Aquiles Rique Reis
Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.
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Louco amor

“Sua voz é doce, encorpada; o timbre, grave, agradável; a afinação, acurada; as divisões rítmicas, cuidadosas; a pronúncia, impecável; a instrumentação, concisa.” Com essas palavras eu iniciei meu comentário sobre o disco “ChansonFrançaise2”, de Fábio Jorge, a quem à época enalteci como o chansonnier do século 21.

Ao lançar agora “Edith” (independente, com produção de Bruno Pompeu), Fábio está melhor, já que a tudo ele adicionou o seu amor delirante por Edith Piaf. Louco amor que permite desvarios; amor ensandecido que trisca a extravagância sem, no entanto, se importar que assim pareça. Salve o intérprete que ousa aloucar em nome de uma paixão. Amor barroco, rococó… Amor eterno. Amor sem eira nem beira, desacorçoado amor. Fábio Jorge ama Edith.

Ao vê-lo refletir sua música à sua imagem e semelhança, Edith Piaf também amaria Jorge. Vendo-o derrubar barreiras em busca de declarar-lhe seu amor, Edith ofereceria ao chansonnier seus versos de “L’hymne à L’amour”: “Peu m’importe lesproblemes/ Monamour, puisque tu m’aimes”.

Ao que ele gritaria: “Que me importa a vida tediosa, posto que há o seu amor? Pouco importa a solidão, esse amor avassalador me preenche e gratifica”.

Os arranjos de base, criados pelo pianista Alexandre Vianna, somados aos arranjos para cordas, escritos por Daniel Bondaczuk (ele que coproduziu o trabalho), reproduzem, fielmente, a declaração de amor musical pretendida por Fábio.

Pode-se até dizer que, aqui e ali, há algum exagero na dramaticidade quase teatral no uso das cordas e do coro – louco amor, não há excesso onde palpita uma candente paixão.

Pode-se até achar meio overa grandiloquência expressa na voz de Fábio Jorge – ah, o amor! Não cabe comedimento ao proclamá-lo. Derramado em prantos ou em risos nervosos, o que importa é narrá-lo, fazer com que a musa inspiradora derreta-se por ele, e, se possível, que o retribua com igual intensidade.

 “L’acordéoniste” (Michel Emer) é uma das belas canções do CD. Lá está, como se à beira do rio Sena, o acordeom de Toninho Ferragutti, e também o baixo acústico de Decko Telles e o piano vigoroso de Alexandre Vianna. Grande arranjo. Fábio arrasa na calorosa interpretação dos versos.

Também de Michel Emer, “À QuoiÇaSertL’amour”, um animado cancã, é destaque pela presença de Claudette Soares. Seu duo com Fábio é pleno de graça. O clarinete de Ubaldo Versolato dá ainda mais charme à música.

“La Vieen Rose” (Louiguy e Edith Piaf) tem o flugelhorn como protagonista do arranjo. Fábio canta como se olhasse nos olhos de Piaf. Acho que, ao final, ela pisca o olho para ele… Louco amor.

Mesmo uma declaração de amor, alegre ou triste, tem de ter um ponto final. Para tal, Fábio sabiamente escolheu “L’hymne à L’amour” (Marguerite Monnot e Edith Piaf), ode ao amor louco varrido que, buscando o sonho impossível, encontra a realidade e, reverente, atira-se a seus pés.

Salve o cantor popular que se rende ao delírio de fazer do seu amor um canto maior.

Aquiles Rique Reis

Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.

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