O dia em que Marilena Chauí linchou Fernanda Torres

Quando os fantasmas ideológicos da ombudsman da Folha pregaram-lhe uma ilusão de ótica e fizeram-na ver a professora Marilena Chauí à frente de um pelotão de linchamento.

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Não acompanhei de perto as reações ao texto de Fernanda Torres sobre o feminismo. Pertinentes ou agressivas, mas intensas ao ponto de obter de Fernanda um literal “mea culpa”. Li o texto de Fernanda, e pareceu-me que ela comete a ingenuidade de não ter se apercerbido de que estamos em guerra civil. E, em guerras, quem não é por nós é contra nós.

Fernanda, ingênua Fernanda, colhendo margaridas existencialistas em campo de batalha.

Hoje “quem preza um bom debate” deve calçar luvas de boxe. E suporte atlético – por que não? – para ficarmos com um pé no território do machismo.

Há no caso, ainda, outro ponto a se analisar. Umberto Eco não foi original, mas foi totalmente correto quando verbalizou que a internet deu voz ao idiota da aldeia. Apenas acrescento que o idiota tem sempre algo a ensinar, nem que seja quando, pela sua idiotia, acaba por destacar como certo o oposto do que diz.

Ocorre, contudo, que os idiotas e os gênios são poucos e, cada um deles, ao seu modo, é a luz do mundo e o sal da terra. Em tempos de internet, o grande problema não são os idiotas, são os medíocres e seus patrióticos pelotões de linchamento. Suas estacas e tochas são as “verdades absolutas” do senso comum a que abraçam.

Não se espere que entendam que a liberdade de expressão é a liberdade dos outros. Para muitos, a opinião divergente é “crime de opinião”. Vivemos tempos extremados.

Leio a coluna de 28 de janeiro de 2016 da ombudsman da Folha, jornal no qual o texto de Fernanda foi publicado, e ela – a ombudsman, se coloca acertadamente em defesa do direito de Fernanda Torres expressar sua opinião, mesmo que e principalmente se contrassensual.

Concordo com ela quando diz que “esse discurso segregador [os ataques a Fernanda, entre eles] é fomentado por setores da classe média e amplificado por parte da imprensa”. Concordo quando reconhece que “a Folha alimenta com frequência esse viés”.

Faltou, no entanto, a ombudsman dar nomes aos bois.

Poderia usar como exemplos os elogios que a Folha pratica quando de agressões a petistas. Verdadeiras comemorações carregadas de sarcasmos e gozo. Para que não se perca pela memória: ”Jornalistas não merecem ser estupradas” e ”Um elogio à agressão”.

A Folha, de há muito, incentiva a formação de tais pelotões de linchadores. Fernanda Torres pagou pelo erro da Folha. E o filho de Ricardo Noblat, tempos atrás, também. Este por estar usando uma camisa da cor da do América FC – vermelha.

Fernanda Torres foi vítima de algo que os estrategistas militares cinicamente chamam de “efeito colateral”.

A ombudsman sabe disso e até insinua reconhecer isso. Erra, no entanto, ao cobrar as responsabilidades.

Envereda pelo unilateralismo que denuncia e passa a ver o demônio nos outros. Os ataques revelariam o ódio de classe da esquerda. Para defini-lo, a ombudsman vai buscar no canil de grosserias da Folha o que chama de “chauívinismo”.

Suponho que seja um neologismo próximo a “petralha”, e a responsável maior por ele seria a professora Marilena Chauí.

A paranoia está correndo solta. Outro dia, Ruy Castro anteviu nas páginas da mesma Folha os professores, todos esquerdistas, caçando pessoas brancas pelas ruas para deportá-las dos livros de história.

Preconceito de classe. As pessoas “brancas, de classe média, educadas em família estruturadas e com liberdade” parecem estar sentindo-se bastante incomodadas.

Não vou entrar aqui por rolezinhos e babás vestidas de branco. Não vou entrar aqui pelos massacres nas periferias e cidades operárias de São Paulo seguidos do povo branco tirando selfies com policiais na Avenida Paulista.

Apenas me pergunto: a professora Marilena Chauí seria a responsável?

É da professora Marilena Chauí o seguinte diagnóstico: “a classe média é uma abominação política, porque é fascista, é uma abominação ética porque é violenta, e é uma abominação cognitiva porque é ignorante”.

E se você não entendeu o que a professora Marilena Chauí teria a ver com os ataques a Fernanda Torres, terá que perguntar a ombudsman. E esta aos seus fantasmas.

Marilena Chauí também ousou afrontar o pensamento dominante e também foi linchada.

E, como nota-se, a ombudsman concorda com a professora muito mais do que a ombudsman parece supor. Talvez, muito mais do que deseje reconhecer ou do que suporte reconhecer, já que se junta à turba dos linchadores.

Também aqui um contra-senso que não sei se Freud explica, mas Marx, sem dúvida.

 

PS: a Oficina de Concertos Gerais e Poesia apoia o Movimento Golpe Nunca Mais.

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Redação

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