobre isso, clique aqui) e as incursões partidárias do Itaú ao apoiar a Rede Sustentabilidade de Marina Silva.

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Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

20 Comentários

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  1. Eu acho que vocês estão exagerando

    Quem tem medo de fantasma se assusta com qualquer sombra.

    Associar um Luciano Huck gigante e um cartão de crédito com “O Gigante Acordou” das manifestações, na minha opinião, exige uma certa dose de imaginação que dificilmente se encontra em quem está assistindo televisão. O Brasil sempre foi gigante na cabeça de qualquer brasileiro desde a infância. Está no nosso hino nacional, nas propagandas do governo, etc, etc.

    1. REDE

      O GIGANTE  enfatiza o Brasil.  A “REDE” utilizada atualmente nos comerciais do Itaú e Natura, leva à associação da REDE da Osmarina.  Não precisa ser uma pessoa muito desconfiada para perceber. Antes, desse comercial, o Itaú fazia um comercial baseado na “mudança”. Havia até um telefone disponível que ao passar uma mensagem com a palavra “MUDE”, poderia  se ouvir a música de fundo do comercial. Essa lavagem cerebral começou no meio deste ano, logo após as manifestações e as investidas do “Change Brazil”.

    2. Acorda

      Mardone, vc que precisa acordar. Tudo acontece de forma bem subliminar, mas tudo tem base na semiótica, estudo um pouco sobre esse assunto(semiótica)

  2. Quem conheçe de perto a

    Quem conheçe de perto a exploração do Itáu aos seus funcinários passaria bem longe desse banco.  O Tucano Huck ganha uma grana preta, e quem paga o pato são os funcinários do Itáu, que tem que bater metas absurdas para bancar a mordomia de poucos da casa grande. 

  3. O Tucano Huk é um bombardeio

    O Tucano Huk é um bombardeio semiótico, Wilson. Estava eu assistindo o Globo Esporte, e no intervalo veio um anuncio da Coca-cola com ele, o narigudo, e em seguida o do Itaú. É bom então prestar atenção na Coca-cola também.

    E o interessante é notar que o anuncio do gigante, apropriado (roubado mesmo) pelo Itaú, era em princípio “a favor” do governo. Era uma empresa estrangeira constatando admirada o despertar do gigante, subentendendo-se que graças aos governo (petistas) da última década. Nem era preciso que o anuncio tocasse remotamente nisso. Foi uma bomba semiótica expontânea, certo? Não se tem notícia de aproximação da Jonny Walker com o governo, né?

    Agora, se a comunicação do governo Dilma não atentar para essa guerra semiótica, perderá irremediavelmente essa poderosa metáfora do gigante despertando para a oposição.

    Outra coisa que gostaria de comentar é a posição do Dudu. Será que o convite ao Gil para ser candidato a governador do Rio, não seria ele entrando nessa seara, tipicamente “marineira’? Já que ela invadiu o seu espaço, o da estrutura partidária real e pragmática, ele contratacou. Com uma bomba semiótica, claro. Muito dificilmente o Gil vai entrar nessa roubada

    1. “Foi uma bomba semiótica

      “Foi uma bomba semiótica expontânea, certo? Não se tem notícia de aproximação da Jonny Walker com o governo, né?”:

      Nao, so com o senador de Minas.

  4. Requiem para Goebbels

    O Serra usou esse estratagema  quando a Patricia Amorim mudou as cores rubro-negra do flamengo pelas que rememoravam o dístico tucano amarela e azul.

  5. Requiem para Goebbels

    O Serra usou esse estratagema  quando a Patricia Amorim mudou as cores rubro-negra do flamengo pelas que rememoravam o dístico tucano amarela e azul.

  6. “A terceira é mais profunda e

    “A terceira é mais profunda e preocupante: embora a ostentação desavergonhada de quem fala que gasta 70 mil em uma noite em um camarote de balada cause vergonha alheia e indignação moralista, quem desdenha quer comprar… e principalmente a nova classe média criada paradoxalmente pelo sucesso econômico que o vídeo quer desmentir: novo grupo social que foi integrado à sociedade de consumo por meio do crédito e facilmente seduzido por esses ícones de status e prestígio. Sua mobilidade social foi mais rápida que sua consciência de cidadania, seu poder de compra veio primeiro que a consciência política. Contradição com a qual a Esquerda terá que enfrentar em um futuro muito próximo. A intencionalidade profunda dessa vídeo/meme sabe disso e aposta nos frutos dessa contradição.”

     

    Repetição do período do Milagre Econômico, prosperidade material sem contrapartida na cidadania.

    Interessante o caso brasileiro, uma ditadura direitista e uma Democracia de esquerda chegam aos mesmos resultados. Parece que a falta de cidadania está enraizada na cultura brasileira. é a ética de Gerson, o individualismo desenfreado.

  7. Uma semana mais tarde:
    Alguem

    Uma semana mais tarde:

    Alguem sabe se o Rei do Sonegometro, digo, da Balada, pagou os 55 mil reais de IPTU que ele deve?

    Ou ele tambem ja comprou alguem na prefeitura?

  8. Certos personagens realmente

    Certos personagens realmente espantam, o que a publicidade brasileira ve nesse narigudo sem nenhuma graça, charme ou apelo? Por ai se entende o ABISMO em que esta a propaganda no Brasil, cantada em prosa e verso como uma das melhores do mundo, deve ter perdido a partitura, o que se vê hoje é uma chocante MEDIOCRIDADE, anuncios piadistas sem nenhuma gra, pegadinhas, caras gastas como esse intragavel Faustão, tudo muito vulgar, feio, antiestetico, pobre de espirito e especialmente de mau gosto.Uma propaganda cansada, sem estilo ou apelo, se calça com esses narigudos e cafonas poque ao menos não usam mais mulheres bonitas, só homens feios?

    1. Mulher bonita sempre vai bem,

      Mulher bonita sempre vai bem, mas não precisa dessas coisas pra fazer propaganda boa.

      O próprio Luciano Huck já fez umas muito boas. Eu lembro de uma em que ele vai comprar um chinelo e tem uma moça muito alta do lado dele comprando um chinelo tamanho grande. O Luciano olha para o chinelo e pergunta à moça se é para o namorado, e ela diz que é para ela mesmo. Aí ela vê ele comprando um chinelo pequeno e pergunta se é para a namorada, e aí ele diz com voz triste: “não, é para mim mesmo”. Na minha opinião ficou muito bem feita.

  9. Um novo Silvio Santos

    Para o PIG, Hulk poderia vir a fazer o papel de Silvio Santos das eleições de 89, quando a direita estava com medo do Brizula (daria Brizola ou Lula). A direitona soltou balão de ensaio com Silvio Santos e até com o Pelé. O “patrocinador” do Silvio Santos era o Lobão, sim, o mesmo! O atual Ministro das Minas e Energia.

    O Silvio Santos foi dispensado quando surgiu a figura salvadora (salvadora naquele momento) do Collor, e que depois foi descartado, antes de concluir o seu governo, pelo novo risco do fator Brizula nas eleições de 2003.

     

  10. O texto é uma Ode ao

    O texto é uma Ode ao nada.

    ……………….

    Se Marina Silva, Aécio, Campos são uns desqualificados pq tanta preocupação e tanto texto sobre eles?

  11.  
    Esse tal de Luciano é um pé

     

    Esse tal de Luciano é um pé frio, geladissimo.

    Faz propaganda do pior banco que existe, o mais fascista de todos

    Faz propaganda para a pior empresa de telefonia, a mais cara

    e agora esqueceu de dizer que dentro das garrafas de refri tem rato.

     

    Vai ser pé-frio assim na groelandia.

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