As farpas de Marcio Lacerda e Patrus Ananias

No programa de rádio do horário eleitoral transmitido na manhã de ontem (10/9), o candidato à reeleição Marcio Lacerda (PSB) fez questão de frisar que, apenas no último ano, a Prefeitura de Belo Horizonte autorizou a realização de mais de mil eventos em espaços públicos da capital mineira. Além disso, Lacerda apresentou apoiadores ligados a grupos e atividades culturais.

Certamente não é coincidência que este tenha sido o conteúdo do primeiro programa do atual prefeito após a noite de 7/9, quando foi veiculado o episódio “especial” da Independência do Brasil no HGPE de Patrus Ananias (PT). Determinada a desconstruir a imagem do mandatário atual, a campanha de Ananias apresentou um programa a respeito do uso dos espaços públicos na capital. O horário reservado ao petista foi ocupado por “denúncias” relativas ao autoritarismo de Lacerda na emissão de autorizações para a realização de eventos nestes locais. Leia abaixo um trecho do HGPE:

Narrador em off (imagens da Praça da Estação): Praça da Estação, local de manifestações culturais e políticas da cidade. No monumento aos mártires da Inconfidência Mineira está escrito: a montanha está sempre livre. Em dezembro de 2009, Marcio Lacerda baixou um decreto proibindo ali a realização de eventos de qualquer natureza. A praça, que era pública, deixou de ser. Sua explicação: “nós regulamentamos o uso dos espaços públicos, para que eles não sejam depredados”. A reação foi imediata. Surgiu um movimento popular para derrubar o decreto. Foram cinco meses de pressão dos belo horizontinos. O prefeito precisou recuar, mas não reconheceu o erro. Em maio de 2010, assinou um novo decreto, autorizando eventos, mas passou a cobrar por isso entre nove mil e dezenove mil reais (HGPE de Patrus Ananias, noite de 07/09/2012).

Este não foi, no entanto, o primeiro embate entre os dois candidatos que polarizam a disputa em BH. Há alguns dias, inserções de Patrus passaram a enfatizar o que foi denominado “matemágica” e se assenta na contradição entre os resultados apresentados por Lacerda no seu mandato e o que ele promete para os próximos quatro anos. No horário eleitoral da noite de ontem (10/9), por exemplo, o episódio exibido no horário de Patrus abordou números referentes à construção de creches.

Matemágica: na ultima campanha, Marcio Lacerda prometeu construir 100 creches e pré-escolas, as UMEIs. Fez apenas 26 e deixou de fazer 74. Nesse ritmo, precisaria de 16 anos, ou quatro mandatos, para cumprir a promessa. Agora, ele diz que vai fazer mais pela educacao. Se nao fez nos últimos quatro anos, dá para acreditar que fará nos próximos quatro?  Com o Patrus é diferente reais (HGPE de Patrus Ananias, noite de 10/09/2012).

Outro exemplo do confronto que tem se desenhado no processo eleitoral em Belo Horizonte teve lugar no debate realizado pela Folha de S. Paulo e pela Rede TV na última sexta-feira (7/9). Diante das críticas de Patrus, que disse que seu governo é um fracasso na área da saúde e que ele só sabe governar “com base em números”, Lacerda respondeu à altura.

Nós não temos mágica, nós temos trabalho sério, baseado em pesquisa, baseado em contatos com a população. […] eu sou muito bom em números mesmo, eu sou uma pessoa treinada em gestão, reconhecido nacionalmente, mas a sensibilidade social eu tenho e não fica só nas palavras. Ela está presente na minha ação e as pessoas reconhecem isso em todo momento em que eu tenho contato com a população, e isso é que me levou a ter a melhor aprovação entre todos os prefeitos das grandes capitais reais (debate da Folha de S. Paulo e Rede TV, noite de 07/09/2012).

Para quem julga que o ataque é a melhor defesa, o candidato à reeleição não deixa de criticar governos anteriores ao seu, mesmo sem mencionar diretamente Patrus Ananias. Foi isso que ele fez ontem, quando apresentou as obras do BRT e apresentou suas realizações e propostas para o trânsito da capital mineira. Lacerda ressaltou que “não houve planejamento no passado” e que é isso que tem tentado corrigir em seu mandato. Sempre que se refere ao passado, ele delimita suas críticas às administrações municipais dos “últimos 20 anos”, visto que, desde 1992, o PT está no poder em BH (incluindo o governo do próprio Lacerda, já que seu vice, Roberto Carvalho, é petista).

Mesmo que ambos os postulantes que polarizam a disputa sejam alvejados pelos candidatos “nanicos”, a vantagem de Marcio Lacerda reside no tempo: se, por um lado, ele apresenta realizações recentes e bem recebidas pela população, por outro, Patrus Ananias deixou a prefeitura há 16 anos, tempo suficiente para que o PT se tornasse um partido mais pragmático e, assim, viável eleitoralmente em âmbito nacional, para que a antiga militância perdesse fôlego (o que pode ter decorrido, além dos escândalos envolvendo a legenda, do estilo mais pragmático e menos ligado às bases de Fernando Pimentel) e, o que é mais grave neste momento, para que suas realizações se perdessem na memória dos belo horizontinos. Mesmo que Patrus apresente seus feitos ao longo da campanha, o que Marcio mostrar tenderá a ser mais facilmente identificável, pois está em curso na cidade. O início das obras do metrô, por exemplo, foi anunciado para este mês. Ao mesmo tempo, Patrus aparece na televisão dizendo que Marcio não vai cumprir a promessa de ampliar este meio de transporte. Como este choque entre o que o petista diz e o que se observa na realidade cotidiana será recebido pelos eleitores? Mesmo as críticas à demora para o começo das obras podem não fazer mais sentido para a população a partir de agora; desde que comecem logo a construção (o que, via de regra, gera a expectativa de que ela continuará depois das eleições), de que importa se ainda não o fizeram?

Ademais, é preciso considerar o risco de que os ataques sejam mal vistos pelo eleitorado, voltando-se contra o próprio emissor. Aqui mesmo em Belo Horizonte, vimos a queda de Jô Moraes (PCdoB), opositora ferrenha de Lacerda e de seus “padrinhos”, nas pesquisas de intenção de voto e, por fim, no resultado do primeiro turno em 2008. Depois de empregar a maior parte de seu espaço restrito de campanha no reforço do posicionamento contrário ao candidato da aliança informal entre PT e PSDB, Jô, que estava em primeiro lugar nas sondagens antes do início do horário eleitoral (ela era, até então, a mais conhecida dos belo horizontinos), ficou apenas em terceiro lugar nas urnas, com 8% dos votos válidos. Parece pouco provável, dado o cenário atual, que um declínio tão acentuado aconteça com Patrus Ananias. Mas será que o investimento maciço na desconstrução da imagem do Marcio Lacerda de hoje (mais forte e preparado que o desconhecido de quatro anos atrás) será suficiente para se converter em votos que levem o petista à vitória?


* Nayla Fernanda Andrade Lopes é graduada em Jornalismo e pós-graduada em Comunicação Empresarial pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH) e especialista em Marketing Político pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Atualmente, cursa o mestrado em Ciência Política, também pela UFMG, e integra o Grupo de Pesquisa Opinião Pública, Marketing Político e Comportamento Eleitoral, com sede na UFMG.

 

Redação

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