Urariano Mota
Escritor, jornalista. Autor de "A mais longa duração da juventude", "O filho renegado de Deus" e "Soledad no Recife". Também publicou o "Dicionário Amoroso do Recife".
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O homem na Lua e Gagarin, por Urariano Mota

Para os muito jovens ou os mais velhos de fora do Recife, esclareço que Yuri Gagarin foi homenageado com um frevo-canção de se cantar até o enjoo, que não chegava nunca.

O homem na Lua e Gagarin

por Urariano Mota

Quem passar pelo Google nesta sexta-feira 19/07/2019, encontrará um depoimento gravado de Mike Collins, astronauta da Apolo 11, com imagens animadas. 

Em sua fala, Mike Collins lembra: “Ainda que a visão de perto dessa Lua fosse incrível, ela não se comparava à visão da pequenina Terra ao longe. A Terra era o verdadeiro espetáculo”.  Em todo depoimento gravado no google, e neste ponto em particular, Mike Collins “esqueceu” Yuri Gagarin. Esqueceu apenas o primeiro homem que em 1961, lá do alto, falou a mais linda frase sobre o nosso planeta: “A Terra é azul”. 

No entanto, o que nestes 50 anos do homem na Lua está oculto, foi um acontecimento de repercussão mundial, popular até o ponto de se tornar sucesso do carnaval do Recife em 1962. No Dicionário Amoroso do Recife, publiquei:

“Quando pesquisamos, em todos os lugares nos informam que Yuri Gagarin foi o primeiro homem a completar uma volta em torno da Terra, lá fora no espaço, em 12 de abril de 1961. Nesse dia de 61, Yuri Gagarin deu um grande salto para a humanidade. Um feito heroico, histórico, é o que lemos nas fontes mais universais. Dizem até que a pequena estatura de Gagarin contribuiu para o seu grande feito, uma vez que ele circulou em uma nave apertada. Mas a gente consulta, pesquisa nos mais diversos arquivos, e ninguém fala que o astronauta Yuri Gagarin passou uma vez no Recife. 

Entendam. Não quero dizer que a nave soviética tenha passado acima do Brasil em 1961, e numa pontinha do litoral sobre o Recife, quem sabe lá em cima de Água Fria, do espaço Gagarin nos tenha enviado um oi em russo, algo como um “pri-vet”. Eu quero dizer é que o magnífico Yuri Gagarin, depois de 1961, mais precisamente no carnaval de 1962, passou em disco de vinil e terrestre em todas as rádios de Pernambuco. Em selo Mocambo, da fábrica de discos Rozenblit, o seu nome foi sucesso absoluto nas emissoras do Recife e na boca do povo já um mês antes do carnaval. E mais ainda, do sábado de zé-pereira em diante. 

Para os muito jovens ou os mais velhos de fora do Recife, esclareço que Yuri Gagarin foi homenageado com um frevo-canção de se cantar até o enjoo, que não chegava nunca. Sabem aquela música que a gente repete, canta, cantarola até quando não se dá conta, feito anúncio de coca-cola? Assim foi com o frevo-canção “A lua disse”, de Gildo Branco. Como o livro em papel não tem a voz do frevo no rádio, copio a letra aqui:  

“Gagarin subiu, subiu, subiu 

Foi até ao espaço sideral 

Chegou perto da lua e sorriu 

‘Vou embora pro Brasil 

Que o negócio é carnaval’ 

 

A lua disse 

‘Não vá, demore mais 

Já ouvi que lá na Terra 

Querem me passar pra trás’ 

Mas o Gagá nada ligou e deu no pé 

‘Vou mesmo pro Brasil 

Eu quero é conhecer Pelé’”….. 

Vocês entendem agora como Gagarin passou pelo Recife. Eu deveria mesmo dizer que o astronauta não passou uma vez só no Recife. Continua a passar até hoje, enquanto carnaval houver na terra para escutar “Gagarin subiu, subiu, subiu, foi até ao espaço sideral”. Os jornais, os arquivos informam sempre que Gagarin, ao ver o mundo lá do alto, foi poético ao falar “a Terra é azul”. É verdade. Mas a ciência erra ao insinuar que a lua teria ficado muda e imóvel diante do astronauta. Segundo Gildo Branco, naquele momento máximo a lua disse: “Não vá, demore mais, já ouvi que lá na Terra querem me passar pra trás”. Ao que Gagarin respondeu: ‘Vou embora pro Brasil, que o negócio é carnaval’ ”.

Quando veio 1969, houve na retórica um grande passo para a humanidade, mas ao mesmo tempo houve um pequeno passo para a confraternização entre os povos. Mike Collins, na fala exibida no google, não fez nem disse qualquer agradecimento a Yuri Gagarin. Mas Lua disse  

*Vermelho http://www.vermelho.org.br/coluna.php?id_coluna_texto=10083&id_coluna=93 

Urariano Mota

Escritor, jornalista. Autor de "A mais longa duração da juventude", "O filho renegado de Deus" e "Soledad no Recife". Também publicou o "Dicionário Amoroso do Recife".

4 Comentários

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  1. Terra, Terra, por mais distante o errante navegante, quem jamais te esqueceria?

    O Caetano, não, pois o Levi Strauss detestou a Baia de Guanabara

  2. Mas, se a Lua disse que sabia que na Terra queriam passá-la para trás, esse frevo nao deve ter sido a primeira cançao sobre o tema. Me lembro bem de uma outra que dizia “Lua, ó Lua, querem te passar pra trás/ Lua, ó Lua, querem te roubar a paz/ Lua que no céu flutua/ Lua que nos dá luar/ Lua, ó Lua/ Nao deixa ninguém te pisar”. (Essa era a segunda estrofe. A primeira, que valia tb como uma espécie de estribilho, dizia: “Todos eles / estao errados / A Lua é, é / Dos namorados (bis)”.)

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