Acervo de J. Carlos é adquirido em comodato pelo Instituto Moreira Salles

Cartunista é um dos principais cronistas visuais do Brasil na primeira metade do século XX

 

Desenho de J. Carlos para a capa da revista ‘Careta’, de outubro de 1943: – Coleção Eduardo Augusto de Brito

 

por Maurício Meirelles – O Globo

RIO— Ele é um dos principais cronistas visuais do Brasil do século XX. Agora, quem quiser rever a produção de José Carlos de Brito e Cunha, o cartunista J. Carlos (1884-1950), vai poder encontrá-la toda em um só lugar. O Instituto Moreira Salles (IMS) acaba de receber o acervo do desenhista, preservado durante décadas em Petrópolis por seu filho.

São revistas como “Careta”, “O tico-tico” e “Fon-fon” — além de muitas outras; o artista trabalhou na maior parte das publicações do Rio de Janeiro, à época capital federal. São volumes encadernados, além de quase mil originais e desenhos esparsos. Filho de J. Carlos, Eduardo Augusto de Brito e Cunha ainda colecionou em álbuns as notícias que saíram sobre o pai depois de sua morte — e agora elas também estão no IMS, em regime de comodato, por pelo menos dez anos.

— É uma produção enorme e fascinante. Contei os dias de trabalho dele. J. Carlos começa em 1902 (na revista “Tagarela”) e trabalha até outubro de 1950. São 18 mil dias de trabalho! — afirma o cartunista Cássio Loredano, que já pesquisava o acervo desde 1995 e é consultor de iconografia do IMS.

REVISTAS EM BOM ESTADO

Loredano é o articulador da ida do acervo para a instituição. Ele começou a pesquisá-lo em 1995, indo à casa da família e fazendo cópias das publicações. Já publicou alguns livros a partir dessas pesquisas, como “O vidente míope — J. Carlos n’O Malho” (Folha Seca), em parceria com o historiador Luiz Antonio Simas; “J. Carlos contra a guerra” (Casa da Palavra), em colaboração com o colunista do GLOBO Arthur Dapieve; e “Carnaval de J. Carlos” (Lech), com Luciano Trigo, entre outros.

— Está tudo muito bem conservado. O filho do J. Carlos manuseava tudo sempre, então as publicações não estão nem amareladas. A “Careta” parece novinha. O acervo está em processo de higienização, ainda não começamos a pensar em exposições e publicações — afirma Julia Kovensky, coordenadora de iconografia do IMS.

A ideia de Loredano, colunista visual do GLOBO, é que outros pesquisadores possam ter acesso ao acervo, até por ter um olhar diferente do dele. Mesmo assim, o cartunista já tem pelo menos um outro livro na manga a partir do material que agora está no IMS.

— Quero fazer algo sobre o J. Carlos publicitário. Ele viveu uma época de grandes mudanças no Brasil, que se transformava de rural em urbano — destaca Loredano. — A fotografia ainda não estava popularizada, então usavam os desenhistas. Era a época de aquecimento a gás, eletricidade, automóvel, bondes, avião e o começo da televisão. Ele é o maior cronista visual possível do Brasil.

Naturalmente, o acervo não traz toda a produção de J. Carlos. Em primeiro lugar, porque tudo indica que ele se desfez do que publicou na revista “O Malho”, hoje arquivada na Biblioteca Nacional. Foi nela que o artista fez parte significativa da oposição a Getúlio Vargas, que logo depois chegou ao poder, pela revolução de 1930. O palpite de Loredano é que J. Carlos se ressentia desse período. Curiosamente, ele morreu na véspera da eleição de 1950, na qual Getúlio voltou democraticamente ao poder.

Estima-se que o artista tenha produzido mais de 100 mil desenhos. Ele disse certa vez que suas obras “davam para cobrir a Avenida Rio Branco”. Ele poderia voltar de táxi para casa, mas preferia o bonde — era o jeito de observar o cotidiano do Rio de Janeiro. J. Carlos trabalhou até o fim — estava debruçado sobre um desenho quando teve o derrame que o levaria à morte.

 

Redação

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