Faltam pesquisadores brasileiros na Amazônia

Com colaboração de Fernanda Bertoncini

A Amazônia não é alvo apenas da degradação ambiental, mas também sofre com a escassez de pesquisadores brasileiros. A mais rica biodiversidade do planeta, que no Brasil abarca nove estados, possui um baixo contingente de pesquisadores e pouca formação de recursos humanos. De acordo com a Coordenação de Pessoal de Nível Superior (Capes), dos 49.280 matriculados em cursos de doutorado no país no começo de 2008, somente 782 estavam na região Norte. Nesse mesmo ano, o número de doutores titulados foi de apenas 113 na região, de um total de 10.771 em todo país. O baixo número, impacta diretamente no andamento das pesquisas sobre a biodiversidade.

Se por um lado a Amazônia está sempre em pauta na mídia, por outro a audiência que o tema rende não se traduz na formação de recursos humanos na região. A afirmação é do diretor presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), Dr. Odenildo Sena, que ressaltou – ainda – que, atualmente, o Estado possui apenas 900 doutores. Na soma dos cientistas disponíveis nos nove estados, há apenas 2.400 doutores. Um moUm montante baixo para suprir a necessidade de gerar conhecimento a uma região considerada importante pelo Brasil e demais países.

Todos os números que envolvem a Amazônia são exorbitantes, a começar pela extensão total da floresta, que ocupa cerca de 700 milhões de hectares distribuídos por dez países. A estimativa é que 25% das espécies do planeta estejam espalhadas pelos ecossistemas que a formam. Somente de árvores, o número de espécies é da ordem de 2,5 mil. A região também é responsável por aproximadamente 20% da água doce disponível no mundo, segundo dados do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio).

Comparado às proporções da floresta e necessidade de pesquisas na região, o número de pesquisadores é ínfimo, na opinião de Lúcia Yuyama, responsável pela Coordenação de Pesquisas do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). O déficit afeta diretamente o conhecimento nacional sobre a região, ou seja, as pesquisas poderiam se traduzir em importantes descobertas científicas, em modelos de conservação e criação de políticas públicas. Yuyama afirma que apenas 2% da biodiversidade da Amazônia é conhecida.

No INPA, por exemplo, são 210 pesquisadores, que se dividem em grupos de pesquisa, capacitação e formação de recursos humanos. O número ideal, para a execução dos trabalhos com nível razoável, seria de 350 pesquisadores. Outro agravante, de acordo com a coordenadora, é a idade média dos quadros do instituto, 50 anos. Ou seja, o número de profissionais não precisa ser apenas reforçado, mas em breve também precisará ser renovado.

Capacitação e emprego

Outro fator relevante na escassez de pesquisadores credenciados, na avaliação de Sena, é a falta de estímulo no que tange as condições salariais, o que implica na dificuldade de atrair pesquisadores de outros estados dispostos a se fixarem na Amazônia.

Já Yuyama, ressalta que o custo de vida na região amazônica é muito elevado, por peculiaridades como clima e transporte. Profissionais formados nas regiões Sul e Sudeste acabam desestimulados por questões salariais, já que terão necessidades bem mais onerosas.

Ela avalia que além do reforço de contratação de pessoal, as ações também devem fortalecer as bases educacionais, ampliando o número de vagas nas instituições locais e o próprio número de universidades e centros de ensino. De acordo com dados do censo de 2005, realizado pelo Instituo Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), conforme contou Yuyama, das 52 universidades federais do país, a região Norte possui dez instituições. Já das 33 universidades federais, apenas cinco estão nesta região.

O caminho para minimizar a carência desses profissionais – segundo Sena – é a combinação de ações como; atrair pesquisadores de outras regiões do país e liberação de recursos por parte das autoridades estadual e federal e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).

“Acredito que dentro de 10 ou 12 anos, já veremos avanços na formação desses cientistas. No momento, as soluções que temos são frágeis dada a necessidade da região. Contudo, vale lembrar que levam-se quatro anos para formar novos doutores”, salienta Sena.

O desempenho de equipes brasileiras de pesquisadores depende da tomada de decisão de priorizar a Amazônia e investir em avanços científicos e tecnológicos na região. “Insisto que a busca pela soberania na Amazônia deve ser imediata e urgente. Do contrário, continuaremos a ter mais pesquisadores estrangeiros do que brasileiros; mais trabalhos científicos de pesquisadores que estão fora da Amazônia, do que de estudiosos que a vivem, literalmente”, ressalta Sena.

Investimentos

A redução da disparidade de profissionais especializados entre as regiões do país é um dos focos de atuação do Plano Nacional de Pós Graduação (2005-2010). De acordo com o presidente da Capes, Jorge Almeida Guimarães, em um balanço prévio dos resultados do plano, uma das sugestões que ficará para o próximo governo é concentrar esforços na capacitação de pessoas em áreas mais afastadas, principalmente na Amazônia.

Desde 2003, de acordo com Sena, há um esforço muito grande por parte do Governo do Estado do Amazonas, em parceria com a Fapeam, em oferecer bolsas de estudos para formar novos pesquisadores, tendo em vista a idade dos doutores alocados na Amazônia, em torno de 50 anos.

Nesse contexto, foram oferecidas 302 bolsas a pesquisadores. Desse contingente, 28 bolsistas já possuem titulação. Por outro lado, Sena alerta que avaliando a urgência da região, o número ainda é muito. “É necessário fazer não só a ciência básica, mas a aplicada. É preciso transformar cientificamente as riquezas naturais em produtos e serviços que melhorem a qualidade de vida e movimentem a economia local”, pontua o professor.

Segundo Sena, o governo federal tem tido grande participação na formação desses cientistas, por meio da Capes. “Tal incentivo vem crescendo nos últimos anos, mas é importante que as instâncias federais foquem na Amazônia ou teremos a soberania nacional comprometida”, alerta o diretor da Fapeam.

Embora também reconheça os esforços do governo federal em ampliar o número de pessoal capacitado na região, com planos que envolvem vários ministérios, Yuyama ressalta que as ações amenizam o problema, mas não resolve. Para ela, é necessário ampliar o número de funcionários públicos como um todo – não apenas pesquisadores -, em diferentes cargos, pois considera “crítico o quadro atual”.

Programas

Uma das recentes iniciativas do Capes, no começo de julho, foi o lançamento do edital do Programa de Doutorado Interinstitucional (Diter) do programa Novas Fronteiras, no qual poderão participar as instituições de ensino superior federais ou estaduais das regiões Norte, Nordeste ou Centro-Oeste. O objetivo é oferecer a um grupo ou turma de alunos a formação em nível de doutorado, sob condições especiais, fora dos grandes centros de ensino e pesquisa.

A iniciativa, também visa aproveitar o potencial dos programas de pós-graduação consolidados para fortalecer e estabelecer as condições para a criação de novos. Para o exercício orçamentário e financeiro de 2009 serão disponibilizados cerca de R$ R$ 4,5 milhões para apoio às propostas selecionadas. Deverão ser apoiados aproximadamente 30 projetos.

Ainda segundo informou o Capes, por intermédio de sua assessoria de imprensa, outra ação para levar capacitação às regiões menos favorecidas com a educação superior é a Universidade Aberta do Brasil (UAB). Criada pelo Ministério da Educação (MEC) em 2005, a UAB é uma articulação entre universidades estaduais, federais e institutos federais de educação, ciência e tecnologia (Ifets) para levar ensino superior público aos municípios brasileiros nos quais não há cursos de formação superior, ou cujas ofertas são insuficientes para atender a demanda.

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