“Não existe um avanço pleno no combate ao tráfico de pessoas”, diz presidente da Asbrad

Em todo o mundo, 25 mil pessoas foram vítimas desse tipo de violação em 2016; mulheres e crianças são as principais atingidas

Foto: Mansi Thapliyal/Reuters

do Observatório do 3º Setor 

“Não existe um avanço pleno no combate ao tráfico de pessoas”

por Mariana Lima

“Nada acontece sem um conjunto de ações que favoreçam o cenário”. É desta forma que Dalila Figueiredo, presidente da Associação Brasileira de Defesa da Mulher, da Infância e da Juventude (Asbrad), percebe a situação do tráfico de pessoas no país.

A instituição existe desde 1997, e devido à proximidade com o Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, acabou se envolvendo com a causa do combate ao tráfico de pessoas.

O que começou com o atendimento a uma mulher vítima de tráfico e exploração sexual, transformou-se em projetos de acolhida e um serviço especializado.

Além de atender no Aeroporto vítimas de tráfico, exploração sexual ou de trabalho, a equipe do Asbrad oferece apoio a migrantes nacionais e estrangeiros em situação de vulnerabilidade.

“É fundamental ter uma preocupação com o ser humano. É durante a vulnerabilidade do indivíduo que pessoas de mau-caráter surgem para explorar e se aproveitar”, aponta Dalila.

Ela ressalta que o aumento da pobreza, do trabalho precário e da concentração de renda apenas potencializam a exploração humana.

“A quantidade de crianças que estão entrando no país sozinhas ou acompanhadas de adultos desqualificados, vindas da Venezuela, é alarmante. E elas acabam nas ruas ou em abrigos de adultos. Isso só aumenta o risco de elas serem aliciadas”.

De acordo com o Relatório Global sobre Tráfico de Pessoas, produzido pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), crianças correspondem a 30% das vítimas de tráfico humano no mundo.

Com base em dados de 2016, o documento revela que 25 mil pessoas foram traficadas ao longo do ano questão, no mundo.

O relatório ainda informa que são as mulheres as principais vítimas. Elas representam 70% dos que sofrem essa violação de direitos.

A exploração sexual ainda é a principal motivação por trás do tráfico humano em relação às mulheres. Elas correspondem a 75% das vítimas.

A primeira mulher que a Asbrad atendeu foi atraída por uma proposta de trabalho, e acabou sendo explorada sexualmente.

“Após o primeiro encontro com ela, nós nos envolvemos com a causa rapidamente. Muitas destas mulheres perderam o contato com a família e não sabem o que fazer ao chegarem aqui. É fundamental o processo de escuta”.

Em 2018, o Disque 100 registrou 159 denúncias de tráfico de pessoas, resultando em mais de 170 violações.

Em relação à motivação, as denúncias com maior incidência foram as de tráfico interno para fins de exploração sexual (16,9%).

Em seguida, aparecem internacional para fins de exploração sexual (8,1%), interno para fins de adoção (7,5%), interno para fins de exploração de trabalho (6,9%), internacional para exploração de trabalho (5,0%), internacional para fins de adoção (2,5%), internacional para remoção de órgãos (1,8%) e, por fim, interno para remoção de órgãos (0,63%). 57,23% das violações têm outros motivos.

O perfil das vítimas das ocorrências no último ano era, predominante, de mulheres (53,1%), entre 15 e 17 anos (18,9%). As informações estão de acordo com dados internacionais.

Para Dalila, a continuidade destas ocorrências e a dificuldade de manter instituições abertas deixam uma sensação de impotência.

“Não existe um avanço pleno no combate ao tráfico de pessoas. É necessária muita luta e resistência de quem está nesta luta. As ONGs conseguiram construir modelos de combate e disponibilizar indicadores, mas ainda precisamos de mais”.

Assim como a violência sexual, a violência contra a comunidade LGBT+ e demais minorias, o tráfico de pessoas enfrenta a barreira da subnotificação.

Inteligência Artificial no combate

A empresa de tecnologia IBM, em parceria com a rede de organizações Stop The Traffik, desenvolveu uma tecnologia de Inteligência Artificial (IA) gratuita para que órgãos policiais e ONGs consegam identificar e interromper esquemas criminosos ligados ao tráfico de pessoas.

A ferramenta funciona através da plataforma ‘Traffik Analysis Hub‘ (TA Hub), que permite o compartilhamento de informações com base na análise de dados sobre tráfico humano.

A ferramenta é pensada para atuar em perspectiva internacional, já que que o tráfico de pessoas ocorre principalmente nas fronteiras entre os países.

O Hub TA visa rastrear notícias e redes sociais públicas e ligá-las a eventos e tendências do tráfico humano, com informações que estão sendo investigadas, como casos de fraudes bancárias.

O serviço ainda não está aberto para todas as organizações. Por enquanto, apenas entidades convidadas podem colaborar com a base de dados e informações. A proposta é avaliar o funcionamento da plataforma para então aumentar a rede de colaboradores.

A líder de cidadania da IBM na América Latina, Claudia Romanelli, ressalta a busca da empresa por promover ações de impacto social.

“O tráfico de pessoas é uma causa de impacto gigantesco e envolve frequentemente uma população vulnerável. Mulheres e crianças são as principais vítimas desta violência. A construção de uma rede integrada só tende a beneficiar as organizações e o combate”.

Ela aponta que, enquanto a IBM possibilita a ferramenta, é papel das organizações “exercer a gestão destes dados. Coordenando as informações, elas [entidades] conseguem enxergar os padrões de comportamento e identificar as situações de tráfico humano”.

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A Defensoria Pública da União de São Paulo disponibilizou uma cartilha que reúne orientações para identificar situações de Tráfico de Pessoas. Para ler, clique aqui.

Redação

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