O maior lobista da República

Fernando Henrique Cardoso mandava-o buscar no Rio de Janeiro para jantares no Alvorada. Jorge Serpa ia de táxi, por temer avião. No jantar, FHC indagava:

  • Jorge, quem foi maior: Juscelino ou eu?

E Jorge respondia:

  • Você, Fernando!

Depois, morria de rir, contando essa história no restaurante Mosteiro, no Rio, que ele frequentava até alguns anos atrás.

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Jorge Serpa foi o maior lobista da história e testemunha ocular de um longo período, que vai de Dutra a Lula.

Cearense, tornou-se a síntese perfeita das duas maiores escolas do lobby carioca dos anos 50: o de Augusto Frederico Schmidt e San Thiago Dantas.

Foi influente no governo JK. Chegou a ocupar cargo financeiro na Manesmann, onde se enrolou até a raiz do cabelo com a emissão de papéis, na sua primeira e última atuação pública.

No governo Jango, é de sua autoria o famoso e trágico discurso do presidente no comício da Central do Brasil.

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Depois do golpe de 64, virou alvo preferencial de Carlos Lacerda, que conseguiu sua prisão, em função do escândalo Manesmann. Provavelmente sofreu torturas na cadeia. Mas, através de Bartolomeu Santos – outro personagem intrigante da história, chefe de gabinete de Agamenon Magalhães e, posteriormente, membro do influente grupo de lobby de Negrão de Lima – aproximou-se do SNI (Serviço Nacional de Investigações) e da linha dura do Exército.

Recuperou prestígio no governo Médici. É considerada de sua autoria o primeiro grande discurso de Médici, empossado presidente.

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Até a morte de Roberto Marinho, foi seu homem de confiança.

Segundo as lendas da época, foi o grande estrategista da Operação Monte Carlo, primeira grande tentativa de internacionalização da Globo (não confundir com a Operação recente da Polícia Federal), além de grandes operações no mercado internacional de títulos.

Pura lenda! Conforme me contou Walther Moreira Salles, Serpa jamais saiu do país, tinha pavor de aviões, dominava apenas o idioma português e sempre foi péssimo planejador de negócios.

Seu prazer era manobrar os carretéis do poder. Sempre foi descuidado com sua própria condição financeira. Periodicamente, grandes empreiteiros se cotizavam para auxiliá-lo na vida pessoal, mesmo tendo-se tornado homem de confiança e autor dos editoriais pessoais de Roberto Marinho no jornal O Globo.

Nas eleições de 1989, coube a ele – a pedido de Marinho – cunhar o tal “choque de capitalismo” para Mário Covas.

 

Sou testemunha do temor que infundia em Evandro Carlos de Andrade, o principal jornalista da história do grupo Globo.

Com a morte de Marinho, seus filhos trataram de se afastar de Serpa.

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Mas ele continuou influente, mantendo seu papel de espécie de hub, fazendo o meio-campo entre sucessivos presidentes, grandes empreiteiras e os operadores da máquina – os funcionários de carreira que conheciam as engrenagens e se ofereciam para qualquer senhor.

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Provavelmente foi em sua fonte que veio beber José Dirceu, para suprir a falta de experiência e de operadores no início do governo Lula. Paulo Roberto Costa era frequentador habitual de sua casa. Foi através dele que Eduardo Campos conseguiu se aproximar de Costa.

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Já bastante idoso, Serpa pouco sai de casa. Mas continua sendo bastante visitado.

 

 

Luis Nassif

22 Comentários

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  1. Excelente

    Nassif poderia ter este post como o embrião de uma série sobre o lobismo brasileiro, a sua influência sobre decisões governamentais e contratos públicos e sua relação com o aparelhamento das empresas estatais ou mistas pelo mundo empresarial.

    Todos os casos de escândalos, pelo menos nos últimos 40 anos, demonstram que os “beneficiados” por “esquemas”  se relacionam ao mesmo tempo com as esferas federal/estadual/municipal e com todos os principais partidos políticos do Brasil.

    Assim foi apurado na CPI’s do Banestado, das Empreiteiras, Carlinhos Cachoeira; nas operações Castelo de Areia, Lava Jato; etc.

    1. Marimbondos, não os de fogo

        Marimbondo é calmo, fica em sua casinha, não ataca ninguem, mas se pensar que vai ser atacado, ou sentir que alguem vai mexer em seu território, o bicho fica louco, faz barulho e ferroa em grupo, tanto no passado como no presente.

         Para escrever sobre o lobismo em certo país da América latina, claro que excluindo o Brasil, da segunda metade do século XX, até os dias de hj., algumas grandes obras e principalmente biografias, incluindo de alguns “santos” ( tanto de esquerda quanto de direita), até mesmo uma construção de uma capital federal seria esmiuçada ( ops. errei, foi no Brasil – exemplo errado, desculpe minha falha ), e a realidade não seria a dos livros de história.

          P.S.: Como já passou e não vai voltar NUNCA MAIS, lembro de ocasiões a época da Ditadura Civil – Militar (64-85), mas nos chamados “anos de chumbo ” ( 68 – 75  – Junta Militar,Costa,Medici e Geisel) – vc. pode até não acreditar – mas algumas vezes, para “tirar” alguem dos porões ( DOI-CODI, PE-GB Barão de Mesquita, Cenimar, DOPS-SP, e outros locais infames), muitas familias e advogados, não recorriam a “generais conhecidos”, ou até parentes militares da ativa, mas a lobistas, tanto empresariais/licitações, como da imprensa.

           Portanto sua solicitação, interessantissima, seria a visão da história recente, através de outro angulo, bem mais real, mas com um sério problema, os “marimbondos” de ontem, muitos ainda voam e ferroam, e estes insetos peçonhentos, não gostam de serem analisados a luz, são criaturas das sombras, o manto da noite, é o habitat deles.

  2. essas valeriam um livro

     

    Esses artigos sobre os grandes operadores do poder brasileiros, desde, talvez, Augusto Frederico Schmidt e San Tiago Dantas, ou antes, indo na gênese dessa atribuição no Brasil (no 2o. Reinado ou na Rep. Velha) mereceriam uma compilação em um livro. São coisas “out of the book” dos livros de História do Brasil ou de trabalhos acadêmicos,, mas que explicam, ,em muito, o sentido de como são engendrados o poder (e o destino do país).

  3. Lembram-se do habitual “bonus

    Lembram-se do habitual “bonus de volume” que sempre foi utilizado, jamais questionado? Virou “crime” para jogar nas costas do PT. O que “pegou” para a maior empresa de comunicação criadora do sistema? NADA. O congresso tratou de “regulamentá-lo”. Estou esperando que “regulamentem” AGORA a cultura dos 10% das empreiteiras. Surpresa será se não o fizerem.  

  4. Ponto sem nó

    Nassif,

    Imagino que, em algum momento, esta matéria venha ajudar a explicar determinados fatos que possam estar acomtecendo no Poder, possivelmente em Brasília.

    Por aqui não existe ponto sem nó.

  5. Ora, como está ímplicito no

    Ora, como está ímplicito no próprio texto, o maior lobista da república foi o próprio Roberto Marinho. A confusão advem, talvez, do fato de que ele tornou-se em algum momento lobista de sua causa própria.

  6. O Dr.Jorge atendia em sua

    O Dr.Jorge atendia em sua casa na Gavea, que eram duas, em uma de residencia , em outra está sua formidavel biblioteca de filosofia, milhares de livros, um homem extraordinariamente culto, tambem guarda cartas, dezenas, dos mais importantes politicos brasileiros dos ultimos 60 anos,  de JK são muitas, tambem de Jango e outros.

    Entre as incontaveis demarches que fez uma resolveu no salvamento financeiro da Argentina durante o governo FHC, quando o Dr.Jorge conseguiu aprovar uma operação relampago no FMI para salvar o pais vizinho.

    Se escrevesse suas memorias daria uma enorme contribuição a historia politica brasileira a partir do Governo Dutra,

    aliás o Dr.Jorge é casado com uma neta de Dutra, mas dificilmente isso ocorrerá, o Dr.Jorge não é de contar.

    1. Um dos visitantes

       Da Gavea, tanto pessoalmente – nas noites mais escuras – como em breves comunicações telefonicas ( ambos detestavam conversar por telefone ), outro homem bem culto: General Golbery do Couto e Silva, quando não ele, seu preposto: Heitor de Aquino Ferreira.

  7. Os donos do Poder

    Sou obrigado a concordar com a Dilma Roussef de que estejamos no momento crucial para a virada democrática no Brasil: as artimanhas do poder estão sendo dilaceradas. As prisões dos diretores das empreeiteras é prova que de que, se tiver vontade, há meios de mudar a política do Brasil. 

    Acho que essa reportagem é batante ilustrativa do atual momento, quando as tramanhas internas, invisíveis que dominam a elite politica nacional estão sendo mostrada a público. Assim espero, e Assim espero que venham mais reportagem nesse sentindo. E sigo a Assis ribeiro, e espero que você aproveite o ensejo para fazer uma série sobre lobistas, e podemos escancar mais os verdadeiros donos do poder.

    1. No conceito americano são

      No conceito americano são legitimas e elegais, no conceito brasileiro podem ser muita coisa que não são, lobista não é doleiro e nem lavador de dinheiro, como aqui a imprensa mistura, lobista é um “facilitador” e “introdutor” de iniciativas,

      no geral é um trabalho legitimo, que exige sofisticação, sensibilidade, percepçao, um grande “network” e principalmente credibilidade. Na Lava Jato não tem nenhum lobista, tem intermediatios, doleiros e brokers.

  8. o post revela em primeira mão

    o post revela em primeira mão que dos tempos dourados de doutor jorge serpa o filósofo no poder para os tempos bicudos de fernando baiano advogado foragido… o nível lobístico operado na república lulopetista despencou… e avacalhou de vez a governança política otimizada lubrificada pressionada pela honrada república corporativa dos lobistas pau pra toda obra superfaturada.

  9. loby
    Lobista e uma coisa saudavel e da democracia e que nao pode e o que estao fazendo assalto aos cofres , atravez de obras muuulti faturadas , e na maior cara de pau estao dizendo que a propina era de 1a3% na verdade pelo que paresse nada e menos 1000% porque obra que e pra custar $4 vira 40 e por ai afora , pobre Brasil.E tem gente sega que ainda defende essa turma.

  10. Serpa ensinou

       Falta no texto os contatos poderosos que o Dr. Serpa sempre possuiu na midia, não apenas com os Marinhos – a época de 64 o Globo ainda não era uma grande força na imprensa – mas ele tinha ligações bastante estreitas com os Nascimento do Jornal do Brasil, com Edmundo Bittencourt e posteriormente Dona Niomar , donos do mais influente jornal da época, o “Correio da Manhã”, e em São Paulo, com os Mesquita do Estadão.

        Em contrapartida, tambem apoiou o esquema de sustentação de midia do Pres. Goulart, através de financiamentos e mesmo operações  “não contabilizadas” ( frutos de empreiteiras, algumas ainda existentes), com comissões, para Samuel Wainer, da “Ultima Hora” – como o próprio Wainer declara em suas memórias, que no governo JK (anterior a Goulart), conheceu a “força” de nossas empreiteiras, e o Dr. Serpa ( o caso dos US$ 450.000,00 é famoso e relatado no mesmo livro), e claro, seu melhor aluno, um dos supostos icones da esuqerda brasileira – ótimo lobista – San Tiago Dantas.

        E a realidade, na politica ou nos grandes negócios: Quando escuto ou vejo, algum politico, jornalista, analista, comentarista, de qualquer parte do espectro ideológico, falando sobre “acabar com o lobby no Brasil”, me causa urticária, ansia de vomito, até mesmo crise de riso, pois o que realmente querem é acabar com os lobbies dos “outros”, mas manter o deles – o poder não tem vestais.

         Pior ainda é quando algum “iluminado” e ingenuo, geralmente advogado, resolve propor uma legislação referente a ações de pressão no Brasil ( legalizar e parametrizar as ações de lobby, como existe em varias democracias), o cara cai em descrédito total, marginaliza-se, é chamado de proto-mafioso, pelos que querem que as estruturas existentes, desde os anos 50, espalhadas pelo País, continuem a agir nas sombras.

      1. Peça de teatro

          ” O terno tailandês ” – estrelando: Ulisses e Mora Guimarães, Bob Marinho, Renato Archer, Heraclito Fortes e outros menos cotados, o Serpa na co-direção, Tancredo Neves – o indicado e aceito -, Sarney ” presuntivo herdeiro”, e os tartufos: o militar machão Andreazza, o clow do mal Paulo Salim.

             

  11. VOU DE TAXI

    NASSIF, Serpa não andava de táxi, ele andava em seu carro particular que tinha registro de táxi, se vestia de táxi mas tinha ele como único passageiro. Isso me mostra que devia ser um grande paranóico.

    Miriam Leitão o chamava de O Notorio Serpa.

    Também era conhecido como O Cavaleiro das Trevas…

  12. pontos com nóis! e pingos nos is…

    eram outros tempos outros partidos outros políticos outros podres poderes outros regimes outros brasis outros modos culturais de informação e opinião pública…outros tudo!

    jorge serpa é memória e história… é outro canal da notícia fria requentada para distração encheção de linguiça atômica…

    nóis aqui na periferia periférica mais o cobrador e o passageiro do busão acalorado na discussão o petróleo é nosso mais o dono do boteco casa do norte tv led ligadona… nóis quer saber, através do modelo nassifista analítico-crítico baseado logo cedo… na teoria do xadrez do poder, como que foi bem estudado e jogado o xadrez jurídico-político do juíz paranaense e seus auxiliares mais o MP e PF paranaense leite quente! que encurralaram em lances de mestre a jurisprudência criminal mão única mela tudo nas filigranas formais do ministro-advogado-mor da república lulopetista, o doutor MTB combalido (estimo melhoras) e que desde então mantém a rainha e o rei sabático do governo dinástico – sob ataque de nervos incessante – andando de lado, se movimentando aos trancos e barrancos e com a rainha enquadrada se correr o bicho pega se ficar o bicho come por saraivada de cheques e mais cheques sem fundos soberanos… da operação lava-jato midiática a destravar sistemicamente pra baixo todo santo ajuda outros lava-jatos, lava-a-seco, lava-total, lava-tudo…

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