O preconceito e o politicamente correto

Por Vera Passos

Do iG

Linguagem politicamente correta não elimina preconceito

Bom-senso no uso dos termos é a melhor solução para evitar mal-estar

Maria Carolina Nomura, iG São Paulo 12/08/2011 05:58

Se, de um lado, a diversidade nas empresas trouxe a possibilidade de convivência entre pessoas muito diferentes nos sentidos de raça, gênero ,condição social e física, de outro levantou questões como o uso da linguagem politicamente correta para não ofender nenhum desses grupos considerados minorias.

Mas, discernir o que é e o que não é politicamente correto não é tão simples. Substituir “negro” por “afrodescendente” ou “anão” por “pessoa com nanismo”, por exemplo, seriam medidas suficientes para diminuir o preconceito nas empresas e aumentar a integração dessas pessoas com os colegas?

 
Foto: Danilo Chamas / Fotomontagem iG sobre SXC

Em um contexto de trabalho, adjetivar pessoas pode causar transtornos, independentemente do uso (ou não) de termos considerados politicamente corretos

A linguagem politicamente correta surgiu nos Estados Unidos na década de 1970, como legado do movimento de defesa dos direitos civis. De acordo com sua lógica, usar certas palavras legitimaria o preconceito e propagaria visões discriminatórias contra grupos sociais.

Negro ou afrodescentende?

“É difícil responder quais são as atitudes linguísticas adequadas do ponto de vista da civilidade. Nem todos os negros têm aversão ao adjetivo ‘negro’, pois são orgulhosos de sua cor. Nos Estados Unidos, muitos negros declinaram fortemente a expressão ‘afrodescendente’ por ela não fazer alusão à sua cor”, diz Cleber Pacheco, doutorando em Linguística da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).

Segundo Pacheco, não há fórmulas como “diga isto, mas não diga aquilo”. “E o problema continua, pois o preconceito não está no léxico. Está nos indivíduos e nas situações sociais em que se encontram”, afirma.

Manual

Em 2004, a Secretaria Nacional de Direitos Humanos, ligada à Presidência da República publicou a cartilha “Politicamente correto e direitos humanos”, com 96 expressões consideradas preconceituosas. A lista desestimulava termos como “baianada”, “anão” e “palhaço”. A frase “a coisa está preta” também entrou no índex. A publicação gerou muita polêmica e foi recolhida logo depois.

Para o professor José Luiz Fiorin, do departamento de Linguística da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP), não basta mudar a linguagem para que a discriminação deixe de existir.

“Se alguém sempre ouviu certos termos ou expressões, como ‘negro’, ‘bicha’ ou ‘coisa de mulher’ ditos com desdém ou com raiva, certamente vai desenvolver uma atitude machista ou racista”, explica Fiorin.

Adjetivos

Para evitar um mal-entendido entre os colegas de trabalho, Pacheco aconselha os profissionais a utilizarem o bom-senso. “O ideal é que não abordemos nossos colegas de trabalho pela menção de raça ou etnias. Nada melhor do que um ‘amigo, você poderia me fazer um favor?’, em vez de ‘negro, você poderia me fazer um favor?’, ou, o pior, ‘afrodescendente, você poderia me fazer um favor?’”, exemplifica.

Em um contexto de trabalho, adjetivar pessoas pode causar transtornos, independentemente do uso (ou não) de termos considerados politicamente corretos. Pacheco diz ainda que ao fazer referência a um terceiro não é necessário mencionar sua raça, limitação física ou orientação sexual. “Nada mais neutro e correto do que tratar as pessoas por seus nomes.”

Outra questão que produz efeito contrário ao pretendido é o uso de eufemismos, quando a língua não possui um termo específico para fazer uma designação que é vista como preconceituosa. “Por exemplo: dizer ‘pessoa verticalmente prejudicada’ em lugar de anão; ‘pessoa de porte avantajado’ em vez de gordo; ‘pessoa em transição entre empregos’ por desempregado. Isso gera descrédito para os que pretendem relações mais civilizadas entre as pessoas. Por isso, as piadas já começam a surgir”, explica Fiorin.

Luis Nassif

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador