Defensor público processa Magazine Luiza por trainee para negros

Defensor diz que programa exclusivo para negros discrimina “demais trabalhadores que também dependem da venda de sua força de trabalho"

Da CartaCapital

A Defensoria Pública da União (DPU) entrou com um processo contra a empresa varejista Magazine Luiza por causa de um programa de trainee exclusivo para candidatos negros.

Para o defensor Jovino Bento Júnior, responsável por protocolar a ação civil pública em tutela de urgência, o processo seletivo da empresa é “ilegal” por discriminar “demais trabalhadores que também dependem da venda de sua força de trabalho para manter a si mesmos e às respectivas famílias”.

“A reclamada sempre contratou negros em seus programas de trainee, algo plenamente comum. Portanto, nada justifica que pretenda, agora, que seu programa seja exclusivo para determinada raça/cor”, afirma o texto da ação.

Na argumentação, o defensor utilizou do Estatuto da Igualdade Racial para apontar “discriminação” por parte da empresa. Como exemplo, citou uma crítica do atual presidente da Fundação Cultural Palmares, Sérgio Camargo – famoso também por atacar constantemente movimentos negros brasileiros.

O processo defende que a Magazine Luiza pague 10 milhões de reais em indenização por danos morais coletivos pela “violação de direitos de milhões de trabalhadores (discriminação por motivos de raça ou cor, inviabilizando o acesso ao mercado de trabalho)”. Leia a ação na íntegra.

O objetivo do processo eletivo “é trazer mais diversidade racial para os cargos de liderança da companhia, recrutando universitários e recém-formados de todo Brasil, no início da vida profissional”, defendeu a empresa na época do anúncio do programa.

Atualmente, a varejista tem em seu quadro de funcionários 53% de pretos e pardos, mas apenas 16% deles ocupam cargos de liderança.

Advogados reagem

Nas redes sociais, advogados e juristas reagiram com surpresa à ação.

Para o advogado Thiago Amparo, o defensor “não leu a CF, e não leu o Art. 1.4, Decreto 65.810 e o Art. 39, do estatuto da igualdade racial que permitem ação afirmativa.”

Amparo também destacou a importância da DPU e frisou que ações do tipo destoam do trabalho do órgão, já que defensores públicos têm independência funcional.

 


“[A] atuação de Jovino Bento, Defensor Público da União, já está na história como uma das mais exdrúxulas, inoportunas e antijurídicas”, publicou a advogada e professora da FGV-SP Eloisa Machado.

 

 

O anúncio do processo seletivo já havia gerado diversas reações positivas e contrárias à empresa.

Para Thiago Amparo, há racismo e falta de compreensão, por parte do meio jurídico, dos mecanismos defendidos pelas as ações afirmativas para promover equidade e igualdade.

“Penso que a reação contrário veio de dois fatores: racismo e falta de entendimento do que significa ação afirmativa. Primeiro, incomodar-se com negros em posição de poder e não se preocupar com a exclusão de negros destes processos historicamente é uma manifestação de racismo. No meio jurídico, espanta que muitos desconhecem que ação afirmativa – medida protetiva para negros(as) feita de forma proporcional e temporária – não é racismo, por lei.”, diz.

No fim de setembro, o Ministério Público do Trabalho em São Paulo indeferiu uma série de denúncias recebidas. Para o MPT, não houve violação trabalhista, mas uma ação afirmativa de reparação histórica.

Para o MPT, a política da empresa é legítima e não existe ato ilícito no processo de seleção, já que a reserva de vagas à população negra é plenamente válida e configura ação afirmativa, além de “elemento de reparação histórica da exclusão da população negra do mercado de trabalho digno”.

Essa exclusão, segundo o Ministério Público, se traduz na falta de oportunidades de acesso ao emprego, na desigualdade de remuneração e na dificuldade de ascensão profissional, “quando comparado aos índices de acesso, remuneração e ascensão profissional da população branca”.

10 Comentários

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  1. Piramos…..enlouquecemos…..a justa Br ta boa para internamento de urgência e medicação pesada….O Jovino defensor é maluquinho, prefiro 1000 vezes o Jovino Santos Neto ; )

  2. Que parte da CF diz que racismo é só de branco contra preto e o inverso está liberado? Racismo é (ou inclui) descriminar pessoas porque elas têm a cor “errada”, a branca no caso. Sendo a escravidão comum no passado, todos somos descendentes de escravos e de amos. Mesmo considerando apenas o caso nacional, é raro você encontrar alguém racialmente “puro” após algumas gerações. FHC tem um pé na cozinha, eu tenho, quase todo branco brasileiro tem. E mesmo que não tenha, como você vai aceitar que alguém seja discriminado para compensar algo que o pai do seu tataravô talvez tenha feito? Então o sujeito se esforça e está mais preparado, mas na hora de ser avaliado é preterido por não ser negro? Isso é racismo evidente, abjeto. Tem que processar essa gente mesmo.

    1. Discordo. Cotas raciais, sociais e outros instrumentos de política afirmativa não são voltadas para o passado. É equivocado achar que cotas servem para reparar uma injustiça que ocorreu há um século ou há mais tempo. Realmente cotas não servem para o que já passou. Cotas raciais e outros instrumentos de justiça social servem para o presente. Servem para diminuir o abismo que existe aqui e agora. Negros, por exemplo, não são exatamente uma minoria; há localidades em que são até maioria. O problema é que a sociedade é estruturalmente injusta há séculos. O poder, seja ele político, militar, econômico, etc está concentrado numa minoria branca e proprietária há séculos. Isso causa toda uma série de disfunções na sociedade. Uma sociedade boa para todos deve ser mais igualitária. Uma sociedade não é boa quando uma parcela dela tem poder e hegemonia, enquanto outros grupos vivem à margem, numa situação de inferioridade em função de sua origem. Por isso, políticas afirmativas existem para melhorar a condição de pessoas que, em função de sua origem racial ou étnica estão em condições históricas de subalternidade. Cotas raciais não são uma modalidade de racismo, são uma tentativa de corrigir distorções.

    2. Então, se a Magalu abrir vaga de trainee para netos e bisnetos de judeus vítimas de alemães ela está sendo preconceituosa com netos e bisnetos germânicos ? Correto ?

  3. Sabem o que é um idiota especializado? É mais ou menos assim: o sujeito se especializa em alguma área específica. Por exemplo, o Direito. Mas ele estuda muito, muito mesmo, só para adquirir um saber INSTRUMENTAL. É um conhecimento técnico (Leis e demais regulamentos, por exemplo). Ele vai se aprofundando cada vez mais naquele conhecimento técnico. O meio jurídico está lotado dessa gente. Juízes, promotores, delegados, procuradores, defensores, etc. São idiotas especializados. Sabem tudo de Leis e outras normas que regem o funcionamento do Estado. Não sabem (porque não interessa a eles) de mais nada. Com esse saber instrumental cada vez mais aprofundado os caras passam em concursos públicos e chegam até os cargos de autoridade. Mas são idiotas especializados. Do saber humanístico emancipador, das ciências humanas, letras, filosofia, sociologia, etc. não sabem nada, mas acham que podem emitir opiniões. É por isso que um procurador da República, não há muito tempo disse que só houve a escravidão de africanos no Brasil, porque “os índios eram preguiçosos e não queriam trabalhar”. Daí você vê o nível de um idiota especializado.
    Repito: no aparato jurídico-policial do Estado brasileiro há uma imensa quantidade de idiotas especializados. E eles dizem absurdos.

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