Diálogos literários luso-brasileiros: de Eça de Queirós aos novíssimos

Dois países, uma semana, dez autores. Este é o lema de Minha Língua, Minha Pátria, o evento literário organizado pelo PÚBLICO e pela Livraria Cultura, em São Paulo. Até 15 de Abril junta portugueses e brasileiros.

Isabel Coutinho – Público

 

 É com uma sessão dedicada a Eça de Queirós que esta sexta-feira começaMinha Língua, Minha Pátria, na Livraria Cultura Shopping Iguatemi, em São Paulo. O evento literário     juntará escritores portugueses e brasileiros até 15 de Abril.

Às 19h30 (hora local), o professor catedrático Carlojs Reis, em representação da Universidade de Coimbra, estará no palco para falar da relação do escritor português com “a língua literária” e abordar os ecos que a sua obra teve e ainda tem no Brasil. A sessão é moderada pela directora-adjunta do PÚBLICO, Simone Duarte. Tal como todas as que se seguirão, decorre no terceiro piso da livraria e é gratuita.

Eça de Queirós ou a língua como pátria ausente é o título escolhido porque “sugere várias coisas”, explica por email o professor Carlos Reis. “Uma: que um escritor que passou a maior parte da sua vida fora de Portugal viveu essa ausência como estímulo e até como condição privilegiada para lançar sobre ambas – a pátria e a língua – um olhar crítica e potencialmente regenerador, como nenhum outro houve na nossa história cultural. Outra: que a ausência expôs Eça a diversas incompreensões e mesmo a atitudes de rejeição crítica com que foi brindado pelos compatriotas, no país fechado e mentalmente limitado que Portugal era, no século XIX.”

O autor de Eça de Queirós (Edições 70) lembra também que a forma como Eça tratou a língua – “com horror pelo purismo e pela vernaculidade conservadora” –, constituiu, muitas vezes, um motivo de crispação na época. Os seus pares, como Pinheiro Chagas, Fialho de Almeida ou Mariano Pina não aceitavam um idioma liberto daquelas imposições. Por isso a Carlos Reis apetece-lhe perguntar: “Quem hoje lê esses que tanto criticaram Eça?”

Por outro lado, “a partir do exterior e ressentido na pátria ausente”, vivendo em Inglaterra e em França, Eça de Queirós escreveu para uma outra pátria de língua portuguesa: o Brasil. E foi, em geral, bem acolhido, explica Carlos Reis. Isso não impede que “quando se lê alguma correspondência privada de Eça ou uma carta de Fradique Mendes a Eduardo Prado (carta que Eça, sintomaticamente, deixou inédita)” se perceba que “a imagem que ele tinha do Brasil era ainda, em vários aspectos, a da ex-colónia tratada com alguma displicência.”

À margem da iniciativa Minha Língua, Minha Pátria, que é o segundo projecto realizado pela Livraria Cultura e pelo jornal PÚBLICO – que publica no Brasil uma versão mensal do suplemento de cultura Ípsilon, distribuído gratuitamente com a Revista da Cultura -, Carlos Reis irá trabalhar com colegas brasileiras na edição crítica das Lendas de Santos de Eça. “É esta uma outra forma, mais discreta, mas não menos digna, de aproximar os dois países: trabalhando em conjunto”, diz.

Entrevistas nada combinadas
No dia seguinte, sábado, às 19h30 no Brasil, será a vez de o premiado escritor português Gonçalo M. Tavares subir ao palco numa sessão intitulada A viagem do senhor Tavares. Ao seu lado estará o académico brasileiro Samuel Titan Jr, do Instituto Moreira Salles, que moderará a conversa. No Brasil, Gonçalo M. Tavares acaba de publicar Os Velhos Também Querem Viver (ed. Foz) e, já em viagem, explicou rapidamente por email que irá abordar temas como “literatura e violência”, “os clássicos e a modernidade” e “literatura, política e linguagem”.

Ao terceiro dia, no domingo, pelas 16h no Brasil, será de Fernando Pessoa que se ouvirá falar na Livraria Cultura Shopping Iguatemi. A cantora Adriana Calcanhotto, que foi directora do PÚBLICO por um dia, a 5 de Março de 2014, aceitou o desafio de “entrevistar” o académico luso-colombiano Jerónimo Pizarro. A compositora anda entusiasmada a ler Eu Sou Uma Antologia(Tinta da China), uma selecção, organizada por Jeronimo Pizarro e Patricio Ferrari, de 136 autores fictícios aos quais Pessoa atribuiu textos. Diz que gosta muito de “entrevistas nada combinadas”, mas conta fazer perguntas que ajudem “a iluminar o ponto de vista do antologista”. A autora de Saga Lusa – o relato de uma viagem vai querer que Jerónimo fale sobre “alguns dos mecanismos de desdobramentos do genial poeta em tantos outros” bem como do assunto dos “meio-heterónimos” e dos quatro heterónimos femininos de Pessoa.

O título da sessão Fernando Pessoa: A língua é onde não estou foi sugerido pelo académico especializado na obra do poeta português, porque Pizarro sempre achou que um verso de Opiário (Minha pátria é onde não estou) se devia contrapor à frase do Livro do Desassossego (Minha pátria é a língua portuguesa).

 

 

Redação

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador