O malabarismo de jornais e jornalistas argentinos para deserdar Macri

Interessante reportagem de Sylvia Colombo, na Folha, sobre as ginásticas de grupos de mídia e jornalistas argentinos, com a provável vitória do kirchenerismo.

Segundo Sylvia, “a mídia tradicional ficou de mãos dadas com o governo de Mauricio Macri desde sua posse, em dezembro de 2015, até o último dia 11 de agosto, quando o presidente foi derrotado nas primárias”. Agora, precisa sair correndo atrás do prejuízo.

Diz ela:

“Agora já está todo mundo olhando para a frente e pensando em como se adaptar, embora estejam sofrendo muita pressão dos setores pró-Macri para seguir apoiando-o”, diz à Folha o jornalista Jorge Lanata, um dos principais do país, que tem programas em canal de TV do Clarín”.

Há um caso clássico, capaz de estimular paralelos próximos no Brasil:

Alguns jornalistas que apoiavam Macri chegaram a passar vergonha. Um dos mais conhecidos, Luis Majul, que passou os últimos três anos atacando Cristina e fazendo entrevistas laudatórias com Macri, fez um “mea culpa” no ar: “Quero fazer uma autocrítica. Nos últimos tempos estive muito focado na corrupção kirchnerista e não me dei conta de que as pessoas estavam sem recursos para chegar até o fim do mês”, disse, em seu programa de TV.

Na última 4ª feira, grupos de pobres ocuparam a avenida 9 de Julho, de Buenos Aires, pedindo a Lei de Emergência Alimentícia. E, surpreendentemente, o fato mereceu ampla repercussão na mídia, algo impensável algum tempo atrás.

O padrão anterior é nosso velho conhecido:

Nos últimos três anos, os protestos contra o governo foram noticiados de forma mais breve, privilegiando os episódios de violência e minimizando sua seriedade.

Conclusão:

De acordo com jornalistas que ocupam cargos importantes nos dois principais grupos de mídia, já está havendo conversas entre a equipe de Alberto Fernández, o candidato da oposição, e os donos desses veículos.

Se isso se concretizar, o noticiário “mainstream” passará novamente a ser governista, com alguns poucos fazendo investigação contra a nova gestão.

Como conclui Sylvia:

Como acontece a cada ciclo de poder na Argentina, os principais veículos se encontram em um momento de reposicionar suas linhas editoriais e seus negócios.

Há outro fenômeno em jogo, comum aos dois países: as ondas da opinião pública, impulsionados pelos grupos de mídia, mas, muitas vezes, levando o jornalismo a reboque.

Com a cartelizaçao da mídia latino-americana, a falta de alternativas, os ganhos indiretos do jornalismo – visibilidade, acesso ao mercado de palestras etc. – o jornalista acaba se equilibrando entre dois vetores.

O primeiro, obviamente, os comandos que vêm do aquário. É uma ordem unida, que permite algumas pequenas variações. Essas variações dependem do segundo fator, a credibilidade perante o público. Se perder, não será útil nem para o empregador.

Cria-se, então, uma corda bamba. Boa parte dos jornalistas, antes de começar o dia, molha o dedo e coloca no ar, para ver de onde vêm os ventos.

À medida em que os ventos vão mudando, ele passa a testar os novos limites, tratando de se manter na crista da onda com seu público, mas sem enfrentar os humores do veículo. Mentes inquisitoriais, então, podem se tornar cruzados em defesa dos valores civilizatórios. Como é um movimento amplo e articulado, não há sequer a cobrança da autocrítica.

Nesses tempos de lives, e celulares, às vezes são apanhados com a calça na mão.

 

 

 

 

Luis Nassif

8 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Vale pra Argentina o mesmo daqui: conversa, faz até “acordo”; basta, simplesmente descumprir, no instante seguinte. Estão lidando com golpistas, simples assim.

  2. Vale pra Argentina o mesmo daqui: conversa, faz até “acordo”; basta, simplesmente, descumprir, no instante seguinte. Estão lidando com golpistas, simples assim.

  3. A globo aqui sempre foi mais forte que o clarin na argentina, tanto é, que a globo consegue mobilizar o povo contra si mesmo!
    Lá chegou-se a aprovar uma lei dos médios…
    Nem vendo que vão perder no futuro e até no presente, o povo no brasil não se move!
    As forças armadas aqui ainda são mais fortes que lá principalmente após as guerra das malvinas e lá ditadura deu prisão, aqui anistia, além do judiciário que aqui é totalmente alienado para a verdade dos fatos!
    Até imaginação aqui vira jurisprudência!
    Vejo com pessimismo o momento atual, pois a argentina deverá herdar dos brics aquilo que caberia ao brasil, se não tivesse havido o golpe, pelo simples fato de haver hoje uma guerra comercial entre china e eua!
    E se intrometer no quintal dos eua vai fortalecer a china!
    Então virão bilhões de dólares para a argentina!
    O que vai forçar os EUA a pegar mais pesado com o capitão furacão, apertando as rédeas…
    Fato que não é um bom augúrio para nós…
    Vamos ser humilhados por argentinos…

  4. Tanto lá, como cá e alhures a opinião da imprensa comercial está sempre a venda. Serve ao mercado financeiro. Como diria Millor Fernandes, se não é oposição, é um armazém de secos e molhados. Tudo está sempre a venda. A nossa desvantagem, em relação a los hermanos, no que tange à qualidade das instituições, é que aqui a caneta do judiciário também virou mercadoria, no mesmo armazém onde se pode comprar a opinião da imprensa. Que, não por acaso, recebe o nome de LOJA.
    Esse comércio está aqui tão naturalizado que os balconistas posam para fotografia.
    https://www.premioinnovare.com.br/conselho-superior

  5. E a Imprensa Brasileira? E RGT? Os Telejornais Brasileiros, em especial GloboNews com Mirian Leitão, começam suas transmissões a partir da Argentina durante o Governo de Cristina. Qual seria tamanho interesse? E era acusar, culpar, denegrir,… Privatarias , NeoLiberalismo e combate ao Patriotismo e Nacionalismo eram as imposições jornalísticas. A ‘Salvação Argentina’ em caminho largo e lustroso. Só não avisava que o ABISMO era o fim da estrada. Não sem antes se abastecer de FMI e Banco Mundial num interminável cabresto imposto às futuras gerações. Durante o Governo Macri, Nossa Imprensa se esquece da Argentina. O abismo a cada dia mais próximo e não vemos notícias. Então chegam as Eleições e o óbvio transparece. Grande parte das Políticas do casal Kichner de enorme sucesso, atreladas a um avanço e evolução esperados por Aqueles que já governaram a Nação. Proteção Absoluta dos Interesses Nacionais negociados com a Inserção Mundial. Via de Mão Dupla. A Argentina é a véspera do Brasil. Quem sabe desta vez aprendemos? E Eles também.

  6. Assim a mídia hegemonica consegue se manter na hegemonia. O povo argentino acreditou, devido a mídia, que não havia esquerda e direita. Em breve, com a esquerda no poder, a mídia começará a destruição do governo. Direcionar o povo as greves, falará da inflação, mostrará que não tem direitos humanos.

  7. Infelizmente nós seremos a Argentina amanhã, não há volta, e com resultado pior que lá, nosso povo não tem a fibra dos argentinos e já estão acomodados. Tivéssemos a fibra do povo argentino, anteontem as ruas estariam cheias de gente vestindo preto. Quando Collor pediu para o povo vestir verde e amarelo i ir pras ruas e o povo vestiu preto e foi pras ruas, tinha a Globo incentivando os caras pintadas. Hoje ela só incentiva os Bolsominions.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador