BRASIL: NA PAUTA ATUAL DO CAPITALISMO

23 de fevereiro de 2011 às 9:48

Livre pensar é só pensar

por Luiz Carlos Azenha

Tinha uma coluna no antigo Pasquim (jornal de humor e político dos tempos do regime militar) intitulada assim: Livre pensar é só pensar.

Penso que o governo Dilma, apoiado mais no PMDB que nos movimentos sociais, mais em Palocci que na bancada federal do PT, representará a repactuação das forças do Congresso que se assentam na conjugação “terras+meios de comunicação”.

Isso significa a adesão definitiva do país a uma divisão internacional do trabalho em que nosso papel é, acima de qualquer outra coisa, o de exportador de commodities.

É óbvio que isso não começou agora.

Todas as obras essenciais do governo Lula, nenhuma das quais enfrentou resistência da grande imprensa, estavam (e estão) de certa forma voltadas para isso: as hidrelétricas de Santo Antonio, Jirau e Belo Monte, a transposição do rio São Francisco e as ferrovias Norte-Sul e Transnordestina.

Essas obras, para além dos impactos positivos que eventualmente tiverem para as populações locais, se enquadram no aprofundamento do modelo de exportação de minérios e do agronegócio.

As hidrelétricas na Amazônia servirão acima de tudo às atividades eletrointensivas das mineradoras. A transposição do São Francisco à incorporação de regiões inteiras do Nordeste ao agronegócio. As ferrovias ao escoamento da produção rumo aos portos.

Quando a ex-ministra Marina Silva deixou o governo Lula, o fez diante do enfraquecimento do Ministério do Meio Ambiente diante das pressões da “turma da engenharia” e da bancada ruralista. De lá para cá, tivemos o virtual congelamento das reservas indígenas onde interessa (Mato Grosso e Mato Grosso do Sul), como parte do acordo que permitiu a aprovação da reserva Raposa Serra do Sol. O enfraquecimento da Funai. Agora, os servidores do Incra e do Ministério do Desenvolvimento Agrário já farejaram que vem desmonte por aí (clique aqui para ler). Não duvido que o mesmo aconteça em relação à Anvisa e aos órgãos do governo encarregados de fiscalizar os transgênicos.

O Brasil é campeão mundial no uso “seguro” de agrotóxicos, mas isso só existe no papel, diz a professora Raquel Rigotto (clique aqui para ler). A plantação de transgênicos no Brasil aumentou 19% em apenas um ano, existe legislação para informar os consumidores sobre a presença de transgênicos nos supermercados, mas ela não é cumprida, informa o Estadão. São duas áreas em que navegamos às cegas, sem considerar as consequências danosas que os venenos e os transgênicos possam ter na saúde pública e no meio ambiente.

Isso é resultado de um consenso em que até os comunistas se renderam: Aldo Rebelo, do PCdoB, foi o relator do projeto de mudança do Código Florestal que é apenas mais um capítulo no avanço do pacto que, me parece, norteia nossa política agora mais do que nunca. A revisão do Código Florestal significa o avanço “para dentro” do agronegócio. Teremos, igualmente, o avanço “para fora”. Trata-se do projeto conjunto de Brasil e Estados Unidos para a produção de etanol em países da América do Sul, do Caribe e da África.

O Banco Interamericano de Desenvolvimento é parte deste esforço, gerenciado nos Estados Unidos pelo irmão do ex-presidente George Bush, o ex-governador da Flórida Jeb Bush, e no Brasil pelo ex-ministro da Agricultura do governo Lula, Roberto Rodrigues (clique aqui para ler, em inglês). O esforço conjunto empacou no protecionismo do Congresso dos Estados Unidos, que renovou a aplicação de tarifas ao etanol importado do Brasil e no alarme causado pelo impacto que a prioridade ao etanol traria à produção de alimentos. Mas isso não implicou em redução da produção nos Estados Unidos: hoje 25% de todos os grãos produzidos lá já são usados em biocombustíveis, de acordo com o Earth Policy Institute. Quanto mais subir o preço do petróleo, maior será a viabilidade econômica de um mercado mundial de biocombustíveis — para o qual, aliás, marcham grandes investidores internacionais

Dar “segurança jurídica” às novas fronteiras do agronegócio — na Colômbia, em El Salvador e Gana — pode ajudar a selar o novo estágio das relações entre Brasil e Estados Unidos. Resta saber se isso será feito às custas de classificar o Movimento dos Sem Terra como “entidade terrorista”. A gente compra uns caças deles, eles nos colocam no Conselho de Segurança da ONU e estamos conversados. Só estou livre-pensando.

Redação

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