MIGUEL
Wagner M. Martins
Luana chegou derrubando alegria pelos lados do corpo. O virulento dia a dia que prende as pessoas, trabalho, sequencia de obrigações, afastou-a dos laços mais elementares da convivência familiar. Uberlândia ficou na histórica recordação de uma infância aromatizada e revestida de boas lembranças. Ia voltar agora, encontrar raízes, garimpar reminiscências que ficaram perdidas na distância.
Os preparativos estavam sendo cuidados e a ansiedade era indisfarçável. O pequeno Miguel não era diferente. Em uma cânula de inocência embebida duma espiritualidade ácida e inata, anunciava que ia viajar, num entremeio de choros de birra de uma criança de três anos e os arroubos de uma natural inquietude.
Viajar de avião, em tempos outros, já foi um privilégio de poucos. Atualmente, as viagens nessa modalidade tornaram-se algo palatável, possível a todos e natural.
Rondando a cozinha, arrastando vassouras, rolando pelos cantos, o pequeno Miguel sorria e comemorava a viagem enquanto a mãe vasculhava nos monitores as possibilidades de adquirir um bilhete sem ter que se deslocar aos guichês empanturrados dos terminais de viagem.
Nesse ambiente travo com Miguel um pequeno diálogo:
– quer dizer que vais viajar em Miguel?
– vou
– vai viajar pra onde, Miguel?!
– pá onde mamãe? A zente vai viazar pá onde?
– pra Uberlândia, Miguel, fala pro vovô que é pra Uberlândia
– vovô, eu mais a minha mãe vai viazar pá ubelândia.
– vai viajar de avião?
– não, vô, viazá de ombus,
– e porque não vai de avião?
– é poquê não tem cadera pá sentá
– não tem problema, viaja em pé, uai.
– não, vô, não pode viazá em pé não.
– e porque não pode viajar em pé, Miguel!?
– é poque se viazá em pé o avião dispilota
Tá certo. Sabedoria a toda a prova… “se viajar em pé o avião dispilota”.
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